Falaram-me de Ring of Elysium. Torci o nariz. Mais um Battle Royale? Convidaram-me para jogar com eles. Refilei. Chatearam-me. Resmunguei escrupulosamente de 55 em 55 segundos. Esperaram. Comentaram enquanto eu criei conta. Bufei de impaciência. Entrámos, joguei, gostei. E aqui fica o resumo das razões pelas quais não devemos emprenhar pelos ouvidos, alinhar em preconceitos ou virar as costas a um jogo só porque o seu género está saturado.

2018 teve muitos jogos. E muitos bons jogos. De acordo com o SteamSpy, a lista aponta para 9046 só no Steam. Estimo que aproximadamente 9000 sejam Battle Royales. Ou perto disso, que não quero falhar por muito. Vai daí que quando me falaram de um novo, “parecido com o PUBG”, fiz aquela cara que se faz…

Oh não, outra vez arroz

Honra seja feito ao autor do convite, Ring of Elysium é, de facto, muito, muito parecido com PLAYERUNKNOWN’S BATTLEGROUNDS, de que falei aqui em Abril. Não sendo o primeiro dos primeiros nos Battle Royale, PUBG é, sem sombra de dúvida, o maior responsável desta recente febre, convertida em epidemia, que se espraiou por todos os cantos do mundo dos videojogos. Ou seja, é um Battle Royale sem entrar nas incongruências de Fortnite em que anda malta montada em rockets a disparar contra inimigos que constroem edifícios em menos tempo do que demora a comer um pastel de nata. Aqui a coisa procura manter-se fiel ao plausível e à realidade, sendo que há uma procura evidente por melhorar determinados aspectos existentes em PUBG. E será talvez essa a melhor forma de explicar Ring of Elysium. O jogo parece ter nascido de uma reunião em que se escrutinaram os pontos menos positivos do jogo de Brenden Greene e onde se fez um verdadeiro Brainstorming para procurar encontrar soluções mais eficazes ou airosas.

Incomoda-vos a aleatoriedade do voo do avião? Marquem no mapa onde querem iniciar a batalha.

Irrita-vos o caso de procurarem um local sossegado e darem de caras com 35 capangas à procura da mesma zona? Pois vejam, no mapa, onde se posicionam os vossos adversários.

É frustrante escrutinar casas em série e só encontrar calças e botas um tamanho acima? Decidam desde logo com que arma desejam começar!

É secante fazer a procissão a pé até à próxima zona segura? Usufruam de um sistema de transportes incluído com o jogador, à escolha do freguês! Há três disponíveis! Faça favor de escolher!

Estão a perceber a coisa?

Método alternativo para chegar à Serra da Estrela quando os limpa-neves estão avariados (o que é sempre)

Acaba por ser isto que faz o jogo da Tencent brilhar e vencer o cepticismo inicial. Não se limitaram a clonar uma ideia, copiando o que lá está. Há uma genuína preocupação com a experiência do jogador! Há um foco consciente e meticulosamente trabalhado na melhoria daquilo que é assumido como sendo a fonte de inspiração. E isso é de louvar. E quanto mais se explora do jogo, mais nos rendemos às evidências. Ring of Elysium é um jogo maduro, ponderado, não uma cópia feita à pressa para vender na feira. É o resultado de uma planificação cuidada, de uma optimização radical dos recursos, que oferecem gráficos e ambientes sumptuosos sem os constrangimentos que ainda hoje vão sendo razão de queixas no PUBG (sem entrar pelo aspecto cartoonish e infantilizado de Fortnite). E quanto mais descobrimos, mais nos agrada.

Detestam aquela micro-gestão de inventário, de ter que equipar acessórios em cada arma, tendo que os retirar quando queremos deixá-la pelo caminho? Aqui a gestão é virtualmente automática. Apanha-se uma mira, está logo aplicada numa das nossas armas de eleição compatíveis. Apanha-se outra e queremo-la na mesma arma? Fácil! Com uma tecla alternamos entre as duas, de uma mira 4x ou 8x para alvos longínquos para aquela Red Dot que nos permite enfrentar confrontos a curta distância com conforto. Uma tecla. O mesmo se aplica a outro tipo de acessórios, para armas que vão sendo habituais nos jogos do género.

Bambi, és tu? Mexe-te!

 

O jogo oferece também soluções para quem procura um bom jogo em equipa, com várias formas de identificar, no HUD ou no mapa, pontos de interesse. Uma tecla permite-nos apontar uma zona ou alvo para todos os nossos companheiros, mencionando a distância. Simples, útil.

As opções de mobilidade que referi são divertidas, além de úteis. A ideia é evitar que o jogador tenha a experiência de Walking Simulator que muitos condenam, e, na ausência de um dos veículos que o mapa coloca à disposição, dar-lhe outro tipo de mecânicas para se deslocar rápido. Mas são coisas trabalhadas, aproveitadas enquanto mecânicas de jogo, incorporadas naquele que é o core do jogo. Nos dois mapas que até agora experimentamos, as escolhas vão de uma Asa Delta (ou semelhante) a uma BMX, passando por material de escalada ou prancha de snowboard. Cada um tem os seus pontos fortes e fracos, mas é uma escolha que cabe ao jogador tomar e que permite, a ele e à sua equipa, definir uma estratégia inicial e de abordagem a novos confrontos. Deslocar-se até um ponto elevado e daí voar, silenciosamente, até uma zona onde estão inimigos, apanhando-os desprevenidos é uma delas. Invadir uma casa pelo telhado, aproveitando o Grapling Hook e a mobilidade que confere em pequenos espaços é outra.

Quanto aos mapas, dois distintos, até ver. Um passado na neve, com contrastes soberbos, em que o factor da pressão e timing recai na chegada de condições climatérias extremas, com uma anormal vaga de frio tirada do The Day After Tomorrow. E outro, numa ilha vulcânica, com essa componente a estar reservada para uma vaga de cinzas ardentes que tomam conta da ilha. Interessante e bem desenvolvido.

De saudar também a solução encontrada para o problemático final de jogo, que adiciona alguma justiça, mas também alguma competitividade extra aos momentos finais de uma campanha. Ao invés de ser um mero Last Man Standing, em que por vezes a sorte do posicionamento dita a honra dos vencedores, temos um helicóptero que se aproxima e paira o máximo de tempo possível, para tentar salvar tantos quanto conseguir. Cabem quatro. Como proceder? Negociar? Avançar à desgarrada em grupo? Aguardar que uns tentem subir para os abater enquanto o fazem, vulneráveis nas escadas que dão acesso ao helicóptero? Contemporizar, esperando ter mais mantimentos para restaurar vida do que os adversários? Em todo caso, basta UM elemento da equipa subir para que toda seja premiada, o que também é uma solução interessante para uma componente que foi muito, muito bem trabalhada e que se revela particularmente interessante.

Quem não tem fibra, tem sempre a opção de Satélite.

Em suma, Ring of Elysium recomenda-se. Mais do que um mero sucedâneo de um dos gigantes, faz por inovar e melhorar pontos do jogo que lhe deu origem, abrindo as mãos para acolher tudo e todos os que estejam dispostos a experimentá-lo. E quanto a isso, o jogo é gratuito, pelo que basta instalá-lo para o jogar e decidir por si mesmo. Por aqui, mais do que agradar, surpreendeu.