Esperei inúmeros verões para que o gin passasse de moda. Muitos ainda não acreditam nisto, uma vez que não surgiu uma nova bebida para substituir o seu lugar na sociedade e cultura que encorpamos, mas digo-vos, não foi preciso aparecer o gin para revirar os olhos sempre que havia alguém no meu grupo a pedir uma caipirinha ou, pior, uma caipirosca. Nunca entendi as correntes que transportam a nossa cultura, nunca entendi o porquê de pedir algo in em detrimento da nossa bebida preferida ou, na ausência desta, em detrimento de experimentar outras. Pior ainda, a moda do gin não é a moda do gin, é a moda do copo: poderia servir vinho tinto de três euros do LIDL com Coca-Cola num copo de gin que provavelmente passava.

O que estás a beber, charmoso colega? – disse a moça brain dead, com o intuito de mostrar interesse pelo amigo que há umas horas havia postado as suas fotos de tronco nú nas redes sociais, depois de mais uma árdua sessão de ginásio para um boost da sua auto-estima. Este havia decidido de livre vontade parar de tomar a medicação para a cabeça para poder brilhar na noite com o seu glorioso copo balão de trinta e cinco centilitros.

Ah, é uma recomendação especial do barman, está incrível! – responde.

E eu digos-vos: vinho rasca com Coca-Cola. Uma iguaria que só alguns conseguirão apreciar, nomeadamente os que não percebem nada do assunto e só querem algo vistoso para segurar. Desejo a todos aqueles que vivem na terra dos sonhos uma vida feliz e tudo de bom, eu cá prefiro agradar-me primeiro com o principal propósito daquilo que compro.

Mas por ser demasiado apegado às coisas que gosto não excluo a possibilidade de inovar com pequenas variações. Não sou mais apreciador de gin tónico de que água tónica, mas se houve algo que gerou em mim genuína surpresa foi a diferença que o apertar da casca de um citrino sobre o copo, seguido de um escorregar da mesma pelas suas bordas e finalmente deixando-o cair para a bebida faz sobre uma simples mistura de gin com tónica.

Estamos em 2017 e bastante longe de quando os jogos de puzzle estavam na moda. Slayaway Camp saiu em 26 de Outubro do ano passado, a forma como se apresenta é extrema e brutal e isso só joga a seu favor. Deixem-me explicar:

Todo o trailer que possam ver de Slayaway Camp consegue representar toda a introdução de cada conjunto de puzzles. Cada um deles, apesar de funcionar de forma essencialmente semelhante (apenas vão introduzindo mecânicas novas), tem um setting e personagens diferentes (de acordo com filmes também diferentes, ainda que todos de thrillers sangrentos), e são apresentados de forma luxuosa com gráficos blocky à la Minecraft, filtros de vídeo vindos directamente dos anos oitenta e narração dramática retiradas do trailer do último blockbuster do ano passado. É isto que dá todo o charme a este jogo, é este o zest que acompanha este tipo de gins tónicos fora de moda a que chamo jogos de puzzle. A banda e efeitos sonoros são bons e recomendam-se, mas não se encontram lá para entreter mas é definitivamente um bom suporte ao tom que o jogo estabelece.

É um jogo extremamente simples de se pegar e aconselhado a todas as idades não fosse a sua apresentação. E essa apresentação poderá na verdade dar a imagem errada: da mesma maneira que nem tudo o que está num copo de gin tónico é gin tónico (poderá ser tinto rasca e Coca-Cola) nem tudo o que tem bom aspecto é bom. Mas a verdade é que a consistência do jogo é mais que suficiente para iniciar qualquer pessoa em puzzle games como propor um bom desafio aos veteranos. Em cada nível pretende-se assassinar todas as personagens no cenário e terminar numa casa específica do tabuleiro, sendo que sempre que desejamos movimentar a nossa personagem numa direcção ela terá de percorrer sempre o número máximo de casas. Slayaway Camp conta com quase duas dezenas de sets de vinte níveis, o equivalente a talvez cerca de 10 horas de jogo.

Assim se resume um excelente jogo e se mostra que estes não têm necessariamente de estar associados a uma enorme inovação de gameplay, às vezes basta um zest de bom aspecto para o tornar melhor e apelativo. Quanto a eu querer que o gin passe de moda, bem, não passa do meu desejo secreto de poder voltar a beber sem me sentir insultado pela minha fatia cerebral encarregue dos julgamentos baseados em preconceitos. No fundo, estou a ser tão ou mais triste por não o fazer, mas a verdade é que com as coisas que verdadeiramente gosto, nomeadamente puzzle games, é mais que impossível deixar de os jogar. Se esta não for a vossa praia talvez este pequeno twist no tom e produção vos agarre, mas a verdade é que a probabilidade de não gostarem de Slayaway Camp (ou pelo menos de não lhe reconhecer valor) é praticamente nula. Este magnífico jogo está disponível no Steam pela módica quantia de 8,99€, um gin tónico em Cascais por 15€. Podem jogar uma versão mais humilde de Slayaway Camp gratuitamente no Kongregate.