Numa recente arrumação, ou como cá em casa lhe chamam “desarrumação para arrumar” eu encontrei um jogo há muito tempo esquecido por mim (e provavelmente por toda a gente), porque acho que ninguém se lembra ou tê-lo-á jogado.
Admito que o que encontrei é um disco original, mas uma cópia pirata num disco duma marca também esquecida num entroncamento sem fim de marcas usadas naquele tempo, em cópias de jogos PC, numa era que a internet começava a dar os seus primeiros passos e a única forma de conhecer algo novo era olhar para um catálogo de jogos, apontar o que ficava mais barato mesmo que não fosse o mais popular ou o mais recente.
Ironicamente esse mesmo jogo pirateado que ninguém ouviu falar contribuiu para o meu gosto pelo género, e inclusive para descobrir muita literatura baseada na mesma temática e até o autor.
O jogo chama-se Chronomaster, e não era propriamente uma novelty no género, mas sim estava incluído numa enxurrada de títulos que começaram a surgir num período em que os PCs multimédia eram a tal cena nova, quando o som começou a ser priorizado, quando o full motion video começou a ser necessário e desejado.
O título pode não vos dizer nada, se calhar o autor que se baseia a historia pode fazer alguma luz, ou não. Roger Zelazny diz-vos alguma coisa? Bem se calhar não. Zelazny foi poeta e escritor de romances de fantasia e ficção cientifica. Assim resumidamente contribuiu e influenciou o género, e tenho encontrado muitos paralelos e se calhar influências dele em diversos media, inclusive no cinema.
Uma das particularidades dos romances de Zelanzny é o aproveitamento de mitos de culturas antigas, em especial culturas orientais e antiguidade clássica. O que sempre me cativou interesse e em especial o uso do esotérico e fantasioso misturado com cientifico ficcional! O jogo custou-me 250 escudos na altura e era um dos jogo mais barato naquele catálogo de jogos piratas, mas como vim a descobrir veio-me a custar mais caro, especialmente aos meus Pais, claro. Primeiro um leitor de CD-Rom, depois uma placa de som (na altura uma Sound Blaster 16). Valeu cada tostão gasto e valeu-me uma aventura interactiva que nunca mais esqueci, muito embora tivesse precisado dum “empurrãozinho” do acaso para me relembrar desta aventura gráfica.
A primeira peripécia foi tentar argumentar com a minha Mãe que precisava dum leitor de CD-Roms para jogar o jogo, depois com o meu pai que precisava duma placa de som para jogar aquil. Vá não durou muito, o CD-Rom coincidiu com o meu aniversário e a Placa de som, a 2ª peça mais importante para conseguir jogar aquilo veio umas semanas depois e metade paga pela minha mesada.
A segunda peripécia nesta aventura foi saber jogar aquilo, o que sabia de inglês resumia-se a “how are you?” ou “what time is it?”. Segunda peripécia e meia: “Senhora professora de inglês, que quer dizer isto?” perguntei. “De onde estás a tirar esse texto, Andrézinho?”. “Dum jogo de computador senhora professora…”. Bem não levei um puxão de orelhas porque estava na 6ª classe mas foi uma vergonha que ali passei.
Terceira peripécia: arranjar um dicionário que não seja de inglês básico, e então fui requisitar um dicionário à biblioteca… bem tive que o requisitar várias vezes.
Quarta peripécia: Jogar com tradução literal, um jogo com textos e enigmas em inglês não propriamente para um aluno do 6º ano que era terrivelmente mau a inglês que veio do 5º ano com um redondo DOIS.
Quinta peripécia: Conseguir um amigo que me ajudasse a traduzir os diálogos em vez de ir para casa jogar Mega-Drive. Sim o resultado é que fui o “maluquinho” daquele ano na turma.
Mas não desisti e consegui inclusive a meio do jogo até se dar o game over, porque a minha má escolha de respostas levou-me a um dead-ending.
E ficou assim durante anos até o ter terminado já eu andava no 12º Ano.
O que me levou a dedicar-me tanto a este jogo nem foi todo o mistério que o jogo tinha, mas acima de tudo um belo ambiente sonoro: tudo encaixava bem naqueles gráficos pré-renderizados.
Depois do primeiro mistério resolvido que envolvia fazer com que uma estátua se mexesse do sitio, foi para mim um enigma que andei durante fins de semana a tentar resolver.
Ou perder-me numa floresta a tentar descobri qual tinha que ser o fruto que tinha de comer para poder visualizar a entrada secreta dum palácio. Ou morrer porque bebi água dum oásis no meio do deserto, porque usei o utensílio errado para retirar a água. As horas e horas que andei ali a vaguear por uma miragem do dito palácio.
Querem pegar nesta aventura? Podem fazê-lo à vontade que o jogo está no estado de abandonware, prometo que será uma viagem maravilhosa sem que necessitem de consumir “cristais azulados”. Também sugiro a quem está numa aventura em descobrir literatura exótica, pegar pelo menos no Lord of Light e depois seguir para toda a serie das Cronicas de Ambar (The Chronicles of Amber).
Comments (1)
Muita carolice, mas explica o fascínio que os primeiros jogos conseguiam despertar. Nada foi conseguido de bandeja, desde o hardware ao entendimento do próprio jogo em si como a mecânica foi tudo feito com muito trabalho e esforço próprio! Antigamente era uma sorte haver outro jogador (o walkthrough online de hoje em dia) a quem se podia perguntar como era a progressão. As coisas têm outra aura quando uma pessoa se esforça por as conquistar. Excelente artigo, revi-me nele!