Gosto de shooters. Um bom shooter, ou um bom FPS, como preferirem, é coisa que vou procurando, quanto mais não seja para me ir mantendo a par do estado da arte. Eu, que passei pelos Doom, Wolfenstein, Heretic e Descent desta vida, mantive-me e mantenho-me de olho aberto para os Call of Duty, os Battlefield, os Counter-Strike, pelo que quando um surge gosto de dar uma espreitadela.

Tinha jogado Insurgency de raspão. Interessante, mas, na altura que lhe peguei, sentia-se em demasia o peso da idade. O conceito agradava-me, mas as animações e movimentos meio artificiais ou desfasadas da realidade, aliadas ao facto de se tratar de um jogo exclusivamente em Multiplayer onde eu não tinha uma base de amigos com quem jogar, acabou por me afastar ao fim de pouco tempo.

Assim, foi com surpresa que vi o aparato com que Insurgency: Sandstorm apareceu na Gamescom este ano. O stand tinha o aspecto de uma das grandes produções do ano mas, confesso, pouco fez para me apagar a relativa apatia com que eu via o título. Até que um amigo de um amigo, que trabalha na New World Interactive me fez chegar uma cópia. E, senhores, recomenda-se!

Insurgency: Sandstorm pega nos recentes conflitos do Médio Oriente e trá-los para o mundo dos videojogos. Não há cá “terroristas”. Há insurgentes e forças de segurança. Os campos de batalha são pequenas aldeias no meio dos montes ou vilas e cidades repletas de casas. No fundo, aquilo que estou a começar a tentar explicar é o processo lógico de validação-eliminação de determinados interruptores que constituem os padrões de muito daquilo que nos rodeia. Que sirva para, pelo menos, passar um quadro geral de Insurgency: Sandstorm antes de passarmos para o específico e o que faz deste jogo algo diferente.

 

Tempo

Passado [ ]

Presente [X]

Futuro [ ]

Outro [ ]

 

Inimigo

Demónios [ ]

O Diabo! [ ]

Humanos [X]

Monstros [ ]

Robots [ ]

Outro [ ]

 

Se respondeu “Humanos” na questão anterior, tipifique:

Piratas [ ]

Um maluco qualquer e a sua seita [ ]

Nazis [ ]

Vietcongues [ ]

Terroristas [ ]

Japoneses [ ]

Tipos normais [X]

Infectados [ ]

 

Tipo de personagem

Somos uma espécie de super-humano [ ]

Somos apenas mais um [X]

Somos mais resistente ao dano que os demais [ ]

Somos um herói [ ]

Se apanharmos determinado powerup, somos os maiores da nossa rua [ ]

Temos uma armadura que nos permite voar invisíveis e essas coisas [ ]

 

Temática

Primeira Guerra Mundial [ ]

Segunda Guerra Mundial [ ]

Vietname [ ]

Iraque/Afeganistão [X]

Alternative history [ ]

Ficção [ ]

 

Armas

Sci-Fi [ ]

WW I [ ]

WW II [ ]

Presente [X]

Futuristas [ ]

Fazem tudo sozinhas [ ]

 

Mapas

Deserto [ ]

Floresta [ ]

Urbano [X]

Suburbano [X]

Planeta distante [ ]

 

Dano

Qual dano? [ ]

Esconde dois segundos que isso passa [ ]

1 ou 2 tiros e ficamos a ver batatas pela raiz [X]

Counter-Strike-like (com 6 tiros de pistola no bucho ainda conseguimos dançar o Vira do Minho) [ ]

Apanha um medkit que isso passa [ ]

Chama um médico que ele cura-te [ ]

 

Ajuda alguma coisa? Espero que ajude, pelo menos, a categorizar o jogo. Não há extraterrestres ou monstros, por isso não é nenhum Dead Space, Doom ou Half-Life. Não se faz uma visita a tempos de WWI ou WW2, e com isso afastamo-nos de mais de metade dos FPS. O que temos em Insurgency: Sandstorm é, sobretudo, um simulador de combate. Arrisco dizer que, sem entrar em especificidades, é o mais próximo da realidade sem entrar nos detalhes de Arma 3. Um combate a simular o real mas num setting de Counter-Strike, sem todas as mecânicas secundárias inerentes a esse jogo, como a economia e afins. Há um sistema de classes de personagem, mas nada de tão simplista como aquilo que Battlefield nos proporciona. A coisa não se resume a 4 classes e as mesmas não são tão unidimensionais como nos jogos da Electronic Arts. O número de classes disponíveis varia em função do tipo de jogo que pretendemos disputar. Comecemos pelo primeiro modo, o jogo cooperativo.


