A Sega tem vergonha dos últimos jogos lançados com a chancela Sonic the Hedgehog. Isto nem é uma extrapolação minha, basta percebermos o quão quase totalmente silenciosa a companhia esteve com este lançamento de Sonic Boom: Fire & Ice, depois do descalabro que foram os jogos de 3DS e Wii U do final de 2014. Eu até os compreendo. Estes Sonic Boom são terríveis, e venderão apenas para os fanboys de Sonic que conseguem arranjar uma dúzia de justificações pelas quais esta série Boom e até Lost World são maravilhas quase no patamar dos jogos da década de 1990. É portanto dinheiro fácil, demasiado fácil diria até, em que a Sega nem tem de promover um jogo medíocre mas a força do Sonic envia milhares de dólares, euros e iénes para os cobras da multinacional.
Antes de entrar na terrível realidade que é este Sonic Boom: Fire & Ice, tenho de conceder algo ao mais recente jogo desenvolvido pelo estúdio Sanzaru Games: este jogo é menos mau que o anterior. O que na prática não é dizer muito, e é o equivalente musical de dizer que o David Carreira é o membro do detestável clã de pseudo-músicos-cantautores que é menos terrível. Parece um elogio? Mas não é.
E é menos mau porque esquece por completo a decisão perfeitamente ilógica de nos obrigar a um grind incessante para progredirmos no nível e porque, bem, é só isso.
A falta de velocidade continua a ser demasiado evidente. Eu juro que continuo sem perceber os muitos estúdios a quem a Sega e a Team Sonic têm entregue o desenvolvimento dos jogos da sua mascote. Será que uma análise destes vinte e alguns anos de vida da série não permitem perceber o que permitiu o sucesso de Sonic? O que o fez lutar pela atenção dos consumidores taco-a-taco com os jogos do Super Mario? Ou será que os muitos e brilhantes jogos que têm sido lançados pelo mercado indie que têm a velocidade do Sonic como pai inspiracional, não são suficientes para transmitir alguma informação de qual é a verdadeira essência do personagem?
O Sonic não vive de “puzzle platforming“, cuja componente puzzle é tão terrível que as aspas surgem como uma ironia pesada para com um personagem que tanto nos significa. O Sonic não vive de criar poderes e habilidades para si e para o seu elenco de suporte. O conceito base deste jogo é a capacidade de conseguirmos alternar entre o poder de fogo e gelo, derretendo blocos com, e congelando a água com outro. À primeira vista é uma ideia curiosa que já foi utilizada em muitos outros 2D platformers, mas que em Sonic só ajuda a retirar-lhe toda a componente verdadeiramente frenética que é o seu cerne.
Sonic sempre viveu do espírito quase proto-speedrunner do seu game e level design, em que rapidamente aquela esfera azul a rodar se assemelhava a uma bola num tabuleiro de pinball gigante, dinâmico, aberto, e surpreendente. Sonic Boom: Fire & Ice é o inverso de tudo isso – é compassado, fechado, labiríntico de forma claustrofóbica e não na forma “canal-de-máquina-de-flippers” dos originais.
A desculpa de que o desinteresse e a total inocuidade do jogo e dos diversos níveis se justifica pelo público-alvo a que se destina, é uma resposta não só cretina mas altamente desrespeitosa para cm o público infantil, e em extremo, por toda a comunidade afecta a Sonic. Basta relembrar que este pedaço digital de importância e desafio olvidáveis são destinados à mesma faixa etária que os magistrais Sonic da Mega Drive.
O que mudou então? Diria que o mercado e as próprias companhias. Os 3 jogos de Sonic Boom são a representação prática de quando uma companhia da dimensão da Sega vive sob a máxima popular de “para quem é, bacalhau basta”, e na ilusão de que o público compra qualquer coisa desde que seja motivado para tal.
O melhor: é ligeiramente menos mau que o anterior
O pior: (ler o resto do texto)
O Sonic merece mais, nós merecemos mais. Diria até que a própria série de animação de Sonic Boom merece mais do que estas pobres adaptações a videojogo que em nada a dignificam ou à memória do historial de Sonic.
Há, no entanto, uma luz ao fundo do túnel: o anúncio de Sonic Mania que celebrará os 25 anos de Sonic na Primavera do próximo ano. Revisitar a sua história é tão melhor do que este Fire and Ice que preferimos terminar com o trailer de Mania e fingir que este terceiro Boom nunca existiu.