Shape of the World foi lançado há dias e é a prova de que a independência criativa é algo que deve ser defendido com todas as forças. A experiência que o estúdio Hollow Tree Games trouxe para o PC e para a PS4 é um dos momentos mais sublimes que pudemos viver com os videojogos no passado recente: um jogo de exploração na primeira pessoa que interliga a nossa presença às alterações de um mundo em constante mudança, por vezes pela nossa própria acção.

Mergulhar em Shape of the World é sentir um dos melhores usos ambientais da modelação low poly pintada com transições planas de paletas cromáticas uniformes. A cor assume uma preponderância extrema já que por cada portal que atravessamos todo o mundo se altera, e é nessa dança colorida que a nossa deambulação por estes cenários naturais toma outro corpo.

Enquanto objecto artístico há um balanceamento exímio entre a vertente exploratória e uma aura contemplativa. O mundo que vai reagindo dinamicamente à nossa presença com a sua geografia a ser proceduralmente gerada à nossa volta, e que nos faz sentir uma espécie de criadores de mundos. Ou destruidores se assim o quisermos.

À medida que percorremos os lagos e planícies orgânicos de Shape of the World vamos apanhando sementes que podemos “disparar” para o solo e de onde brotam quase imediatamente árvores. Não é apenas a nossa presença que altera o cenário, podemos ter um papel activo em cultivar a flora deste mundo, ou, se quisermos, destruí-la, tenha sido criada por nós ou não.

Esta metáfora é a minha leitura do par de horas que passei a viver a experiência de Shape of the World, em que a nossa existência no mundo altera sempre o que está à nossa forma, seja de forma passiva ou activa. Criar ou destruir são momentos ao alcance da nossa mão e que dependem unicamente da nossa vontade. O interessante de Shape of the World e de jogos similares é a abertura interpretativa que tem. Esta foi a minha leitura e o meu sentimento dentro da sua experiência, que apesar de curta é apaziguante.

Ocasionalmente existem micro-puzzles para que possamos chegar a outras zonas da geografia, mas isso é apenas uma nota de rodapé no todo que é Shapes of the World, que em momento algum deve ser considerado um jogo de puzzles.

Este é, sobretudo, um jogo de exploração na primeira pessoa visualmente brilhante e que tem uma composição musical no mesmo patamar. A forma como o jogo equilibra as composições e os silêncios é outro ponto que torna o nosso mergulho neste jogo em algo ainda mais único.

Shape of the World não é para todos os gostos e há quem o vá apelidar de walking simulator como comentário depreciativo. Mas é muito mais do que isso. É um momento de exploração artística dos seus criadores e uma jornada contemplativa que nós vivemos. E esquecendo esse momento, basta perceber o que foi conseguido visualmente para já ser um dos mais bonitos jogos indie alguma vez feitos.