Neste modo de jogo, a nossa equipa de humanos joga contra inteligência artificial, atacando ou defendendo. Não há um limite explícito ou perceptível para o número de inteligência artificial em jogo e facilmente nos deparamos com algumas características bem vincadas: A AI tem imensa facilidade em encontrar-nos e tem a mesma pontaria que um Stormtrooper zarolho. Mas desenganem-se se isto quer dizer que o modo de jogo é fácil. Eles podem não ser o dedo mais rápido no gatilho e podem mandar 3 ou 4 tiros a matar o gato da vizinha, mas basta-lhes um para nos enviar para a spawn wave seguinte, sem passar pela casa de partida e sem receber 2.000$ (o meu Monopoly ainda é dos antigos). Os humanos dispõem de várias classes, a maioria delas com limites em função do número de jogadores. Vou começar por duas que quase contam como uma só: Commander e Observer. É, sem dúvida, a interacção que mais gozo me está a dar explorar neste jogo. O Commander tem a autoridade para pedir apoio aéreo ou de artilharia, variáveis consoante a facção que assumimos (as forças de segurança têm acesso ao poder aéreo norte-americano, os insurgentes têm acesso a determinadas ajudas, meio improvisadas, mas com semelhante poder destrutivo). Para o fazer, precisa de identificar o alvo com os binóculos, altura em que se encontra vulnerável, e de ter alguém a comunicar via rádio as suas intenções. E é aqui que entra em cena o Observer. Este carrega um rádio para transmitir as ordens do Commander e assume a responsabilidade de o vigiar enquanto este procura o melhor alvo. O sistema funciona bem e dá origem a interessantes situações de parceria e cumplicidade quando devidamente explorado. Individualmente são apenas mais um, mas em conjunto, podem ser a diferença entre ganhar ou perder uma ronda e são estes quem define o ritmo do avanço e dos recuos no terreno.

Tendo começado pelo que mais se destaca, as restantes classes não trazem nada de particularmente novo. Marksman será a escolha para quem gostar de espingardas de longo alcance. Gunner para quem gostar de transportar armamento pesado e prestar apoio de cobertura e supressão. Demolitions trata de material explosivo e da eliminação de veículos inimigos. Breacher procura um combate mais a curta distância, de maior mobilidade e de limpeza de salas. Advisor é um tempero extra aqui ministrado, permitindo a escolha e personalização de armas exóticas ou menos comuns, adaptando-se às necessidades do momento da sua equipa e Riflemen é o grosso do exército, com um conjunto de armas capazes de prestar apoio em diversas situações, fazendo valer a sua versatilidade.

Não há médicos, antecipando a pergunta dos fãs de Battlefield. Não há nem fazem falta. Com a cabeça arrancada por um tiro de Calibre .50, não é uma injecção que nos faz ficar bons e prontos para combate. E medkits para nos curar uma unha encravada não fariam sentido neste jogo – e ainda bem! As classes são, ainda assim, bastante versáteis e customizáveis. Para cada uma delas podemos escolher uma de entre várias armas principais, vários acessórios para a arma, pistola, granadas, miras, coletes à prova de bala, etc… com um senão: tudo isso sobrecarrega a nossa personagem. O peso é, então, algo a ter em conta quando construímos a nossa personagem. Além de um peso máximo a carregar, a certeza de que quanto mais lentos formos, menos eficientes seremos a chegar à frente de batalha e mais fácil será enquadrar-nos com as miras dos inimigos e aguardar nova respawn wave. Por outro lado, o jogo continua a distanciar-se de Battlefield no que a armas caídas diz respeito. Aqui uma arma caída é apenas uma arma caída e não todo um kit que nos permite mudar de classe. E, dependendo do loadout escolhido, é bem provável terem que andar a calcorrear terreno em busca de armas ou munição. Fica o aviso!

O modo Versus permite-nos o mesmo tipo de missões mas contra humanos. Estes podem demorar mais a encontrar-nos, se estivermos bem escondidos. Porém, a maioria deles são bem mais inclementes quando um alvo surge nas suas miras. Há 3 tipos de jogo diferentes neste modo Versus. Push, Firefight e Skirmish. Tudo joga em torno da captura/defesa de objectivos, mas as diferenças são suficientes para injectar um interesse e motivação extra de jogo para jogo. As respawn waves são limitadas em todos os modos e a captura de objectivos tem influência directa no número e periodicidade das mesmas. Os pormenores neste campo tornam o jogo fresco e desafiante. Obrigam-nos a valorizar a vida. Nada de saltitar aos tirinhos como se de um Call of Duty se tratasse, mas também sem aguardar 2 minutos para voltar a jogar, como em determinadas rondas de Counter-Strike. E, não raras vezes, quando perante a última onda de reforços, é que uma equipa se esforça por se organizar e fazer valer cada arma para conquistar o ponto que lhes permita avançar e ter acesso a novas vagas de respawns.

Resta o modo competitivo, com menos classes disponíveis, também – tanto quanto vi até agora – com menos jogadores por equipa, forçando a uma abordagem mais metódica para equipas de 5 elementos. Interessante, mas nada fora do normal, a meu ver.

