As promessas incontidas de No Man’s Sky abriram um mau precedente nas expectativas que o mundo fazia em torno de um jogo tão promissor. Um caso de estudo de um jogo interessante atropelado pelo seu próprio descarrilamento mediático, onde o logro do hype gerado toldou a avaliação da qualidade do jogo aquando do seu lançamento. Ainda hoje sinto que aquilo que Sean Murray e a sua equipa da Hello Games conseguiram é surpreendente, mas só ficou aquém pelos castelos no ar construídos por aquele em todas as suas entrevistas.

No Man’s Sky teria quase certamente arrebatado a crítica e a comunidade no momento certo: após o lançamento do jogo e nunca nos anos que precederam o seu nascimento. Foi esta percepção que senti em efeito retroactivo com o relativamente discreto lançamento de Genesis Alpha One, publicado pela Team 17, e um dos menos badalados exclusivos do Steam que foram “surrupiados” das barbas da Valve pela Epic Store.

Fazer pontes comparativas com No Man’s Sky pode parecer à partida arriscado, mas depois de ter passado muitas horas a tentar levar o futuro da civilização num bom porto que lhe permita um recomeço, chego à conclusão que a mistura de temas e géneros que o estúdio Radiation Blue atingiu com este Genesis Alpha One vale, e muito, pelo somatório do todo do que a aparente estranheza da observação das partes em separado.

Genesis Alpha One é um space exploration game, ship building and management game, resource management e action FPS com elementos roguelike num só pacote. Assim que nos fazemos ao espaço temos de assumir o papel de capitães da embarcação e começar a adicionar módulos à nave que a tornem habitável por tempo indeterminado, enquanto vagueamos pelo espaço à procura do planeta certo para fazer um reboot à Humanidade. Para fazermos os sucessivos upgrades e construirmos novos módulos na nossa nave (chamar-lhe-ia mais estação espacial, não fosse o facto de ela ser móvel) temos de obter recursos pelo hiperespaço. Seja a utilizar um feixe de atracção em detritos espaciais, ou a pegar numa nave (e em tripulação) e ir na primeira pessoa recolher recursos aos planetas circundantes ao estilo No Man’s Sky. A grande diferença para com o ex-exclusivo de PS4 é que o grande ónus destas incursões à superfície de planetas desconhecidas acarretam a sobrevivência a vagas de alienígenas que nos chegam atraídos pela nossa pequena embarcação. É neste momento que o ambiente de FPS de acção surge em toda a sua limitada glória, em que temos de disparar as armas que trazemos equipadas para ir matando alien ante alien entre momentos de colheita de recursos. Sempre que matamos criaturas alienígenas estas vão deixando cair troços de ADN, que podemos posteriormente estudar para incorporar novas características nos nossos clones. Mas já lá iremos explicar como é que funciona a nossa reprodução.

As idas aos planetas acabam por tomar grande parte do nosso tempo de jogo, já que a nossa pequena nave dedicada a estas visitas planetárias tem espaço limitado para recursos, o que nos obriga a regressar várias vezes ao mesmo planeta para obter todos os elementos que necessitamos. Alguns planetas, para além dos recursos naturais que procuramos, têm também plantas (que podemos re-plantar nas nossas estufas, criando biomos próprios à vida da nossa tripulação) e vestígios civilizacionais com os quais podemos “sincronizar” para obter informações e/ou upgrades para a nossa nave e tripulação.

Dentro da nave há muitas tarefas a cumprir, todas elas podendo ser levadas a cabo de forma lenta pelos clones que vamos criando de nós mesmos. Podemos também passar algum tempo em cada zona e acelerar manualmente dada tarefa, seja ela refinar materiais, recolher recursos do espaço ou clonar novos membros de tripulação.

Com uma grande complexidade mecânica, e um sentido de perigo que surge pelas possíveis invasões de criaturas alienígenas que nos invadam a nave e que destruam a frágil estrutura que mantém a vida a bordo possível, há porém um ou dois problemas que, no meu entender, não chegam a arranhar a boa experiência (e inventiva) que Genesis Alpha One nos traz.

A primeira é uma falta de sentimento de urgência. Na maioria dos jogos de sobrevivência espacial o tempo é um inimigo. Seja pelo decréscimo de mantimentos, oxigénio ou combustível, há uma série de factores que nos obrigam a estar constantemente em movimento sob pena de extinção. Genesis Alpha One não tem isso. A energia é virtualmente infinita se os reactores estiverem devidamente funcionais, o oxigénio idem pelas árvores que vamos plantando e mantendo e a alimentação é um não-problema. O que nos permite fazer inúmeras visitas ao mesmo planeta sem que sejamos punidos por “perdermos” tempo.

O outro problema é o loop monótono das incursões aos planetas que só não são mais evidentes pela sensação de perigo constante, ora pelos ataques das espécies locais, como pela fraca iluminação que nos faz correr de um lado para o outro sem vermos as pequenas grandes baratas que correm na nossa direcção.

Como dizia, depois de muitas horas com esta obra do estúdio Radiation Blue, o que posso sentir é que os criadores tinham consciência das suas limitações e decidiram não só assumi-las, como construir de forma sólida em torno delas. Não existe uma grande diversidade de recursos, nem de inimigos, nem de ambientes. Mas isso não implica que os momentos de gestão da nossa nave e as incursões para recolha de recursos sejam aborrecidas, muito pelo contrário. Mas Genesis Alpha One tem um tempo e um ritmo próprios, bem distintos de jogos de outros géneros mas de outras temáticas como Out There!.

A chegar apenas em Janeiro de 2020 ao Steam, este exclusivo da Epic Store publicado pela Team 17 é uma das mais agradáveis surpresas deste início de ano e um título obrigatório para todos os fãs da temática, ou aqueles que até gostaram de No Man’s Sky e podem encontrar aqui algo parecido, mas muito mais contido e, ainda que o jogo se passe no espaço, um jogo muito mais terra-a-terra.