Vinho é sinónimo de Portugal.E cerveja também. E vá, licores e aguardentes. E comida, de todos tipos. Sopas, entradas, doçaria, sobremesas, pão e qualquer coisa que seja digerível e agradável ao palato. Um tycoon que apele às nossas papilas gustativas e à nossa paixão intrínseca por vinho é algo que nunca poderíamos deixar passar em claro.

Antes de mergulharmos nos doces aromas das mecânicas, algumas envelhecidas em carvalho e com notas de coesão, e tantas outras em que o vinho se transformou abruptamente em vinagre, é preciso referir a apresentação visual de Terroir.

Numa excelente mistura entre jogo de tabuleiro e modelação low poly, Terroir aparenta-nos sempre ser como uma ilha etérea no vazio de calmaria que representa todo o jogo. É possível que pelo meio das muitas falhas mecânicas do qual falaremos mais tarde, é mesmo a direcção artística, tanto ao nível da composição visual no ecrã, mas também de todo o elegante design, tipografia e ilustrações que enquadram o interface de Terroir e que encaixam como uma rolha de cortiça numa garrafa de vidro na temática e estética de todo o jogo.

Mas infelizmente são as decisões mecânicas e o excesso de aleatoriedade que configuram o tremendo calcanhar de Aquiles de Terroir, onde algumas decisões mais clássicas do género tycoon tinham resolvido, e quiçá, tornado este sui generis jogo de gestão muito melhor resolvido do que acabou por ser no seu lançamento final.

O tutorial é insípido, muito mais deslavado do que se esperaria num jogo cuja complexidade reside num plano invisível de estimativas e aleatoriedade. Aprendemos o básico dos básicos mas isso é altamente insuficiente para mantermos à tona o nosso negócio. Conhecemos, mesmo na vida real, todos os factores que condicionam um bom vinho, e que fazem de uma colheita específica ser algo que Baco serviria numa das suas orgias, ou uma zurrapa tão intragável, que só é bebível naquela fase da bebedeira em que até ácido de uma bateria parece aplacar a sede.

A intervenção do clima no amadurecimento das nossas castas depende de cada ano (sendo aleatoriamente definido pelo jogo quais os hexágonos que irão sofrer o efeito de intempéries ou de seca), e a partir daí temos de ir experimentando com as configurações para tentar chegar ao melhor vinho possível.

O resultado de cada vinho e das nossas escolhas parece também ele aleatório. Já me aconteceu ter uma colheita menos feliz mas a combinação (desconhecida) das configurações de produção de vinho levarem-me a ter um vinho aclamada pela crítica com 5 estrelas, e um, com o processo quase idêntico avaliado em 2 estrelas.

A forma de distribuição e venda a armazenistas/retalhistas parece-me excessivamente lento a escoar a nossa produção, e a realidade é que até hoje, e depois de mais de 20 tentativas, nunca consegui que a minha empresa sobrevivesse a um segundo Verão consecutivo.

Terroir é muito punitivo, na maioria das vezes sem percebermos sequer porquê, com a aleatoriedade a tomar um papel preponderante e a infligir-nos quase sempre o caminho da bancarrota. Como aqueles pais que se zangam com os filhos por praticamente tudo, deixando as crianças na dúvida sobre afinal o que andam a fazer algo de mal, ou se alguma vez fizeram algo de bem.

Terroir é um problema. Um conceito excelente (nomeiem alguém que ao ouvir “tycoon de viticultura” não tenha uma vontade quase imediata de jogar algo assim) associada a uma excelente direcção artística, destruída por algumas das decisões mais duvidosas em termos de tycoons que o género já viu, deixando toda a estratégia nas mãos instáveis da sorte, tornando-se apenas mais um daqueles casos em que o vinho poderia ser excelente se todo o racional de produção dele fizesse sentido.