Onde o jogo se destaca mesmo é em todo o gameplay associado. Já pintei a aguarela da visão geral. Permitam-me entrar nos detalhes que, a meu ver, tornam este Insurgency: Sandstorm um jogo muito recomendável para os amantes de simuladores militares.

O combate é cru. A fazer lembrar os modos hardcore em Call of Duty ou Battlefield. Mas, creio, mais complicado ainda. O HUD é ultra-minimalista. A única coisa de que dispomos é de um conjunto de indicações a mostrar-nos se determinados indivíduos nas nossas imediações pertencem à nossa equipa. Isso e a indicação de direcção e distância para o outro elemento da nossa dupla Commander-Observer, se for esse o caso. Nada de cores fortes, nada de highlights brilhantes. Mas também, nada de minimap, nada de indicador de balas no carregador, nada de crosshair, nada de hit indicators e, sobretudo, nada de kill feed. O jogo assume querer ser um simulador militar de combate e faz por isso. Não há forma de saber se aquele para quem disparamos foi de facto atingido. E, se caiu para fora do nosso campo de visão, não sabemos se se atirou para o chão ou se está, de facto, a aguardar novo respawn. Isto força as equipas a comunicarem entre si e, talvez por isso, talvez pelo factor preço e complexidade afastarem – até ver – o público mais juvenil, as interacções que tenho tido no jogo são francamente agradáveis e construtivas. A comunicação curta, pertinente, inclusivamente a imposta por alguns militares e ex-militares que tenho visto a jogar o jogo, obriga a ser objectiva e completa. Não há um “se não tens nada de jeito para dizer, não digas”, mas há uma pressão silenciosa para que assim seja. E, num jogo deste género, isto agrada-me. Não tenho interesse nenhum em disputar uma guerra. Mas agrada-me jogar e simular a presença no campo de batalha.

Estamos longe de ser invencíveis. Temos um quase inútil indicador de direcção do dano e basta. Digo quase inútil porque, 90% das vezes, quando o vemos já é tarde demais. No fundo, é algo que sempre busquei em jogos como Call of Duty ou Battlefield. Um modo de jogo semelhante à realidade. Ambos os jogos têm um modo hardcore disponível. Mas, tanto num como noutro, é difícil encontrar amiúde gente com quem jogar esses modos. O apelo da crosshair virtual, a facilidade do minimapa, o facto de ser mais difícil morrer continua a ser mais forte para a esmagadora maioria dos jogadores. Não os condeno. Mas farto-me de jogar dessa forma. De que faz sentido escondermo-nos ou flanquear um inimigo se qualquer coisa revela a nossa posição num minimapa virtual? E, se um sniper inimigo investiu tempo a procurar um ponto numa recôndita torre de igreja, faz sentido revelá-lo com uma killcam, para que este seja o alvo preferencial de quem matou, escassos 15 segundos depois?

Insurgency: Sandstorm dá um murro na mesa de revolta e decide-se pelo jogo que quer ser, ao invés daquilo que alguns jogadores queriam que fosse – há muitos que gostam do jogo assim e o apoiam desde há meses. O esforço é colectivo. Não têm como saber de onde veio o tiro do sniper que vos abateu? Peçam fumo. Aguardem por ele. Avancem a coberto do mesmo. É uma forma de impor o jogo em equipa. Pode ser frustrante quando, ao fim de escassos minutos, vemos que a equipa tem menos organização que um galinheiro na altura da distribuição do milho. Por outro lado, quando vemos uma equipa a tentar comunicar, a agir de forma concertada e articulada, o jogo ganha toda uma dimensão extra daquilo que nos pode oferecer. E é aqui, com um conjunto de amigos ou anónimos a agir em sintonia que Insurgency: Sandstorm atinge a excelência!

Há mais pontos de destaque no jogo. O grafismo, o desenho do som, as fantásticas vilas entre as montanhas e o rio… o trabalho em termos de mapas está soberbo e há apenas uma coisa que lhe posso, verdadeiramente, apontar. Um ponto apenas em que, face a outros jogos semelhantes, Insurgency: Sandstorm não cumpre da mesma forma. Adicione-se esse ponto ao jogo e estamos perante um jogo simplesmente obrigatório. Falo dos edifícios. Aquilo que se logra atingir em Battlefield, com a destruição de casas e edifícios com artilharia ou explosivos, é o ingrediente que falta para uma verdadeira suspensão de descrença neste Insurgency: Sandstorm. Permitam-me fazer uma casa desabar com toda a gente lá dentro depois de lhe espetar com dois RPGs no telhado. Façam isso e terão um fã indefectível para tempos vindouros. Mais mapas, mais vilas, mais terrenos podem ser interessantes, e uma adição a considerar, mas sem aquele factor demolição, faltará sempre qualquer coisa, por pequena que seja.