Já dizia o poeta “dêem-me mais aventuras-gráficas, que a vida é nada”. Quer dizer, o poeta falou em vinho, mas como eu consumo mais jogos point ‘n clicks pareceu-me mais sério falar neles do que no néctar dos deuses.
Se Trüberbrook já nos marcou este ano pela sua abordagem sui generis, Guard Duty vê-nos como aquele primo de infância que deixámos de ver durante tantos anos que agora mal o reconhecemos. Um primo que tanto mudou que ao mesmo tempo parece igual.
Falar em “repensar” as aventuras-gráficas e depois apresentar aqui Guard Duty parece um contra-senso. Nada poderia soar mais clássico que este jogo, que facilmente poderia passar como um filho perdido do catálogo da LucasArts da primeira metade da década de 1990, com o humor correspondente a vir ao de cima em cada pixel.
Guard Duty, desenvolvido pelos Sick Chicken Studios (possivelmente uma parente nossa afastada) é uma aventura de comédia que apela quase exclusivamente aos veteranos do género, que se vão sentir compelidos por quase de imediato, como uma vaga de nostalgia e de saudades sobre como o género naquele período específico se apresentou.
Para um jogo indie é uma agradável surpresa a quantidade de diálogo e de voice acting que este jogo inclui. Um feito memorável que afasta Guard Duty de tempos idos, ou que o coloca num ponto-médio entre a modernidade dos jogos fully voiced e o ambiente e abordagem estético-mecânica de outrora.
Guard Duty é um jogo cómico em dois mundos: o do passado, onde controlamos Tondbert, e o futuro, onde vivemos a pele do Agente Starborn, onde ambos têm como missão salvar os seus respectivos mundos da destruição. A interligação entre um ambiente de fantasia e um mundo sci-fi é outro ponto que se estranha, mas quase que sentimos a abordagem de Day of Tentacle, onde mundos diferentes se sentem coesos pelo fio narrativo.
Em termos de desafio lógico, Guard Duty cai naquele espaço onde já muitos outros jogos do género caíram. Possivelmente por eu, um acérrimo jogador de aventuras-gráficas, já estar habituado a todas as linhas de pensamento dos jogos clássicos, e também com a probabilidade dos autores deste jogo terem as mesmas referências do que eu, é fácil encontrar as soluções para muitos dos puzzles.
Guard Duty é sem dúvida uma viagem revivalista à era dourada dos jogos point ‘n click, com elementos actuais que se evidenciam, especialmente o tremendo investimento em voice acting que os seus autores fizeram. Mas acredito que seja um jogo, apesar da sua grande qualidade e do preço acessível (8,19€), que apelará apenas a jogadores mais velhos, e dificilmente criará qualquer tipo de porta de entrada ao género para as novas gerações.