Caçada Semanal #203
“Os olhos também comem” é uma máxima tantas vezes aplicada à gastronomia mas igualmente ajustável à realidade dos videojogos. Vejamos o caso dos indies, que com poucos recursos mediáticos têm de conseguir conquistar os seus públicos com o que têm à mão. E muitas vezes a animação tradicional e a ilustração “à mão” acaba por ser mesmo um dos recursos que mais capta a atenção do público.
Os 3 indies dos quais falamos hoje são exemplo disso mesmo.
Zombotron [PC]
Esqueçamos o cliché de aterrar num planeta hostil, repleto de criaturas que terão de ser abatidas a tiro de caçadeira ou de espingarda, e foquemo-nos naquilo que Zombotron faz de bem.
Este shooter platformer (que tanto soa a Metal Slug) com elementos de RPG acaba por mostrar o quão cativante uma excelente direcção artística e o contributo de ilustradores talentosos pode permitir a um jogo erguer-se além das suas limitações mecânicas.
Altamente desafiante com a sua munição que se gasta com facilidade e que tem de ser usada com muito parcimónia, falta-lhe porém um inventário que nos permita comparar entre as diferentes opções de armamento quais as que nos convêm em termos de dano e fire rate.
Apesar de muitas vezes repetitivo no seu loop de jogabilidade, são mesmo os controlos do protagonista (que parece mover-se debaixo de água tal é a sua lentidão) que nos vão obrigar a procurar um teclado e um rato para ser o mais preciso nos disparos possível.
Zombotron tem uma excelente arte e é uma boa aposta para quem gosta do género, mas apenas se o encontrarem em promoção. A sua repetitividade e lentidão não são abonatórias a uma compra a preço inteiro.
Dark Quest 2 ]PC, Xbox One, PS4, Nintendo Switch]
Começámos a falar de Zombotron com um lugar-comum dos argumentistas e arrancamos com Dark Quest 2 com outro cliché narrativo: a morte do rei local e surgimento de um feiticeiro acompanhado pelos seus esbirros demoníacos e a vontade de dominar o Reino.
Cabe-nos a nós, para além de ignorar a linha de enredo que algures por ali aparece, de nos focarmos naquilo que Dark Quest 2 faz de bom: mostrar como é que se traz para os dias de hoje e para as consolas (o jogo saiu há dias para a Nintendo Switch) um RPG por turnos old-school, focado em dungeon crawling.
A vista isométrica e o combate em grelha obriga-nos a encarar cada sala de cada masmorra como se fosse uma boss fight, já que a mortalidade dos nossos membros da party podem (e vão) colocar-nos em apuros.
A decisão estratégica de como e com quem agir torna cada turno providencial ao nosso sucesso, com a necessidade adicional de conhecermos a fundo as habilidades passivas e activas de cada um dos nossos personagens e os respectivos contributos para cada batalha.
A arte, que é o ponto unificador desta caçada semanal, é exímia. O nível de detalhe em todos os elementos visuais que compõem Dark Quest 2, dos cenários aos personagens, são soberbamente executados.
Para todos fãs de RPGs por turnos/dungeon crawlers old school, Dark Quest 2 é um jogo obrigatório.
Tales of the Neon Sea [PC]
Apesar de ter decidido que o ponto de união destes 3 indies seria a qualidade das suas ilustrações, tenho de admitir que os clichés narrativos parecem ser outro ponto unificador destes títulos. Em Tales of the Neon Sea controlamos um ex-detective, agora investigador privado que está a tentar resolver um assassinato, num mundo cyberpunk cheio dos usuais lugares-comuns de discurso anti-corporativo.
A pixel art brilhante, do melhor e mais detalhado que já vimos na representação de ambientes cyberpunk acaba por ser a grande estrela deste Tales of the Neon Sea, que conquistou toda a gente desde os primeiros lampejos e antevisões da sua campanha de Kickstarter, e que resultaram numa brilhante peça visual.
Mais puzzle platformer e menos adventure game, Tales of the Neon Sea demonstra-nos rapidamente que não são apenas os “crimes” narrativos que aqui são cometidos que nos deixam algo desanimados, mas também uma certa aura de superficialidade dos seus puzzles que eventualmente acabam por quebrar o ritmo narrativo de uma história, que já de si, era relativamente desinteressante.
Tales of the Neon Sea é uma maravilha visual, mas possivelmente os elogios ficam mesmo por aí. À parte disso há muito pouco que o distinga de jogos mecânica e narrativamente melhor executados do que ele.