Estava com um pé no Secundário e outro na Faculdade quando comecei a jogar Crash Team Racing, cujo CD ia sendo intercalado na minha PlayStation com um party game delicioso, Crash Bash. A PlayStation era rainha lá em casa, ofuscando a Sega Saturn que entretanto ia ganhando pó ou o Game Boy que há muito não tinha investimento da nossa tarde. Depois das muitas tardes passadas em casa de amigos a jogar Super Mario Kart, seria preciso o ano de 1999 para alguém conseguir sequer riscar a pintura dos karts do canalizador. 

Desenvolvido pela Naughty Dog, que somava sucessos com os lançamentos da trilogia de Crash Bandicoot, e que mostrava ser possível repetir na Sony aquilo que a Nintendo já fazia de forma incomparável: criar um divertido kart racing game com profundidade suficiente para garantir aos seus jogadores muitas e longas horas de excelente jogabilidade.

Exactamente vinte anos depois da Naughty Dog ter surpreendido o mercado ao catapultar o seu Crash Bandicoot para as pistas de corridas, eis que a Beenox, conhecida pelos seus ports de jogos da Activision, lança para PS4, Xbox One e Nintendo Switch Crash Team Racing Nitro-Fueled, o remake do famoso jogo que abriu a série de spinoffs de karts do Crash.

Este remake é mais um daqueles casos em que a ideia que eu tinha do jogo original era semelhante ao que este jogo é hoje, ou seja, os polígonos habituais dos jogos de então passavam-me uma imagem de “realismo” e de detalhe que não existiam. Basta uma pequena comparação entre a versão original e a recém-lançada para percebermos o longo caminho tecnológico e artístico que percorremos desde então.

Visualmente, o patamar atingido com Crash Team Racing Nitro-Fueled é espantoso, especialmente se considerarmos que no meio de tanto detalhe o frenetismo das corridas continua intocado. Aliás, a fluidez com que atravessamos as loucas pistas de Crash Team Racing Nitro-Fueled é uma das razões para que sintamos que ainda há muitos elementos de qualidade de level design do jogo original que se mantêm frescos até aos dias de hoje. Outros, infelizmente, nem por isso. 

O desafio, esse, é velha guarda. Na minha tentativa furada de mostrar ao meu filho o meu ilusório domínio de um jogo que joguei há perto de vinte anos, rapidamente fui caindo na tabela classificativa até nas pistas mais simples, e a ver o pódio sempre lá longe, por um canudo.

Na vertente split-screen, com outros jogadores ao lado contra uma série de competidores controlados pela IA o cenário mantém-se e eu e o meu filho entramos numa competição diferente: tentar perceber qual de nós vai ficar em último com os restantes karts bem distantes, a perder de vista.

Regressar a este tipo de dificuldade que conhecemos dos de outra era dos videojogos acaba por ser uma lufada de ar fresco para os jogadores mais jovens, habituados a outro mindset do mercado. Agrada-me que a Beenox tenha decidido mexer visualmente no jogo, actualizá-lo, corrigir a performance e o feedback dos nossos controlos, mas que tenha deixado intacta a dificuldade do jogo, obrigando-nos a masterizar ao segundo a nossa capacidade de provocar nitro boosts, sob pena de não conseguirmos obter todos os troféus que o Adventure Mode inclui, e não só.

Crash Team Racing Nitro-Fueled é verdadeiramente impiedoso, com um mínimo erro numa terceira volta em que, por milagre da destreza, conseguimos manter-nos em primeiro, nos atira quase automaticamente para o fundo da tabela classificativa. Ter sucesso neste jogo é um caso de ser perfeito nas corridas, de conhecer cada curvo ao milímetro e pelo meio gerir os power-ups para que nos consigamos defender no momento certo dos ataques dos adversários.

Para além do Modo de Aventura que abraça grande parte do jogo, há muito conteúdo para toda a gente, do mais solitário dos jogadores àquele que tem a casa cheia de gente ansiosa por passar o comando num torneio caseiro que causa inveja à Liga dos Campeões. A referência do género continua a ser Mario Kart 8 Deluxe, mas Crash Team Racing Nitro-Fueled consegue fazer aquilo que outras tentativas recentes não conseguem: fazer-nos regressar a um desafio interessante num pacote coeso e cheio de conteúdo com uma longevidade muita além do impacto das primeiras horas.