Numa semana tão recheada de excelentes Tactical RPGs como a anterior, começamos esta com um dos mais surpreendentes e desafiantes jogos do género a ver a luz do dia. Há vários ingredientes que colocam Into the Breach não só como um dos melhores Tactical RPGs que já jogámos mas um grande potencial para ser um dos jogos do ano. A receita para o sucesso e a excelência em Into the Breach é simples de demonstrar.

Uma pitada de legado. Não são um estúdio experiente e profícuo, mas na bagagem contam com um dos melhores jogos indies da década, o maravilhoso FTL. Sabermos que tudo o que este pequeno estúdio norte-americano Subset Games faz é fruto de uma atenção minuciosa ao detalhe, com uma afinação e criatividade extremas. Antes de o começarmos a jogar já sabíamos de antemão que o resultado seria complexo, desafiante e fruto de um grande minimalismo.

Um quarto de colher de chá de minimalismo. Com exemplos brilhantes dentro do género como XCOM, BattleTech e Fire Emblem, quem diria que a mudança de paradigma do género chegaria num pequeno tabuleiro de xadrez de 8 por 8 quadrados? É exactamente nesse espaço confinado que algumas das mais difíceis decisões tácticas são tomadas, com o pessoal do estúdio Subset Games a relembrarem-nos porque é que menos é tantas vezes mais.

Dez quilos de boas ideias. Into the Breach é a interpretação de elementos que me são queridos e que fazem parte do nosso imaginário colectivo. A tradição histórico do cinema Kaiju, com monstros gigantes a assolarem cidades é o mote para este Into the Breach, que decide rebater essas ameaças atirando mechas para a refrega. para quem tem sangue tokusatsu a correr-lhe nas veias é delicioso ver a ideia de escala coloca aqui em prática, com o pequeno tabuleiro de xadrez a relembrar-nos os cenários por onde actores vestidos de monstros e mechas combatem nos sets de filmagem de séries e filmes tokusatsu.

A nossa party em todas as missões é composta apenas por três mechas à nossa escolha, pilotados por personagens que vamos desbloqueando, cada um com as suas habilidades únicas. A primeira franja de desafio passa logo pelas escolhas que fazemos, já que o tipo de inimigos que defrontamos é aleatório. Saber que mechas e que pilotos levar é uma grande dose da imensa dificuldade que este jogo tem, e o mínimo de direccionamento que temos passa por sabermos quais os objectivos de cada missão.

Se os nosso pilotos morrerem perdemo-los para sempre, e estes são substituídos por personagens controlados pela AI e que não sobem de nível nem ganham experiência. A eventual necessidade de sacrificar um mecha e/ou piloto é algo que pesa muito para além da missão em que estamos. Sobretudo porque existe um desequilíbrio da importância cabal dos prédios civis que existem no tabuleiro versus a nossa própria party, e é a sobrevivência desses mesmos prédios é que nos pode levar a um game over.

Uma tonelada de dilemas tácticos. Do ponto de vista táctico é interessante que os primeiros a declararem as suas acções sejam os insectos gigantes que querem destruir a Terra, e que transformam este tactical RPG numa espécie de puzzle por turnos. Funcionamos quase sempre em contra-ciclo, a tentar “apagar” os muitos fogos, tentando evitar as consequências das acções dos nossos inimigos quando o turno se desenrolar. Como todos os intervenientes têm uma ordem especifica para cumprirem o seu turno, muito do desafio de Into the Breach passa por criar a sequência do turno e tentar resolver todos os os riscos que estes possam trazer. 

Se quase sempre estamos em minoria em relação aos nossos inimigos, com o número limitado de possibilidades (cada mecha apenas pode mover-se e atacar num turno) temos de escolher como impedimos um dado inimigo de destruir um prédio. Em Into the Breach não há aleatoriedade nas acções, e sabemos sempre quanto dano vamos dar ou receber. Os ataques dos monstros aos prédios são o único momento que tem um pequeno laivo aleatório: em que os ataques ou acertam ou não. Haverão situações em que não saberemos se desferimos o coup de grace a um monstro ou se bloqueamos um ataque a um prédio ou mesmo se impedimos o spawning de novos inimigos. Temos poucas acções para tudo o que vai acontecendo no jogo e é fácil percebermos que será quase impossível completar determinada missão.

A genialidade de Into the Breach reside precisamente nisso: de levarmos a um ponto extremo a ideia de que cada turno conta, e que tem muito peso no nosso sucesso. Este é um xadrez em que estamos sempre em desvantagem e onde temos de conseguir fazer uma laranjada a partir de caroços de laranja. É impressionante o quão desafiante, imersivo e criativo consegue ser um jogo nesta escala, onde a sua brilhante pixel art é apenas o laçarote que apruma um dos videojogos mais coesos e sólidos que jogámos este ano. E que consegue, dentro da sua escala compacta, ser tão ou mais complexo do que os mais ambiciosos tactical RPGs.

Into the Breach encerra assim com chave de ouro uma sequência de artigos dedicados a óptimos tactical RPGs. E terminá-lo com um dos nossos jogos do ano é certamente a maneira certa fechar um excelente período em termos de lançamentos de um género que parecia refém da existência de XCOM.