Caçada semanal #160

A Humanidade teima em chorar a perda do Colosso de Rhodes ou dos Jardins Suspensos da Babilónia, mas ninguém perde noites com suores frios causados pelas saudades do bigode do Manuel Luís Goucha. Aquilo é que era uma verdadeira Maravilha do Mundo Moderno, como uma espécie de tiara de ébano esculpida para embelezar o espaço entre o nariz e a boca do apresentador. A sua perda, dizem, ainda é causa de luto em muitos círculos de donas de casa por esse Portugal fora, e nas comunidades imigrantes.

Para além do frondoso bigode, o segundo marco que Goucha nos deu nos 1990s foi o lançamento do livro Coisas Doces sem Açúcar, o Santo Graal dos diabéticos que viram nele a salvação como que iluminados pelo Farol de Alexandria. Os 3 indies desta semana são assim também, doces, simpáticos, e sem açúcar, nem adoçantes digitais. É tudo natural.

The Adventure Pals

É curioso ver como é que as séries de animação contemporâneas (em especial Adventure Time e Rick & Morty) estão a influenciar de forma tão forte o mercado dos videojogos, especialmente os indie devs. The Adventure Pals, é sem surpresa, até porque o nome demonstra logo isso, uma tremenda inspiração na série de Jake e Finn, mas aqui, no lugar de um cão amarelo com capacidades de metamorfose, o rapaz com espada que protagoniza o jogo é acompanhado por uma girafa.

É claro que a girafa Sparkles não é a nossa única companhia neste action platformer, e também Mr. Rock, uma pedra, serve de arma de arremesso e de amigo. Com controlos simples, é extraordinária a forma como os diferentes mundos de The Adventure Pals representam toda a loucura criativa do estúdio Massive Monster, com os seus inimigos e bosses com designs e ideias tão estapafúrdias que encaixariam na perfeição no mundo de Adventure Time.

Com um conceito divertidamente absurdo, onde a nossa aventura começa no nosso aniversário e o nosso pai é raptado pelo vilão cujo objectivo é transformar pessoas mais velhas em cachorros-quentes. Não há nada para explicar aqui, apenas que The Adventure Pals é um soberbo platformer com uma magnífica direcção de arte, para além de um excelente level e game design. Para crianças, pais e para todos os fãs de Adventure Time, um dos indies mais recomendáveis da actualidade.

Venture Kid

O mundo é realmente pequeno. Quando a cópia de Venture Kids chegou eu já nem me lembrava de em 2014 (ou terá sido 2015?) de estar na área indie da Gamescom e de ver dois devs alemães a promoverem o seu jogo, que só era uma mais óbvia inspiração em Mega Man se tivesse essas mesmas palavras escritas. À época desafiaram-me a tentar passar o primeiro nível sem perder as vidas todas, e, sem imodéstias, com tantas vezes que já joguei os meus adorados Mega Man da NES que me senti automaticamente em casa, e consegui fazê-lo.

O estúdio FDG Games conseguiu mimetizar na perfeição a estética de Mega Man, e só tenho pena que assim como Shovel Knight não tenham querido ir mais longe com a sua inspiração.

É também engraçado de ver que tanto Venture Kid como Shovel Knight partem do mesmo pressuposto, e mesmo ao não criarem a “obrigação” de usarmos novas armas para derrotar os bosses, o caso do jogo da Yacht Club Games resultou num melhor exemplo de videojogo com identidade do que no caso do outro indie.

Ainda assim o level design e os controlos de Venture Kid são excelentes, e tornam o jogo verdadeiramente obrigatório para os fãs do clássico de Keiji Inafune. E é tão bom que sabemos que seria possível ir ainda mais longe e chegar onde Shovel Knight chegou por mérito próprio.

Tomb Towers

Falar de retro nos dias de hoje normalmente significa que estamos a falar de jogos que, em extremo, homenageiam o catálogo da NES, como Venture Kid. No caso de Tomb Towers falar em retro é pensar em algo menos massificado para a maioria dos jogadores: o MSX.

No meu caso foi o computador que herdei de um filho de uma amiga da minha tia, que trocou o seu Phillips MSX por outro mais potente, e, como a velha máxima indica: “o lixo de uns é o tesouro de outros”. Este foi o meu primeiro computador, e apesar de não ter tido acesso a muitas cassetes com jogos para ele, foi também lá que me defini enquanto jogador.

Tomb Towers vem reavivar essa memória, inspirando-se num jogo do meu ano de nascimento, o The Castle, um puzzle platformer clássico onde a precisão é a alma do negócio e a diferença entre estar vivo e estar morto, apelando à citação dessa grande filósofa que é Lili Caneças.

Ainda em Early Access, a abordagem revivalista de Tomb Towers é tão profunda que inclui inclusivamente o lag de salto típico de alguns jogos da época (e tão bem resolvido com o primeiro Super Mario Bros.). Tomb Towers é decididamente um jogo para a malta mais velha recordar os seus velhinhos MSX, mas com a sua abordagem de inocência retro é um óptimo puzzle platformer para mostrarmos aos nossos filhos como eram os jogos que jogávamos com a idade deles.