Diz a lenda que os primeiros astronautas da NASA achavam impossível tirar notas das suas experiências no espaço porque canetas e esferográficas não funcionam em gravidade zero. Gastaram-se milhões a desenvolver uma caneta, a Space Pen, que escreve sem a força da gravidade, em qualquer superfície e debaixo de água e podemos comprar hoje em dia por pouco mais que 40€. Já os cosmonautas russos usavam lápis porque não tinham tempo para picuinhices. Ora, esta pequena rábula será o mote para o Ia-me Esquecendo de hoje, o jogo táctico Xenonauts. Não quero dizer desta maneira que Xenonauts é um lápis, até porque não há nada de errado com o lápis eu ainda uso todos os dias, mas a relação é possível de traçar da seguinte forma:
Pensemos em UFO: Enemy Unknown e Terror from the Deep, como sendo os lápis, aparentemente básicos mas cheios de potencial. Nas mãos de um bom ilustrador um lápis é um instrumento para criar arte, nas mãos de qualquer pessoa, serve para tirar notas ou fazer rabiscos, noutras mãos, pode até ser usado para matar 3 homens num bar… UFO é simples e eficaz e às vezes letal, tal como um lápis usado e adorado por muitos. Com a evolução tecnológica apareceram os XCOM que responderam às necessidades dos jogadores da mesma maneira que a Space Pen respondeu às dos astronautas. Em XCOM temos uma história para seguir (apesar de com missões aleatórias no meio), um sistema de movimentação simplificado em duas acções em vez dos pontos individuais, e cut-scenes que dão uma ilusão de movimento e emoção a um jogo que em quase tudo é parado. Xenonauts, por outro lado é a evolução natural de UFO, está para ele como a lapiseira de mina grossa está para o lápis, é quase igual ao jogo original, apenas está um pouco mais moderno.
Terminadas as analogias falemos concreta e brevemente de Xenonauts.
Passado ainda na Guerra Fria nos finais de 1979, tomamos o controlo de uma agência multinacional de controlo, erradicação e investigação de vida extraterrestre. Temos que criar bases, equipá-las com infraestruturas e pessoal, dar-lhes os recursos necessários para investigar o que recolhemos de naves e espécimes, construir equipamentos melhores enquanto gerimos as finanças e relações com todos os países do mundo, é necessário um equilíbrio entre o número de bases que temos, as áreas que cobrem e as nossas acções de modo a não perder fundos de nenhum dos nossos apoiantes para que possamos manter as nossas actividades. Ou seja, é um UFO/XCOM.
Xenonauts é mais realista do que UFO, todos os locais, armas (pelo menos as iniciais antes de desenvolvimento de tecnologia mais avançada) carros, aviões são realistas e semelhantes ao que existia em 1979. Este aspecto mais assente na terra dá-lhe uma intensidade maior. É mais relacionável para o jogador ver algo que o faz pensar na sua experiência e conhecimento do que algo mais fundamentado em fantasias de ficção científica futurista. Tal como nos UFO o nível de dificuldade é alto tornando-se muitas vezes impiedoso quando cometemos um erro estratégico e às vezes cruel só porque sim. Mesmo que seja frustrante quando um dos nossos soldados falha um tiro relativamente próximo sem obstáculos no caminho porque calhou naqueles 10% fora dos 90% de probabilidade de acertar, e no turno seguinte morre porque um alien teve a “sorte” de fazer um daqueles disparos mágicos que contornam obstáculos como na graphic novel/filme Wanted, é um jogo que puxa por nós a cada turno.
Mesmo com uma falta de narrativa linear, este tactical sandbox como eu gosto de lhe chamar é uma óptima opção para quem tem uma comichão para coçar com vontade de um XCOM moderno mas mais próximo dos originais. Xenonauts 2 está anunciado para Early Access em Março de 2019, faltam poucos dias mas ainda não vimos nada…