Mystery Box é uma rubrica mensal de temas-surpresa aleatórios ligados aos jogos e a outros meios interactivos, digitais e não-digitais, apresentada por Isaque Sanches.

Já ouviu falar de Circa Infinity?

Circa Infinity é um jogo 2D criado por Kenny Sun quando tinha apenas 22 anos.

O jogo é um sidescroller circular com níveis recursivos (são esferas dentro de esferas dentro de esferas, e por assim em diante); a paleta e a estrutura espacial criam um efeito hipnótico tanto no jogador como em que está a apenas a observar.

Quando Sun apresentou Circa para Greenlight apenas tinha uma demo grátis na Internet. O autor queria fazer carreira de criação de jogos, mas tudo indicava que este jogo, que tinha sido criado como projecto de fim de curso, não ia ter muita visibilidade. O jogo esteve parado durante algum tempo. Os votos na plataforma de curadoria democrática do Steam não eram suficientes para uma aprovação. Até que um dia Felix Kjellberg, conhecido por PewDiePie, figura lendária do Youtube que faz 12 milhões de euros por ano a filmar-se a si próprio, filma-se a jogar o jogo.
Circa Infinity hoje existe em diversas plataformas em mobile e PC.

Conheci o jogo em Zurique em 2016, no festival Ludicious. O festival em questão é conhecido por acarinhar jogos e autores mais experimentais e mais fáceis de serem carimbados com a palavra “artístico”; é um projecto relativamente recente que quer ser uma Nordic Games e uma A-MAZE em simultâneo, não tendo a escala do primeiro e não conseguindo replicar o estilo do segundo, ficando com o pior de dois mundos (pelo menos nas suas primeiras edições). Na exposição do festival abundavam jogos experimentais de diversos tipos, havia bastantes com problemas técnicos, havia bastantes com jogabilidade desinteressante, mas uma mão cheia (ou nem isso) de jogos tinham lá sempre gente à sua volta.

Circa Infinity chamou-me logo à atenção primeiro por isso. Depois pela sua simplicidade: era diferente, tinha uma linguagem visual própria, mas percebia-se com facilidade do que se tratava, o que é que o jogador controlava, o que era suposto fazer e não fazer, e como ganhava. O ecrã era rico em informação mas lia-se rapidamente. E terceiro porque não era melodramático, nem tinha uma música lenta e introspectiva, não tinha um filtro de granulação, não era mais um platformer sobre uma criança perdida num mundo cinzento e letal, não abria com um familiar a morrer de cancro ou de tuberculose, não citava nem fazia name dropping a obras conhecidas de cinco em cinco minutos para auto-validação; os clichés do autorismo indie não estavam lá, não tinha ambições de ser mais do que aquilo já era.

Percebi que o jogo que se encontrava por detrás de uma pequena parede humana, e que o meu campo de visão apanhava entre duas cabeças, era um dos muitos exemplos do melhor que o design experimental tem para oferecer aos videojogos.

Circa Infinity é uma ideia simples, diferente, executada de forma brilhante.

Acabei por experimentar o jogo um pouco depois, e confirmar essa opinião.

Convido-o a fazer o mesmo.

Isaque Sanches