Há cerca de ano e meio, em plena campanha de Kickstarter de Friday the 13th: The Game a Alexa teve a oportunidade de entrevistar um dos actores que interpretaram o papel de um dos personagens da História do cinema que ela mais adora, Kane Hodder, que em tempos utilizou a máscara de hockey sangrenta de Jason Vorhees.

Friday the 13th: the Game apresentava-se ao escrutínio do crowdfunding a prometer um regresso (a sério) do mercado dos videojogos a Camp Crystal, depois da última tentativa ser aquela coisa indescritível que a Atlus desenvolveu em 1989 para a NES.

Antes de mergulharmos no lago e percebermos o porque desta nova tentativa de reproduzir a emblemática série de terror dos anos 1980 falhou por completo, marcando aquela que é a terceira tentativa falhada de criar um Jason jogável decente (exceptuando o caso do seu cameo em Mortal Kombat X), temos de identificar um elemento-chave no estúdio Illfonic, responsáveis por este jogo: a verdadeira paixão que estes criadores têm pelo material original.

Aliás, o que temos ultrapassa a paixão e chega ao campo do conhecimento profundo sobre a série de filmes, e acredito que isso não se deva apenas ao facto de existirem colaborações de diversas pessoas ligadas aos filmes, o que inclui o realizador e criador do primeiro filme, mas porque se percebe pelos incontáveis pormenores que o jogo tem e que são de e para fãs.

Friday the 13th: the Game é um jogo multiplayer assimétrico que comprova todos os problemas que o subgénero possui. Basta pensar no impacto que o Evolve teve nos dois jogos que fiz na Gamescom com outros membros da imprensa e com developers, que me deixaram tão entusiasmado que esse acabou por ser o meu jogo de toda a feira, e a reacção que tive quando fiz alguns jogos com a equipa do Rubber depois do lançamento.

Um jogo multiplayer assimétrico tem um problema fulcral, e que poucas ou nenhumas vezes foi bem resolvido, e eu falo do balanceamento entre os dois lados. Este equilíbrio não é apenas mecânico, na tentativa de colocar com o mesmo peso e as mesmas hipóteses de sucesso o “poder” ou as “capacidades” de ambos os lados, mas ter o afastamento crítico suficiente para conseguir medir se é tão divertido jogar com um lado quanto com o outro.

Evolve esteve perto de conseguir esse equilíbrio ao criar ritmos diferentes de jogo para o monstro e para os caçadores, alterando ao longo de cada match os papéis de caçador e presa, mas falhando no essencial, que é a diversidade do próprio jogo e qual a longevidade que essa limitação permite.

Crawl, do qual falámos há meses, é possivelmente o jogo mais equilibrado na assimetria, não só porque torna divertida a jogabilidade entre ser um espírito ou ser o caçador humano, como cria um sistema de recompensas beneficiando os melhores jogadores, e culminando no excelente ritmo de troca constante de papéis entre os dois lados da barricadas.

Infelizmente Friday the 13th: the Game decidiu erroneamente seguir o exemplo do jogo da 2K, especialmente por sabermos que Evolve foi fulminante entre o entusiasmo generalizado e a percepção de que resolver a assimetria mecânica é mais difícil do que parece.

Também aqui a escolha entre os dois lados do jogo, entre o Jason e os monitores dos campos de férias é aleatório, o que irá deixar logo à partida o aborrecimento à grande maioria porque convenhamos: toda a gente quer jogar com o Jason. E isto não é apenas porque o personagem é hiper-poderoso e divertido de jogar com as suas habilidades sobrenaturais que tentam mimetizar o efeito assustador do serial killer fictício, permitindo-nos teleportar para a frente dos monitores, ou senti-los à distância através do seu medo.

Toda a gente quer jogar com Jason porque é incomparavelmente mais divertido neste jogo de gato e de rato que é Friday the 13th: the Game, onde a missão de Jason é matar todos os monitores dentro do tempo limite, e a destes é conseguir escapar, ou, através do cumprimento de uma série de eventos dificílimo conseguir matar Jason.

A diferença de desafio também é grande. Se Evolve era relativamente equilibrado apesar dos erros que cometeu, aqui em Friday the 13th: the Game há um desequilíbrio tremendo entre a forma de conduzir à vitória Jason e os monitores, que se equipara ao mesmo desequilíbrio de diversão.

A rejogabilidade é algo limitado e está correlacionada com o que há para fazer ou desenvolver em jogo. O único modo disponível neste momento vai certamente fazer esgotar a candeia de entusiasmo de grande parte dos jogadores, mesmo para aqueles que tenham a sorte de jogar no papel de Jason com maior frequência.

Existem unlocks pós-jogo, não só habilidades para os diversos Jason – a equipa da Illfonic criou iterações distintas do monstro com habilidades e fraquezas diferentes mediante o filme em que essa versão entrou – para além de podermos ir desbloqueando ao mesmo tempo monitores que sejam ligeiramente mais competentes na difícil tarefa de escapar a Jason do que outros.

Visualmente o jogo consegue criar o ambiente tenso dos filmes, ainda que alguns bugs e glitches recorrentes acabem por estragar todo o build up de terror que se vai fazendo em cada match up.

Infelizmente não tive oportunidade de o jogar com amigos, que é talvez a única grande forma de usufruir do jogo verdadeiramente apesar dos desequilíbrios óbvios da assimetria, transformando este jogo que falha em alcançar tanto uma equilibrada experiência multiplayer como uma verdadeira aura de terror num pseudo-party horror game. O lado dos monitores jogado apenas com jogadores aleatórios é quase injogável, pois a vertente obrigatória para conseguir ultrapassar a quase imparável ameaça de Jason é uma boa comunicação e entrosamento.

Friday the 13th: the Game tem boas ideias e é um produto de paixão. Mas deveria ter visto outros exemplos do mercado como cautionary tales, especialmente Evolve que contava não só com maior orçamento e uma equipa maior e mais experiente e falhou redondamente na tentativa de reproduzir uma agradável e equilibrada experiência assimétrica multi-jogador.

Mas para qualquer fã da série de filmes e de Jason Vorhees há aqui muito respeito e conhecimento profundo sobre o seu universo, e para esses a experiência de o jogar pode ser ligeiramente melhor do que para qualquer outro, deixando Friday the 13th: the Game no limbo da boa execução como naquele momento recorrente dos filmes em que parece que o personagem vai escapar com vida e afinal acaba por morrer.