Estávamos em 1995 quando a defunta e saudosa Psygnosis agitava o campo dos jogos de corridas com um título muito diferente do que por cá andava. Sega Rally e Daytona USA faziam as maravilhas de muitos jogadores com abordagens às respectivas modalidades e eis que levam uma valente placagem de um título que tinha apenas algo em mente: destruição de carros. Depois de algumas viagens mais extremas com Twisted Metal e semelhanças recentes com FlatOut, o sucesso de Destruction Derby acabaria por desvanecer e desaparecer por completo.

Quase por ironia seria mesmo o estúdio Bugbear Entertainment (criadores da série FlatOut) a remexer no género com a mão da THQ Nordic. Wreckfest, que esteve vários anos em Early Access e que foi alvo de várias críticas dos early adopters, mas que neste momento de full release soube redimir-se condignamente, é o resultado de anos de trabalho do estúdio finlandês.

É curioso que ainda a semana passada falávamos de The Crew 2 e da sua fraca tradução de colisões e de amolgadelas nos veículos e destruição do cenário. Sendo verdade que esse não é o foco do título da Ubisoft, por outro lado seria de esperar um pouco mais de primor, especialmente porque o seu mercado tem muitos e melhores concorrentes a respirar-lhe no pescoço.

Wreckfest é um jogo de destruction derby apesar de não ser um Destruction Derby. É um jogo onde a inexistência de licenças é perfeitamente secundária se tivermos em consideração que o seu foco não é esse. Ninguém mergulha num jogo destes com a sede de andar a espetar o mais recente Ferrari contra outros carros em estradas de terra. O que queremos são chaços artilhados, muitos deles de puro metal e com trinta e mais anos, a exalarem americanidade por cada ponto de ferrugem e a gemerem quando embatem contra outro carro na pista.

A atenção ao detalhe e ao estado de destruição do nosso carro e dos seus componentes é verdadeiramente magnífico neste Wreckfest. O interface mostra-nos a informação da “saúde” do nosso veículo, tanto em termos numéricos como por indicação de branco a vermelho dos estragos em cada zona do carro. A minúcia do seu desenvolvimento passa por compreendermos como funcionam as vulnerabilidades e fragilidades das colisões de carros. Embater de frente contra a traseira de outro carro pode parecer que prejudica mais o adversário mas na realidade está a prejudicar-nos mais a nós. Estamos a utilizar uma zona que contém uma peça tão importante do nosso veículo como aríete contra o porta-bagagens de um carro, que em caso de destruição não o impede de andar.

É esta inteligência de embate e defesa que passa nas viagens a alta velocidade de Wreckfest. Pensar na eficácia de como chegar o primeiro, sofrer o mínimo de dano no nosso carro e danificar ao máximo os dos outros. E ainda que esta não seja uma prioridade em muitos modos, um carro danificado é menos um competidor pelo pódio.

Na campanha single player (que tem imensas provas diferentes em diversos escalões) houve situações que gostei de ver implementadas. A primeira é que a AI do jogo parece ser sólida o suficiente para que mesmo nos escalões mais baixos as corridas representem algum desafio, e que o “combate” entre veículos seja feito de forma inteligente, e não como veríamos figurantes a comportar-se num filme de Hollywood. A outra é que por vezes ao colidirmos com um carro criamos uma rivalidade durante essa prova, e sempre que causarmos dano a esse veículo recebemos pontos bónus no final da corrida.

Mediante a nossa prestação nas diversas provas vamos recebendo loot e dinheiro para podermos ir fazendo upgrades ao nosso veículo, que vão desde questões estéticas até às de defesa, como o reforço do habitáculo e da carroçaria. Os modos não são muito diferentes entre si, mas Wreckfest tem conteúdo suficiente nos modos online e offline para ser uma boa aposta, apesar das óbvias limitações de diversidade de um jogo de corridas tão específico quanto este.

A diferença de mindset para Wreckfest quando passamos muito tempo noutros jogos “clássicos” de corrida é grande. Onde andamos habitualmente a evitar colisões, aqui andamos quase sempre a procurá-las a tentar despistar os nossos adversários ou atirá-los contra partes do cenário para os imobilizar.

O grande senão deste título acaba por ser o seu preço que é ligeiramente proibitivo. Ainda assim, Wreckfest é um óptimo jogo do género, e possivelmente o melhor do seu género em muitos anos. O que significa que a BugBear conseguiu (felizmente) superar a sua série anterior, criando aqui o Destruction Derby que todos queríamos que existisse.