Caçada semanal #103

Abrir a janela de browser interno do Steam é quase uma viagem a bordo da TARDIS. Das centenas de indies que chegam à loja digital por mês, a grande maioria acaba por apostar num visual (e até géneros) retro por força das constrições técnicas das próprias equipas ou até por decisões conceptuais.

Nestas mais de uma centena de caçadas semanais tivemos já algumas edições dedicadas a jogos com visuais retro, alguns deles verdadeiramente genéricos, mas felizmente os 3 jogos desta semana são dos mais divertidos que tivemos o prazer de receber em algum tempo.

Spark the Electric Jester

Depois de ter desenvolvido com sucesso dois dos mais acarinhados fan games de Sonic, the Hedgehog: Sonic Before the Sequel e Sonic After the Sequel, LakeFeperd, aliás, Felipe Daneluz voltou a pôr a “mão-na-massa” para desenvolver um dos melhores old school platformers deste ano.

Numa união mecânica entre dois improváveis personagens, Spark the Electric Jester é o resultado da pergunta “o que aconteceria se o Sonic e o Kirby se envolvessem amorosamente e tivessem um filho?”. Ainda que esta seja uma pergunta que nunca tenha sido feita na curta História dos videojogos, Felipe decidiu mostrar-nos o resultado ao desenvolver este excelente jogo de plataformas.

Spark the Electric Jester combina da melhor forma a velocidade e o level design dos Sonic de 16 bits, com um detalhe e qualidade de cenários que fariam deste jogo um dos melhores de sempre se tivesse saído originalmente na Mega Drive.

A todo o dinamismo de Sonic foram adicionados uma multiplicidade de poderes à la Kirby, em que Spark veste um disfarces que lhe conferem poderes distintos que ora podem ajudar-nos no combate propriamente dito, como na ultrapassagem dos desafios dos próprios níveis.

Indies obrigatórios deste ano? Spark the Electric Jester, que em nada fica a dever à melhor memória que temos dos nossos Sonic de 16 bits.

A Tale of Caos: Overture

No último mês temos tido a sorte de nos cruzarmos quase por acidente com novas aventuras-gráficas, quase todos deles tão abaixo do radar que dificilmente encontrarão mais do que dois ou três artigos pela internet que falem desses jogos.

Um desses casos em que tropeçámos completamente por acaso foi A Tale of Caos (sem gralha): Overture, a história de Terribilia Van Quinn (Terry para os amigos), a brilhante aprendiz do (óbvio) vilão intergaláctico Albion McMaster.

Todo o enredo é hilariante, a começar pelo facto de que Terry não tem qualquer consciência da vilania do seu mentor, auxiliando-o descomprometidamente na sua demanda pela conquista e pelo poder.

Visualmente exímio na sua captação do ambiente e da arte de jogos como Quest for Glory, A Tale of Caos: Overture é notoriamente melhor nos campos narrativos e visuais no que na componente mecânica. Se os diálogos e o enredo são do mais genuinamente humorístico que temos visto em aventuras-gráficas revivalistas, os puzzles e mecânicas de progressão na história acabam por ser muitas vezes ou excessivamente encriptados, ou demasiado dependentes do esgotamento de árvores de diálogo para avançar na história.

Para fãs de jogos clássicos da Sierra, os 3 episódios que compõem toda a história de Terry e da sua coruja mecânica Heimlich são bastante divertidos, e que só não são constituem uma das melhores aventuras-gráficas do ano devido a algumas fragilidades de game design.

This Strange Realm of Mine

Lembram-se da altura em que a simplicidade mecânica de Doom e Duke Nukem 3D abriram as portas para alguns dos momentos mais efusivos que tivemos na nossa adolescência enquanto jogadores? Quando o ambiente tridimensional habitado por sprites animados que nos perseguiam e que faziam jorrar sangue, também ele pixelizado, pelo ecrã?

This Strange Realm of Mine pega nesses FPSs clássicos e deita-os na marquesa, psicanalisa-os e deixa-os sair do consultório como uma nota na mão a revelar que todos os esforços são infrutíferos e que apenas a morte será resposta.

Num mercado com pretensões hiper-realistas como é o dos videojogos nos dias de hoje, sentimos uma grande surpresa em ficar verdadeiramente com “pele de galinha” com o ambiente que o jogo cria. Num FPS notoriamente mais narrativo, profundo e psicológico que arranca logo após a criação do nosso protagonista para a sua morte.

O que se segue é uma viagem assustadora para escapar do Inferno, onde as ideias do mesmo são algo distantes das pré-concepções que temos do mítico reino.

This Strange Realm of Mine conseguiu agarrar-nos de início no quão assustador era o ambiente inicial, onde tínhamos de optar por iluminar os corredores escuros com a nossa tocha ou empunhar uma arma de fogo. E aquelas criaturas disformes/sprites animados num espaço quase em total escuridão a caminharem de forma errática conseguem ser mais assustadores que qualquer zombie hiper-realista da actualidade.