Portugal é conhecido como sendo um país de navegadores, de Vasco da Gama a Pedro Álvares Cabral, Bartolomeu Dias a Fernão de Magalhães entre outros, por isso pergunto:

Porque não há piratas conhecidos também? Os Ingleses tiveram Captain Kidd, Sir Francis Drake e Blackbeard, os Franceses tiveram Francois l’Olonnais, até nos mares da China havia a temível Madame Cheng, contudo não há um pirata português de renome, quando só no mediterrâneo havia tanta rota comercial mesmo a jeito para ser pilhada. O mais ridículo é que havia imensos piratas portugueses*, mas nenhum foi famoso o suficiente para marcar a história, tirando talvez Bartolomeu o Português que diz a lenda pilhava embarcações espanholas nas Caraíbas por meados de 1600 e escreveu a primeira versão do que era conhecido como “O código dos Piratas”.

Ou seja, de todas as coisas que os Portugueses podiam ser conhecidos na nobre arte de Pirataria ficou a burocracia…

Companheiros, não mais isso irá acontecer, graças a Sea of Thieves os Portugueses poderão mostrar aos outros povos que quando os barcos são feitos de madeira, os homens são feitos de aço!

Mesmo que seja só madeira e aço virtual!

Ainda é cedo para falar bem de Sea of Thieves, provavelmente a maior aposta da Microsoft para 2018, este Shared World Adventure Game criado pela Rare é apresentado como tendo potencial para ser dos melhores jogos do ano, nem que seja só pelas paletes de SWAG** que tem no porão.

Durante a última semana estive a navegar os mares dos ladrões tanto quanto pude e consegui jogar o suficiente no que este beta permitiu para ter umas opiniões sobre ele, contudo nem todas são positivas, podia dizer mesmo que estou com alguns sentimentos mistos acerca dele. O jogo parece ser bom, tem imenso para dar mas por outro lado tem coisas que me deixam com o barco amarrado ao cais sem grande vontade de embarcar nesta aventura.

Tal como foi anunciado pela Microsoft e pela Rare, Sea of Thieves é um jogo multiplayer, é para ser jogado em conjunto num universo que calculo vá ser apenas PvP quando for lançado a 20 de Março, mas é dada a possibilidade ao jogador de não o fazer sempre da mesma maneira. Podemos jogar a solo se quisermos, ou podemos embarcar com mais um jogador, ou três. Quantos mais jogadores maior a embarcação. Tendo feito alguns jogos em parelha com vários jogadores a minha ideia é que o jogo é caótico, mas é um caótico bom. É neste caos que vai estar o desafio e diversão para todos, seja por tentar coordenar tarefas entre amigos ou estranhos ou até navegar um barco sem ajuda, a descoberta será constante já que vamos estar sempre a enfrentar algo inesperado.

Tanto quanto percebi a base principal do jogo irá consistir em fazer missões para companhias de comércio, compramos tarefas, cumprimos e ganhamos ouro e coisas tipo chapéus que irão subir a nossa reputação de pirataria e nos abrirá portas para novas missões mais complexas. É aqui que entra o caos, e é aqui que entra também a melhor parte de Sea of Thieves: a navegação. Seja a solo, em par ou equipa, a navegação é complexa quanto baste para não ser fácil, ao contrário de outros open-world/sandbox não é saltar para cima de um cavalo, ou entrar num carro e ir do ponto A ao ponto B. Subir e descer âncoras, ajustar velas, controlar o leme, remendar o barco, carregar e disparar canhões, é necessário controlar cada um destes aspectos, e se simples de o fazer como quando estamos a sair de um porto, não é nada fácil numa tempestade ou numa batalha. Um exemplo de quão complicado pode ser o jogo foi quando quis parar numa ilha pela primeira vez, e não sabia que que já devia ter subido as velas para fazer a aproximação mais devagar, ter a minha corveta alinhada para passar ao lado do meu objectivo e quando estivesse quase a chegar tinha que baixar a âncora. Obviamente encalhei, mas aprendi.

Navegar os mares de Sea of Thieves é um prazer, seja pela complexidade do jogo, seja pela possibilidade de exploração já que nem tudo está no mapa e mesmo o que está tem segredos escondidos, mas acima de tudo porque finalmente encontrei um jogo em que a física da água é superior à de WaveRace 64, isto pode parecer um pormenor mas num jogo em que 80% da acção se passa no mar, é essencial. Passei muito tempo de jogo apenas a explorar o mapa, sem rumo certo ou sem razão apenas gozando a liberdade que ele me permitia, a sensação de ter as velas abertas e apanhar o vento de feição para nos colocar a velocidade máxima é incrível. Foram várias as vezes que encalhei e fiquei sem barco, algo que não é grande problema porque basta esperar por uma sereia para fazer respawn saltando para um porto seguro próximo com um barco igual, a àgua é uma amante traiçoeira e com muitos segredos, entre muitas outras fiquei sem barco aos 15 minutos de jogo porque a sair do primeiro porto bati numas rochas e não remendei a Aries (nome que sou a todas as minhas embarcações), outra quando me aproximei de uma ilha e fui bombardeado com balas de canhão porque era um forte de esqueletos, mais uma quando me espetei numa rocha porque estava no convés a encher a caneca de grogue e outra vez num barco naufragado porque estava a ver o mapa, além da vez que me enfiei numa tempestade e fiquei lá… Contudo nunca encalhei bêbado, que considero ser das formas mais divertidas de tentar comandar o navio ou de lutar contra inimigos. Também raramente andei de balde na mão para tirar água que entrou por um rombo porque a maior parte das vezes deixava afundar enquanto aguentava o máximo possível no cesto da gávea, à Jack Sparrow.

