Eu devia estar farto de zombies, sejam filmes, BDs, séries ou jogos. Já tudo devia estar feito com mortos-vivos que de diversas maneiras envergonhasse a existência do Romero e o fizesse dar tantos facepalms na campa que acabaria por ficar com a sua própria mão marcada como se tivesse sido visitado por um demónio grosseiro ou um grupo de membros mais irritados de uma claque de futebol. Mas não, Infectonator 3: Apocalypse vem em contra-mão na estrada das coisas que já estamos fartos e atropela-nos com um dos jogos mais surpreendentemente divertido que recebemos este ano.

Infectonator 3: Apocalypse é a sequela de uma série que nasceu e cresceu nos tempos áureos do Kongregate e que até foi uma das jóias da coroa da plataforma. É claro que existe um longo caminho percorrido desde os tempos de jogo flash e aquilo que é hoje um excelente indie strategy/arcade game, e foram essas surpresas que me garantiram não só 6 horas de jogo sexta-feira, como a impossibilidade de ir para a cama sem ter destruído a Terra primeira.

Aliás, deixem-me que vos diga, se a ideia de levar o planeta ao Apocalipse era coisa para me deixar agarrado uma série de horas, vidrado, sem sequer ter vontade de ir dormir, então não tinha feito uma série de alterações ao estilo de vida o que incluiu deixar de usar desodorizantes com clorofluorocarbonetos. É que o fim-do-mundo pode estar à porta mas também precisamos de dormir.

Este Infectonator 3: Apocalypse apanhou-me realmente de surpresa pela forma divertida, humorística e desafiante como encarou a temática. Ao primeiro contacto foi impossível não pensar no excelente jogo de tabuleiro Pandemic, em que tentamos impedir que uma pandemia alastre pelo planeta e leve a Humanidade à extinção. Mas aqui nós somos a pandemia, ou pelo menos uma espécie de entidade pseudo-divina cujo único intuito é transformar a raça humana em meros zombies. Só não acredito que sejamos realmente deuses porque seria estranho usarmos coisas tão mundanas quanto granadas e hamburgers repletos de vírus, mas somos algo, e esse algo quer desesperadamente transformar a infecção zombie numa verdadeira pandemia. E se possível antes dos malditos humanos descobrirem uma forma de o impedir.

Apesar da aparente casualidade da sua abordagem estratégica, Infectonator 3 é bastante difícil… até lhe apanharmos o jeito. Nas minhas 3 primeiras tentativas a Humanidade conseguiu desenvolver uma cura mais rapidamente do que eu consegui tornar a epidemia uma verdadeira pandemia, com a totalidade do globo (ou do plano, se por acaso quem nos estiver a ler tiver batido com a cabeça em criança e seja um Flat Earther) contaminada.

No início de cada jogo temos de escolher um continente que vai ser o foco inicial do contágio, e aí entramos numa zona e o objectivo é matar um determinado número de humanos. Se os aniquilarmos a todos temos um Perfect e o nível epidémico da região recebe um bónus. O funcionamento de cada nível é exactamente o mesmo desde o início ao fim: na nossa barra de ferramentas e poderes temos um número limitado de unidades que podemos colocar em campo, cuja missão é exterminar todos os humanos num nível. Cada missão termina quando todos os humanos ou zombies estiverem mortos (ou mortos-vivos) e é averiguada a nossa eficácia.

Se no início o mundo ainda não está ciente da ameaça do nosso vírus e os humanos presentes são transeuntes normais, à medida que o nível de ameaça global aumenta também as defesas dos humanos aumentam com ela: sendo que em níveis mais tardios já existem soldados com fatos HAZMAT e armados até aos dentes que nos dão dores de cabeça.

Em cada nível, e com a morte dos incautos humanos, recebemos dinheiro que utilizamos para comprar granadas e outras armas, mas também para fazer upgrades, sejam eles aumentar a resistência dos nossos zombies ou aumentar a probabilidade de transformar em zombie cada humano morto. O manancial de mortos-vivos que podemos equipar é bastante vasto e vai sendo desbloqueado à medida que avançamos no jogo, sendo que temos de ir fazendo crafting exponencial de zombies para alcançar as mutações mais avançadas e com maior poder. À medida que vamos cumprindo algumas metas (como matar os bosses de cada continente) também nos são atribuídos zombies especiais como o Freddy ou o Jason Vorhees, cujo nível de poder e passivas são extremamente úteis à medida que as defesas dos humanos começam a apertar-nos o cerco.

A grande dificuldade estratégica de Infectonator 3 é que não controlamos os movimentos dos zombies, apenas nos limitando a implantá-los e deixando que a sua “inteligência” artificial os conduza a caçar humanos. A dificuldade de não os podermos controlar é exemplificada nos mapas mais complexos com salas e reentrâncias, nos quais alguns humanos se escondem e os nossos zombies não vêem, impedindo-nos muitas vezes de obter o “Perfect” que tanto queríamos.

Após cada missão os resultados são-nos apresentados em formato de noticiário, e após centenas de níveis (sendo que terminamos muitos deles em menos de 15 segundos) começa a tornar-se aborrecido ter de assistir à animação toda de resultados, sem a possibilidade de fazer skip. Com a repetitividade dos níveis, ter de assistir sempre a esta sequência pós-missão torna-se dos momentos mais aborrecidos e até irritantes de um jogo que facilmente nos traga na sua aparente simplicidade.

O outro pecado capital de um jogo tão divertido e tão criativo na sua aplicação de mecânicas mais arcade de estratégia é quando (pelo menos em níveis de dificuldade normais) conseguimos finalmente encontrar uma estratégia que funcione, e a partir daí é relativamente difícil perdermos, ainda que alguns níveis e algumas boss fights nos possam dar água pela barba. No meu caso foi descobrir que para parar por completo a investigação da cura numa determinada cidade tinha de a atacar diversas vezes até a destruir por completo, para além de investir o meu dinheiro em upgrades de ataque e velocidade a zombies, para além, de aumentar a probabilidade de zombificar os humanos que morriam. A força continua a estar nos números.

Apesar destas pequenas falhas (em que o aborrecimento do ecrã pós-jogo é o maior de todos) não consigo deixar de achar Infectonator 3: Apocalypse como um dos mais surpreendentes indies que joguei no trimestre, e um dos mais recomendáveis para quem gosta de jogos de estratégia, mesmo com uma vertente quase casual. E ainda vão dar alguns risos não só com os zombies mas também com as manchetes que vos aparecem nos noticiários. São subtis, mas demonstram que para além de um divertido jogo ainda existe uma boa camada de humor. E demonstra uma possível pós-vida (trocadilho não intencional) aos jogos que abrilhantaram alguma experimentação a plataformas de jogos gratuitos como o Kongregate.