Os RPGs de mesa permitem-nos viver as nossas fantasias de heroísmo épico, onde, com o tempo, damos por nós a proteger um mundo fantástico de toda uma série de ameaças e nos sentimos, tanto na obrigação como no dever, de nos certificarmos de que o bem prevalecerá, custe o que custar. Contudo, da mesma maneira que o manto do herói é aquele que iremos usar, também podemos vestir o manto do vilão.

Uma aventura banhada pelo lado negro do espectro da moralidade pode ser uma experiência tão ou mais divertida e enriquecedora do que uma no lado oposto, nem que seja pelo facto de não termos limitações quanto ao alcance das nossas acções (preocuparmo-nos com a vida de inocentes, por exemplo). Nada contra, até porque este tipo de jogos são um excelente escape e todos temos aqueles dias em que incinerar uma aldeia e deixar-nos cobrir pelos gritos de horror, pânico e dor dos seus habitantes é precisamente aquilo que nos faz falta.

É claro que não precisamos de ser aquele vilão que faz o que faz só porque sim (embora funcione). Podemos ter um pouco mais de complexidade, como por exemplo não nos vermos como um vilão, mas sim como alguém que está disposto a fazer o que é necessário quando os restantes dão um passo à rectaguarda. Um meio para atingir um fim. Um mal necessário para o bem maior.

Agora, este tipo de aventuras podem (e certamente irão) abordar temáticas sensíveis, no sentido em que podem não agradar a todos. Desde a violência física excessiva, à agressão psicológica, passando por toda uma série de detalhes que são implementados de forma a descrever a atrocidade das acções que são praticadas, tudo despoleta um cenário que poderá eventualmente ferir susceptibilidades.

Cabe ao Mestre de Jogo saber o que é que os jogadores pretendem retirar desta experiência e até onde cada um, ele incluído, estão dispostos a ir. Para uns, cenários de abusos sexuais e/ou de violência doméstica podem ser banais, enquanto que para outros são tópicos que devem ser evitados. Neste tipo de aventuras, mais do que nunca, é importante aquela sessão 0 para se conversar e deixar em cima da mesa as expectativas que se pretendem alcançar e como, de forma a garantir que todo o grupo está na mesma página e que não se criam momentos constrangedores.

O lado negro é fascinante e tentador, e não há mal algum em procurá-lo. A ficção está lá para nós nos nossos melhores e piores momentos, e, como tal, devemos saber usá-la o melhor possível, independentemente daquilo que nos traz até ela.