O preâmbulo mais ou menos auto-promocional: exemplos de História alternativa em torno da “guerra” entre Tesla e Edison não são novidade. No início de 2013 a editora Saída de Emergência lançou uma antologia de electropunk chamada Lisboa no Ano 2000, editada e coordenada pelo grande escritor de sci-fi português João Barreiros na qual eu tive o prazer de poder participar com um dos contos. O conceito revolvia em torno de um universo partilhado passado em Lisboa no ano 2000, mas não na realidade que conhecemos, mas numa em que as invenções de Tesla “levaram” a melhor perante das inovações do seu competidor norte-americano. Close to the Sun poderia pertencer a este universo, visto que o jogo recém-lançado do estúdio italiano Storm in a Teacup partilha exactamente desta premissa, a de que o mundo divergiu de forma completamente diferente ao seguir as ideias e as criações de Tesla.

Já tinha jogado todos os jogos publicados pelo estúdio italiano, tenha sido ENKI, N.E.R.O.: Nothing Ever Remains Obscure ou Lantern, e aquilo que se percebe de imediato é que há um grande salto qualitativo entre essas criações e este Close to the Sun, um sinal de evolução em poucos anos e que não fosse o facto de eu ter ido confirmar e dificilmente acreditaria que se trata do mesmo estúdio.

Close to the Sun acabou por ser mais uma ferroada na batalha “sangrenta” pela obtenção de exclusivos entre a Epic Store e o Steam. Não sei se essa é uma das razões para o aparente maior “corpo” de desenvolvimento ou não, mas a realidade é que o patamar de qualidade deste jogo é verdadeiramente surpreendente para um jogo indie. Aliás, sinto que em termos visuais e musicais, há estúdios muito maiores a fazer muito menos com mais recursos.

A componente auditiva de Close the Sun é de uma excelência surpreendente, tanto a nível de banda-sonora como até de voice acting. Há muitos bons argumentos neste (chamado) horror adventure game (que eu prefiro apelidar de thriller mystery do que outra coisa) para justificar o seu preço ligeiramente superior a outros jogos do género (Close to the Sun custa 29,99€ na Epic Store).

Neste mundo onde Tesla é uma celebridade, vivemos a pele de Rose Archer, que a convite da sua irmã Ada sobe a bordo da estrutura Helios, onde o cientista sérvio “vive” com os maiores cientistas do mundo. Mas os primeiros momentos de tensão surgem logo que chegámos aos portões desolados de Helios, onde a palavra “Quarentena” surge pintada a vermelho, prenunciando que algo de muito estranho e negro se passa ali dentro.

À semelhança de outros jogos dentro do mesmo tom (do qual Observer é capaz de ser o melhor exemplo), a tensão da exploração de das salas isoladas Art Déco de Helios acaba por ser polvilhada com alguns jump scares que se vão tornando mais intensos à medida que percebemos que não só não estamos sozinhos, como os corpos mutilados dos passageiros se vão multiplicando a cada nova sala que visitamos.

Há muito que vamos desvendando para além do obrigatório para progredir a história ao explorarmos cada canto e cada papel espalhado em cada sala. Sinto que muita da “carne” que compõe um enredo interessante mas infelizmente previsível como o de Close to the Sun depende muito é encontrada nesta pesquisa adicional, e os contornos entre o mistério, a ciência o crime e a espionagem industrial são encontrados nestes momentos.

Os puzzles são simples, e sinto que existem apenas para que muita gente não caia na tentação de apelidar Close to the Sun de walking simulator, e baseiam-se quase sempre em encontrar uma combinação específica para uma porta ou interruptor, e dessa forma progredir no jogo.

No meio de uma excelente direcção artística visual e auditiva, há algumas decisões mecânicas que acabam por manchar a experiência narrativa de Close to the Sun. A primeira é a velocidade do passo de Rose que é lenta, incompreensível na situação em que estamos de tensão, e a protagonista parece locomover-se como se estivesse a arrastar os pés pelo soalho. A outra, e possivelmente a pior, é quase herdado de Observer, e prende-se com as sequências de perseguição, onde perdemos instantaneamente se formos apanhados. Com alguns glitches de imprecisão nos momentos de saltar ou derrapar por obstáculos, associados a uma mudança de tom tão brusca na forma como ao ínfimo erro o nosso perseguidor nos conseguir apanhar, estas sequências acabam por destruir um pouco de tudo aquilo que é bem conseguido ao longo do jogo.

Close to the Sun é um bom jogo narrativo onde toda a gente cola a direcção artística Art Déco a BioShock, tanto que os próprios criadores tiveram que lembrar que não existem semelhanças entre eles para além da visual. E é verdade. BioShock, em especial Infinite, é um dos jogos com uma construção de mundo e de desenvolvimento de fio narrativo mais coeso e mais equilibrado da década. Infelizmente para Close to the Sun, a sua história está demasiados furos abaixo para sequer podermos ter o arrojo de o comparar com o jogo da Irrational Games. Apesar de previsível, a sua boa construção de mundo e de alguns dos personagens acaba por cair a pique em termos de qualidade muito por culpa dos soluços rítmicos da história, e quando o jogo termina ficamos com a impressão que os seus criadores quiseram deixar muito por dizer para uma expansão ou sequela. O que não é assim tão bom para um jogo que vive tanto da sua capacidade de contar uma boa história.