Caçada Semanal #181

Quando se dedica muito tempo da semana a mergulhar em jogos indie a probabilidade de encontrarmos jogos estranhos torna-se sobejamente maior. E não estou a falar de “estranheza” como em Kung Fury, que utiliza uma quantidade enorme de referências dos 1980s para criar uma obra memorável, mas perceptível. Estou a falar de ideias tão bizarras que muitas vezes roçam a genialidade, surpreendem e trazem-nos momentos tão inéditos que achamos que estes jogos não lembram, como diz o outro, nem ao menino Jesus.

Os 3 indies desta Caçada são desses exemplos. Se conhecerem outras hipóteses avisem-nos, que gostamos sempre de ficar embasbacados.

Russian Subway Dogs

Os videojogos podem ser didáticos. É com esta lapalissada que aproveitamos para vos perguntar se sabiam que alguns investigadores descobriram há poucos anos que os cães abandonados de Moscovo conseguem movimentar-se pela rede do metropolitano da cidade? E não falamos apenas de entrar e sair de carruagens. Falamos de à noite apanharem comboios para o subúrbio para dormirem, e de dia irem para o centro da cidade à procura de comida. Surpreendente, não é?

Russian Subway Dogs, do estúdio Spooky Squid Games, criadores de They Bleed Pixels, fala exactamente disto, ou não fosse o título quase literal já ser óbvio o suficiente. Neste jogo arcade controlamos cães abandonados nas placas do metro moscovita com um objectivo apenas: encontrar comida e bebida. Para isso vamos ter de sorrateiramente nos esgueirarmos atrás dos utentes do metro e assustá-los de forma a que estes derrubem o que estão a comer e beber.

Os diversos níveis são bastante desafiantes, especialmente quando adicionamos os objectivos bónus do Proletaricat, o gajo bolchevique que nos vai pedindo combos cada vez maiores ou outras missões igualmente difíceis.

Este Russian Subway Dogs é possivelmente uma das ideias mais originais do ano.

Evil Labs

Todos temos aquele amigo que alinha em tudo o que são teoria conspiracionistas e vive convicto que elas são mesmo verdade, por muito pouco plausíveis que soem. Espalham no Facebook “estudos” a comprovar a toxicidade das vacinas, artigos de “investigação” a vasculhar os famosos chem-trails, ou “provas” de que a indústria farmacêutica inventa doenças para depois fazer biliões com as vendas da cura. É para esses amigos que existe Evil Labs.

Este não é de todo um jogo de gestão/management comum. Se Project Highrise e Smooth Operator foram os dois jogos do género aos quais mais horas dediquei nesta década, é possível que ainda assim não me tenham preparado para aquilo que iria encontrar neste jogo.

O ecrã de Evil Labs é dividido em duas partes: a superfície, onde temos as nossas farmácias abertas, e o subterrâneo onde construímos grande parte da infraestrutura de laboratórios onde iremos não só investigar doenças como produzir as curas para vender aos incautos cidadãos da nossa cidade.

O nível de complexidade e detalhe de elementos de tycoon deste Evil Labs é verdadeiramente surpreendente, o que associado ao conceito verdadeiramente original faz dele um jogo obrigatório para fãs do género.

https://www.youtube.com/watch?v=EOGQecjccCc

TRAGO

“Afogar as mágoas no fundo de um copo” é um dos maiores lugares comum de uma série de obras culturais mas que têm um grande reflexo de realidade nele. Em TRAGO, do estúdio brasileiro SpaceGiraff3, vemos a tradução videolúdica e narrativa desse lugar-comum num jogo point and click que tenta passar-nos a ideia dos momentos passados por alguém que está a viver uma situação similar.

A história desenrola-se praticamente toda num bar brasileiro onde Juca vai beber para esquecer o fim do namoro com Jessica. Se isto parece a descrição de uma cena de uma novela da Globo, desenganem-se, porque a volta narrativa para onde TRAGO nos leva é completamente inesperada.

As interacções que temos com as outras pessoas no bar, clientes e funcionários, vão ramificando o direccionamento do jogo, e é nesta subtil forma de “investigação” que vamos descobrindo os segredos que se escondem por trás do bar e de quem lá trabalha. O que começa com uma saída para beber até cair transforma-se lentamente numa história de mistério.

Apesar de circunscrito ao mesmo espaço com interacções relativamente reduzidas de objectos e pessoas, é interessante a forma como este acessível point and click (3,99€ sem desconto) consegue ser uma brilhante forma de contar uma história onde as nossas decisões importam para o decorrer do enredo, e onde o visual com uma identidade estética forte nos disfarçam a simplicidade subjacente do próprio jogo.