Para muita gente o pensamento do efeito dos RPGs nos videojogos nos 1990s passa invariavelmente pelo peso tremendo de Diablo, na sua vertente de acção e na franquia milionária que iniciou. Para muitos outros eram os jogos assentes na narrativa, com histórias pesadas e complexas, onde o combate era apenas um meio para um fim. Grimshade, criado pelo estúdio russo Talerock após uma campanha de Kickstarter de sucesso, presta homenagem precisamente a estes.

Nos primeiros minutos desta história vemos um estranho cientista a criar clones de um ser. Um desses clones acaba por revelar-se defeituoso e as instruções dadas aos soldados é para se desfazerem do corpo. Mas, como seria de esperar, o clone não está morto, e é encontrado por um dos protagonistas, Alistar, um dos Campeões da cidade de Brann, cuja missão é defendê-la dos ataques de estranhos monstros que habitam a floresta para lá das muralhas da cidade.

O mundo steampunk é de imediato pintado (ou não fossem as imagens promocionais do jogo a revelarem um personagem jogável um pouco mais à frente, um texugo com trajes steampunk a empunhar uma pistola) e a utilização de um estilo cel-shaded ajuda a criar um ambiente visualmente interessante.

Apesar do foco principal de Grimshade ser a história, aquilo do qual mais nos vamos lembrar é do combate. Feito numa grelha invisível de 3 por 3 em cada lado do embate (ficando um 6 por 3 no total), o posicionamento dos nossos personagens vão implicar muito do nosso sucesso. Sobretudo porque depois de estar largas horas em torno de Grimshade acabo por sentir que se as muitas mecânicas interessantes em torno do seu combate táctico por turnos ser interessante, há um grande desequilíbrio de dificuldade, tornando os combates a resvalarem para a injustiça em algumas situações.

O número de skills disponíveis por personagem são limitadas e estão ligadas aos itens equipados. A gestão dos turnos em Grimshade funciona com um sistema de iniciativa, em que a utilização de cada skill tem um número de unidades de tempo que “gasta” para ser activada, empurrando-nos para o fim da ordem de acção quanto maior for o número de unidades despendidas para agir. Conseguimos gerir skills mais fracas que nos permitem agir mais do que uma vez por turno, ou usar skills mais “caras” que nos conduzam a uma acção única.

Somando a isto o posicionamento na grelha dos personagens, mantendo Alistar na frente já que a sua habilidade passiva bloqueia o dano a todos os personagens directamente atrás de si, há muito para gerir em Grimshade.

A outra mecânica interessante na escolha de skills em Grimshade é que para além da unidade de tempo, cada habilidade tem um valor de tensão que adiciona a uma barra amarela que temos sob a barra de vida de cada personagem. Se essa barra se encher passa a vermelho e vamos estar alguns turnos sem poder agir.

O “crime” onde Grimshade incorre é mesmo no quão repetitiva fica a estratégia, pela limitação, da grelha, do número de skills e pelas estratégias possíveis. Vejamos o caso de um jogo do qual falámos a semana passada que consegue tornar as possibilidades de combate quase infinitas, como SteamWorld Quest. Grimshade é exactamente o inverso. Com a agravante que os sistemas de cura são dispendiosos, e facilmente vamos ter personagens a morrerem durante o combate, e que o desequilíbrio de dificuldade ultrapassa a barreira do desafio e chega à área da injustiça como dizíamos. O número avassalador de inimigos, aliados à sua capacidade de quase fazerem 1-hit kill à nossa backline, contrastando com o quão difícil é de recuperar o HP dos personagens. Grimshade é altamente penalizador dos nossos erros.

Não acho que esta quase injustiça do combate chegue para nos impedir de o jogar, nem sequer a história que acaba por correr os lugares-comuns de muitos JRPGs da década de 1990. Com uma direcção artística interessante e um combate muitas vezes frustrante, são as boas ideias mecânicas e o setting que o tornam apelativa, quiçá, durante uns saldos do Steam.