Já se passaram duas semanas desde que a Microsoft anunciou de rompante o cancelamento de um dos jogos mais aguardados de 2017, Scalebound. Surpresa, não daquelas agradáveis ao estilo de aniversário, mais uma partida entre amigos de longa data em que a vítima acaba caída no chão em posição fetal após um murro no estômago. O facto, é que o rumor do seu possível cancelamento corria internamente em alguns meios de comunicação, mas nem esses acreditavam. Pessoalmente, nem eu acreditava.
Scalebound fazia parte da minha lista de quatro jogos que me encontro ansioso para jogar em 2017, dizendo assim adeus a Resident Evil 7, Horizon Zero Dawn e The Legend of Zelda: Breath of the Wild. Todos estes jogos suscitaram-me interesse não só pelos trailers e informação que tinha vindo a ser revelada cá para fora, mas também pelo facto de os ter experimentado ou visto ao vivo em alguns eventos como a Gamescom. Scalebound era de longe aquele que mais contacto tinha tido.
Aqueles que me conhecem sabem o que Hideki Kamiya significa para mim. O seu estilo revigorante e energético, assim como a sua capacidade para produzir jogos de alta qualidade tão diferentes uns dos outros em estilo e mecânicas, é sem dúvida algo que tenho muito em conta. Na Gamescom do ano passado tive oportunidade de me encontrar com o diretor pela segunda vez e ver uma demo do jogo, demo que não havia sido revelada a público onde exibia à personalização do animal mítico, da influência das armaduras usadas, a evolução do dragão ao longo do jogo e ainda uma luta entre ferozes monstros gigantescos. A produção parecia correr bem; o que haviam apresentado possuía qualidade e melhor, o elemento que me mantinha reticente, o combate, surgia mais polido e veloz que aquele que tinha visto no ano anterior, mais Platinum digamos.
Tudo isto fez me ficar ainda mais incrédulo com a notícia.
“Eu vi o jogo, eu vi o estado do mesmo, como raio foi isto acontecer?”
Sinceramente recordou-me outra vez a novela Kojima-Konami, mas desta vez envolvendo a Microsoft e Platinum. O jogo foi revelado em 2014, e nessa altura, apenas contámos com um pequeno trailer, mostrando um pouco o conceito e temática envolta do mesmo, o que me faz acreditar que a produção tenha começado pouco tempo antes. Em 2015 vimos finalmente um vídeo de gameplay, onde podemos observar um RPG de mundo aberto, tornando-o automaticamente num projeto trabalhoso e ambicioso e em 2016, um combate co-op com um caranguejo de proporções anormais, onde o combate parecia, bem, mehhh.
Não faz sentido, anos de produção, de decisões, de empenho, deitados ao lixo, e pior, sem explicações e sem motivos. Em vez disso a Microsoft limitou-se a atirar areia para os olhos da plateia dizendo: “Estamos a trabalhar arduamente de forma a disponibilizar um fantástico conjunto de jogos a serem lançados este ano, Halo Wars 2, Crackdown 3, State of Decay 2, Sea of Thieves e outras experiências marcantes.” Desta lista, apenas Sea of Thieves é um novo IP, apenas esse suscita algum interesse e é de facto interessante, tudo o resto não enche a cova do dente.
Como é que se termina a parceria com um dos estúdios mais sonantes da atualidade? Bem, essa pergunta motiva alguns factos interessantes. A verdade é que a Platinum também não se encontra no seu melhor momento. A saída de Tatsuya Minami da presidência da Platinum Games fez questionar se tudo estava bem internamente. O estúdio possui o problema de não pertencer a nenhuma grande cooperação como Activision, Sony, Electronic Arts ou até mesmo ZeniMax Media, companhia que engloba a Tango Gameworks, estúdio fundado por Shinji Mikami após a saída da, wait for it… Platinum. Problema porquê? Bem, porque não podem avançar com um projeto sem uma editora, sem a aprovação de uma entidade capaz de distribuir os seus jogos, obrigando assim a muito jogo de cintura.
Parte deste jogo de cintura fez com que a Platinum aceitasse a produção de jogos envolvendo grandes licenças como Transformers, Avatar, TMNT, deixando assim um pouco de lado aquilo que para mim gritava Platinum, novidade e acção. Vanquish, Bayonetta e MadWorld deram lugar a “licensed games” que por muito que custe, os seus imponentes nomes vendem jogos e pagam contas. Foi necessário dois anos e meio para finalmente começarem a surgir novos IPs e jogos únicos. Adorei Transformers: Devastation, é isto que de facto quero ver da Platinum, mas ao que parece, alguém não quer ver os meus desejos realizados.
Por muita culpa que a Platinum tenha no cartório, a verdade é que a Microsoft ajudou à festa. O elevado cargo de trabalho obrigou a que alguns membros da equipa tirasse férias da produção do jogo, e ao regressarem levaram com notícia do cancelamento de Scalebound, apanhando o próprio Kamiya de surpresa. A Microsoft quer calendário cumprido, quer o jogo produzido o quanto antes, a equipa quer adiar mais um pouco pois não quer lançar algo inacabado, cortando assim “a fonte”. Acredito que a Microsoft não tenha sido capaz de aguardar, de dizer, “OK, damos mais alguns meses” o que é terrível. The Last Guardian foi um dos projetos mais atribulados de sempre do mundo dos videojogos e acabou por ser lançado 10 anos depois. UMA OBRA DE ARTE, a Sony acreditou e deram continuidade aquilo que haviam prometido, pena a Microsoft não ter feito o mesmo.
É devastador ver como a ausência de um jogo deita abaixo o catálogo de um ano, e como a companhia não é capaz de dar oportunidade de Scalebound ser lançado com a qualidade devida. Pode ser que uma outra cooperação permita que isso aconteça, pois a remoção de todas as informações e trailers de Scalebound das contas e sites da Microsoft fazem acreditar que a história está longe de estar encerrada. Vamos ter mais notícias e quem sabe, ver Drew e Thuban a voar para uma outra consola, pois no final do dia, ainda ninguém foi capaz de responder a uma simples pergunta. A quem pertence a propriedade intelectual?