Se a história recente do facto da Cidade do Cabo ser a primeira metrópole a ficar sem água não é um sinal de alarme para o nosso estilo de vida, então não sei o que será. Ayo: A Rain Tale fala precisamente do problema da falta de água, à medida que controlamos a titular Ayo pela África subsariana na missão de encontrar e trazer água para a sua família.

Mais do que a história engraçada mas mal-desenvolvida (como veremos um pouco mais à frente), Ayo: A Rain Tale falha-nos ao fazer-nos perceber o quão mal-cozidas estão as suas costuras, e que um jogo com uma direcção artística “engraçadinha” não é o suficiente para fazer um bom jogo.

Falemos desse que é enganadoramente o grande argumento de venda de Ayo: A Rain Tale, a sua direcção artística. Se virmos as imagens promocionais, screenshots e trailer, o visual ilustrado de Ayo salta-nos à vista. A sua paleta que evoca uma linguagem tribal e encantadoramente africana, com uma boa utilização de efeitos luminosos sobre si.

Se regra geral esta delicada expressão artística funciona, em especial no detalhe da protagonista, com uma análise ligeiramente clínica percebemos que o aspecto pincelado de grande parte dos elementos que compõem o cenário acaba por revelar mais um sinal primário do que propriamente a linguagem que o jogo vende.

Se pararmos para observar a pintura ao invés de a ver como um borrão em paralaxe, notamos que os elementos estão pintados de forma um pouco simplista, relembrando (para quem trabalha em ilustração digital) uns meros placeholders provisórios de cor nos elementos. Eu reconheço que esta pode ser alguma mesquinhice artística minha, mas quando o grande elemento de venda de um jogo acaba por ficar aquém do que nos mostra, ele precisa de ser enunciado.

É que o grande problema é que a componente mecânica é mais do que banal: é verdadeiramente enfadonha. Saltar plataformas, agarrarmo-nos a parapeitos e afins, são o standard do género, mas aqui feito de uma forma tão simplista e na maioria das vezes tão casual que cedo percebemos que se Ayo: A Rain Tale queria contar uma boa história, então devia tê-lo feito assumidamente.

Há uma diferença tremenda entre simplismo e simplicidade, e parece-me que no caso de Ayo: A Rain Tale se trata mais de uma deficiência da primeira do que de uma conquista da segunda. As animações da protagonista são relativamente toscas, o level design desinteressante que torna esta jornada de Ayo (e a nossa) uma verdadeira chatice, em que cada salto e cada nova plataforma são meras repetições de um ciclo infinito e aborrecido.

Mesmo a inclusão de pseudo elementos de metroidvania com entidades do folclore africano a dotarem-nos de poderes que nos vão ajudar a procurar água. O desenvolvimento do promissor enredo fica muito aquém da temática e das suas possibilidades, como aliás, quase tudo o que rodeia este jogo do estúdio Inkline.

Ayo: A Rain Tale é muito mais mediano do que eu queria que ele fosse. Há tão poucas expressões condignas do imaginário e da cultura africana, do seu cromatismo e mitologias, que esta tentativa de o fazer trazendo também um assunto sério à mistura é sobretudo uma oportunidade perdida.