Desde que tenho memórias de infância, a tecnologia, de uma forma geral, foi algo que sempre me fascinou. Para mim, mais importante que a origem do universo, é a evolução da tecnologia. Foi esta paixão que me levou a estudar Eletrónica. Saber como funciona um carro telecomandado, um rádio, uma televisão, uma consola, foi algo que sempre me cativou de forma quase obsessiva.
Eu cresci numa família de classe baixa e por isso tive a primeira televisão a cores com 7 ou 8 anos. Como podem imaginar, consolas e jogos eram coisas com as quais apenas tinha contacto através de amigos do bairro ou da escola. Como consequência, o Retro tornou-se uma questão em que a paixão pela tecnologia primária “Casou” com a uma baixa condição económica.
Quando terminei o curso de Eletrotecnia\Eletrónica descobri que tinha a capacidade de reparar estas máquinas antigas e que grande parte das pessoas estavam a desfazer-se delas em prol das consolas e computadores mais recentes.
Foi assim que comecei a comprar todas as consolas que tinha jogado anos antes em casa de amigos e que sempre desejei ter mas que na altura do seu lançamento custavam uma pequena fortuna (pelo menos para mim). Reparar, estudar e jogar nestas máquinas era algo magnetizante para mim.
No final dos anos 1990 (início de 2000), o número de pessoas ligadas ao universo Retro era praticamente irrisório. Estávamos no início da Era PlayStation 2, pelo que o mundo Retro estava quase, por inteiro, enterrado no passado.
Em 2001 comprei 2 consolas Mega Drive na Feira da Ladra, pelo preço de… 1€ cada! Leram bem – um euro! No meu caminho de procura de tesouros eletrónicos do passado, o valor mais alto que dei por uma consola usada foram 25€ por uma Atari 2600 com 30 Jogos, completos, nas suas caixas originais.
Aos poucos fui comprando consolas e microcomputadores, até conseguir ter todas as consolas e uma boa parte dos micros alguma vez comercializados em Portugal. Durante anos esta era a minha grande paixão. A representação do meu amor pela história da tecnologia e o coleccionismo. Como todos provavelmente terão notado, recentemente o interesse do Mundo pelo RetroGaming cresceu exponencialmente.
Quase de repente, quando dei por isso, vi há minha volta um cento de pessoas ligadas ao Retro, mas as suas motivações pareciam ser completamente diferentes das minhas. Uma grande parte destas pessoas com as quais me cruzo, não tem qualquer paixão pela tecnologia e genialidade dos seus criadores. Usam o Retro como status-quo, uma forma bonita de dizer que: querem aumentar o seu estatuto perante a comunidade ou como investimento económico.
No meio desta moda surgem os oportunistas que invadem o mercado comprando múltiplas unidades de uma consola e/ou jogo de forma a criarem uma falsa ilusão de raridade e depois lucrarem ao venderem os seus artigos a preços altamente inflacionados.
Mas pior mesmo são os catedráticos em tecnologia e videojogos que surgem de todos os cantos a escreverem livros e a darem palestras sobre o que leram na internet sem qualquer tipo de preocupação em confirmar a informação que encontraram, alimentando e promovendo assim, a ingenuidade e desconhecimento alheio. Dada a oportunidade e a visibilidade mediática, estas pessoas são consideradas como referências, alienando os factos e reescrevendo a História que cada vez mais se afasta da realidade.
Dou-vos como exemplo um dos mais respeitados livros no mundo, sobre a história dos vídeo jogos: The Ultimate History of Video Games de Steven L. Kent.
Às páginas tantas, o senhor Steven L. Kent resolve reescrever o guião original do Regresso ao Futuro e coloca a adorada personagem de Marty McFly, interpretada por Michael J. Fox, a jogar Hogan’s Alley em vez do famoso Wild Gunman.
Se noutra altura da minha vida, situações como estas seriam o combustível perfeito para querer escrever mais e investigar mais, neste momento apenas sacudo os ombros, num misto de tristeza e alguma frustração, e penso apenas em relaxar. É que, com algum pesar, constato que Este já não é o “meu mundo” – já não é a comunidade com que eu me identifico.
Não digo com isto que esta comunidade é melhor ou pior do que aquela na qual eu cresci (quase inexistente mas firme)… é simplesmente diferente dessa que conheci originalmente e que alimentava a minha paixão.
Felizmente sou um homem de muitas paixões e esta certamente fará parte de mim até morrer, mas por agora vou-me desfazer da minha coleção ficando apenas com um ou outro objeto mais sentimental!
Tal como as calças à boca-de-sino, também esta moda passará mais cedo ou mais tarde e quem sabe, nessa altura ficarão apenas os verdadeiros apaixonados. Até lá continuarei a escrever sobre estas “velhas” relíquias, uns dias com mais paixão, outros com o sentido de missão dada-missão cumprida. Estes objectos farão sempre, mesmo que me desfaça deles, parte de mim e em cada chip que um dia eu desmontei, está a história da criança que se apaixonou pela tecnologia. O Adulto perdeu, em parte, o fogo do entusiasmo – mas continua, através da escrita destes artigos, a partilhar a magia do Retro com quem os lê. E, no final de contas, a paixão partilhada, é o melhor que levamos na vida.
Mas porque tenho um mundo de coisas para vender, (e a mulher quer espaço para as consolas dela)… Já agora – conhecem alguém que esteja interessado em comprar jogos e consolas antigas?!