Eu gostei de todo o sistema de jogo, sendo uma pessoa adversa por natureza a jogos em perspectiva de First-Person e/ou multiplayer estou muito ansioso por jogar Sea of Thieves como deve ser. Talvez seja porque tenho um gosto particular por piratas eu quero que a Rare seja bem sucedida neste jogo, mas tenho medo de algumas coisas.

Sea of Thieves é um jogo multiplayer e por isso mesmo é assolado de muitos dos problemas que podem vir desse universo “fantástico” que é a internet. Nos meus jogos com desconhecidos aconteceram várias coisas, entre ter ido parar a um barco com dois alemães e um ser de outra nacionalidade que não faço ideia em que nenhum falava inglês e foi muito frustrante (apesar de não ser falha de ninguém porque não é obrigatório falar inglês) a ter sido colocado na jaula por outros, porque sei lá… os outros três não foram com a minha cara. (Como o jogo não permite kickar um random permite por outro lado que a maioria da tripulação vote para um membro ser preso no porão, não por estas razões mas é algo que pode acontecer). É triste e estúpido especialmente quando o jogo inicia automaticamente o team speak e a razão pelo qual os meus “companheiros” o fizeram foi porque tomei o lugar de alguém que eles estavam à espera. Tinha sido mais simples explicarem e eu ia embora, mas são atitudes normais neste ambiente, infelizmente. No assunto de team speak há uma coisa interessante, o jogo não abre só a nossa, em caso de batalha desde que os nossos adversários estejam a uma distância audível também temos acesso às conversas deles o que adiciona mais caos e confusão às lutas porque enquanto gritamos as nossas ordens ouvimos o que estão a tentar fazer contra nós também, é ainda mais divertido quando toda a tripulação é “estrangeira” porque dá mesmo a sensação de estar a atacar um navio inimigo.

É lindo!

Este é um jogo de pirataria caso não tenham reparado ainda, mas para já no beta só podíamos fazer missões e não existiam propriamente uma panóplia de navios mercantes para pilhar, os ataques eram feitos a outros navios piratas, ou piratas em ilhas e portos. Para já, foi das partes que mais gostei e mais detestei em Sea of Thieves porque enquanto é divertido num 4 para 4 com alguma táctica e muita confusão à mistura, mais que uma vez fui atacado por embarcações maiores e em superioridade númerica quando navegava a solo. Na última, por exemplo, fui atacado por um barco de espanhóis que me afundaram enquanto se riam. Culpa minha porque apanharam-me distraído. Enquanto um deles mergulhava para ver se tinha algum tesouro que pudessem roubar e os outros esperavam que eu viesse à superfície para provavelmente me encherem de chumbo, consegui aguentar o suficiente para fazer respawn ao meu barco e voltar para um porto seguro onde iria seguir aquela regra máxima dos piratas “fugir, para poder fugir outro dia também!” indo o mais longe possível destes “nuestros amigos”.

Contudo o meu porto seguro era próximo de onde os sacanas me tinham afundado. Eu via-os a navegar, e aí veio à minha cabeça uma das minhas frases favoritas de Pulp Fiction.

The night of the fight, you may feel a slight sting. That’s pride ****ing with you. **** pride. Pride only hurts, it never helps.” – Marcellus Wallace

Dessa vez e só dessa, deixei-me vencer pelo orgulho e mesmo sabendo que não tinha grandes hipóteses fui atrás deles, esperei pela noite, apaguei todas as lanternas e quando me viram a chegar viraram o lado para mim para disparar os canhões já era tarde demais, fui contra eles, subi para o convés do seu barco de espada em punho e disse:

Mi nombre és Capitán Machado hijos de *uta!!!

E desliguei o jogo!

Não sei se afundei o barco deles ou não , é indiferente, foi uma questão de principio moral. Este foi dos poucos rage quits que fiz em qualquer jogo e de todos o meu mais calmo e calculado de sempre, o que quer dizer que não foi bem um rage quit mas simplesmente uma ventilação de frustração. Bem sei que é a lei do recreio em que os mais fortes, nem que seja pela força dos números, atacam os mais fracos mas deixa-me preocupado quanto ao sistema de matchmaking mais para a frente que estas situações tirem o prazer de quem quer simplesmente navegar sozinho, como eu quis fazer muitas vezes.

Sea Of Thieves pode ser um grande jogo, vai ser um jogo polarizante no mínimo. Vão adorar ou detestar, mesmo quem adorar vai ter partes que detesta. Para já, tenho boas impressões que se sobrepõe aos meus receios. No mínimo fica a ideia que será uma coisa que poderei jogar com o meu irmão, na melhor das hipóteses para a população geral que tem uma Xbox One ou um PC com Windows 10, será um jogo que eventualmente jogadores conseguirão organizar verdadeiras armadas e clãs sem destruir a diversão quem quer apenas passear nos inevitáveis sete mares.

*Talvez a razão de piratas Portugueses não serem conhecidos sejam os seus nomes pouco imponentes como: D. Fuas Roupinho, Manuel Pessanha, D. Moisés Cohen Enriques, David Abravanel e Rocha o Brasileiro, que acho que não tem nada a ver com o Rocha do Duarte e Companhia, mas nunca se sabe. Também tinhamos Yanez de Gomera que era o amigo do Sandokan, mas acho que esse não conta.

** a piada do SWAG é do Pedro Nunes, portanto devo-lhe oficialmente um copo pelos direitos de autor.