É quase uma blasfémia associar esta criatura e os seus comparsas à fantástica obra que é Fire Pro Wrestling World, contudo não consegui resistir a fazer a minha afirmação da maneira mais assertiva possível, tal e qual como o ser da imagem fez há uns meses. Com uma diferença enorme. Eu tenho razão.
Há algumas semanas atrás fiz um artigo sobre Fire Pro Wrestling no Game Boy Advance e a minha grande paixão pelo jogo, portanto assim que pude comprar a mais recente edição em Steam Early Access lancei-me a ela, na minha parca disponibilidade temporária. Na verdade não sei quantas horas de jogo tenho na altura de escrita deste texto, mas sei que apenas 10 a 15% do meu tempo foi passado no ringue. Foi o suficiente para confirmar que continua a ser o melhor jogo de wrestling alguma vez feito, o mais tecnico que já viu a luz do dia com uma jogabilidade coesa e quase isenta de falhas, que estão a ser agora controladas pelos designers que respondem rapidamente aos comentários da sua comunidade.
As lutas continuam a seguir o seu ritmo perfeito de crescendo gradual passando de golpes fracos para médios para os mais fortes e finalizadores, em troca constante com pausas para ganhar fôlego, num bailado violento até ao clímax do assentamento ou submissão final.
Toda a mecânica dos jogos antigos está lá, assim como a falta argumentos pré-feitos, de discussão e feudos entre wrestlers pré-programados porque não fazem falta ali. Para isso, e para uma jogabilidade de button mashing sem sentido há outras franquias anuais disponíveis, para qualidade e acima de tudo liberdade, há Fire Pro Wrestling.
Para todos os efeitos o jogo está completo, ou melhor, à luz da indústria actual podia ter sido lançado como um produto finalizado e depois levar com uma série constante de patches de correção. Ao invés disso a Spike Chunsoft decidiu fazer o correcto, lançou o jogo em Early Access para que a base de fãs fiéis e exigentes os ajudassem a corrigir as suas falhas e apenas depois disso poderem editar o produto final e portar para PS4 e se os deuses novos e antigos assim o permitirem para a Nintendo Switch também.
Fire Pro Wrestling World é um jogo técnico, é um jogo em que maior parte do tempo é passada na criação de tudo. Aqui aponto a única falha até este momento, que já enviei para os developers, que é dificuldade de manobra nos menus. É muitas vezes uma tarefa árdua, especialmente quando temos acima de 50 lutadores, eu tenho uns 140 e há quem tenha para cima de 1000, simplesmente porque é possível, nada mais nos limita aqui.
Da clássica WWF 85 a 95 à Attitude Era da WWE daí a 2000, passando pelas extintas ECW e NWO ou ligas Japonesas, Mexicanas, Europeias, Amadoras, até tenho uma Fantasy League cheia de personagens fictícios do Batman ao Frieza, de Mario ao Doctor Who, actual detentor do Cinto All of Time and Space. Será que vai ter que ser detentor do título feminino também?
O nível de construção é incrível, noutros jogos podemos criar lutadores mas neste criamos personagens, damos-lhes uma identidade artificial, uma personalidade e comportamento de ringue que funciona sozinha. A marca de uma boa criação em FPW é aquele que podemos colocar a lutar contra outro CPU e quando o combate acaba ficamos tão ou mais entretidos que a ver qualquer uma das grandes marcas de sports entertainment na TV, mesmo sem a novela que a envolve, porque podemos apenas imaginar o que levou aqueles dois àquele momento.
Um dos melhores aspectos deste jogo em Steam, ao contrário das suas edições passadas é a comunidade que o acompanha e a sua profundidade de dádiva. Recebemos dele o que quisermos. Se queremos um editor de wrestling em que criamos marcas, ringues, títulos, lutadores, árbitros podemos fazê-lo. Se não temos paciência para isso temos toda uma Steam Workshop com mais de 4000 à distância de um click. Feitos e prontos a usar em lutas. Ou podem optar pelo meio termo que a minha falta de disponibilidade me obriga que é ir buscar os lutadores já feitos, colocar nas minhas ligas e depois apenas afiná-los ao meu gosto.
Olhando para o jogo podemos perguntar porque raio iremos tentar algo com gráficos de 1995, que é perfeitamente válido se o que procuram num jogo é apenas estético. Tendo em conta o nível intenso de jogabilidade deste, o facto dos gráficos serem mais simplistas é uma mais valia na minha opinião. Pegando no exemplo do concorrente WWE2K, por melhor que tente fazer o meu personagem ele parece um pouco estranho e falso, nunca terá o nível de pormenor que os outros lutadores têm vindos da fábrica. São um pouco como ver o Roger Rabbit no mundo dos humanos ou o Michael Jordan no dos Looney Toons. Estão lá, mas não pertencem ali totalmente. Quando metemos todos os lutadores, oficiais ou não no mesmo ringue parece pertencer ao mesmo mundo e não figuras de borracha num mundo de carne.
Fire Pro Wrestling é uma caixa de brinquedos, tal como o meu ringue da WWF era utilizado para os wrestlers que tinha, também lá iam parar G.I. Joes, Transformers e Playmobil, porque quando somos crianças não nos importamos com a pureza das franquias, na nossa imaginação tudo é válido, respondemos sempre “Porque não?” a quem nos pergunta “Porquê?”. Permite-nos fazer as lutas mais rocambolescas que a nossa cabeça possa criar, permite-nos reviver momentos de infância e mete a imaginação a funcionar porque não nos dá tudo feito, é como um balde de Lego que nos é posto à frente para fazer dele o que quisermos. Não é para quem não gosta de wrestling ou para quem gosta que a comida seja dada à boca já mastigada.
Para verdadeiros fãs de Luta Livre e bons jogos. Altamente recomendado com lugar garantido nos Machados de 2017.