Há apenas uma pessoa dentro do meu círculo relacional mais próximo que efectivamente gere um clube de Esports, e fá-lo, diria, com todo o sucesso, em diversas modalidades. E pelo que conheço dos desafios da profissão, de forma alguma a visão real do que é gerir um clube de Esports é tão glamouroso quanto a versão demonstrada por Esports Life Tycoon, lançado em Early Access pelos mesmos autores de Youtubers Life. Mas para ser verdade não me lembro de nenhum jogo de gestão/tycoon que tivesse a intenção de ser uma cópia de todas as agruras da realidade.

Chamar tycoon a Esports Life Tycoon é, talvez, ir longe demais. As limitações das decisões que temos em termos de gestão são tão grandes que mais facilmente o enquadrava num light management game, onde as mecânicas principais devem muito a jogos de time management e menos a tycoonsA componente estratégica é relegada para segundo plano em troca de um sistema demasiado simples de cumprir e encher uma série de barras de forma a que cada nova partida seja, citando o próprio jogo, “um passeio no parque”.

À primeira vista as ideias de preparação para cada partida deste MOBA ficcional notoriamente inspirado em League of Legends é bem pensado. A primeira fase, obrigatória, é a de scouting, em que tentamos dissecar o comportamento dos adversários e é esta fase que nos vai permitir antever o quão difícil cada partida irá ser. 

De seguida podemos optar e intercalar entre três fases distintas: trabalhar a química da equipa, treiná-los no próprio jogo e criar hype em torno da próxima partida. O problema das duas primeiras fases é que não têm qualquer componente permanente, e perante cada partida começamos a “evoluir” a química e o treino individual do nível 1, e temos de medir até que nível é que o tempo disponível nos leva. Ao contrário do hype que vai condicionando o retorno financeiro e o número de seguidores que a nossa equipa tem, não existe qualquer retorno em trabalhar a química e o treino para além do momento em que a previsão da partida chega a “fácil” ou “passeio no parque” porque não há alterações estatísticas à equipa para além da partida que vão disputar em um par de dias.

Como dizia, tudo isto tem mais de time management game do que de tycoon. As diferentes fases de interacção e de preparação não são mais do que um mero clique em que deixamos uma barra ir enchendo e subindo de nível, à medida que o tempo passa. O impacto deste treino é efémero, como dizia, e seria mais interessante que o tempo dedicado ao entrosamento da equipa se reflectisse em algumas estatísticas colectivas mais permanentes ao longo de todo o jogo. Mas nada disso existe. 

A componente de time management passa por uma quinta actividade, descansar, e que recupera a barra de energia da nossa equipa, e que é o equilíbrio constante entre o tempo que gastamos nas restantes tarefas, e o grande desafio. Aliás, a única dificuldade que temos para não atingir a forma perfeita antes de cada partida é mesmo de não gerirmos a nossa energia como devemos, sendo que jogadores exaustos têm maior propensão a lesões e a terem as suas stats penalizadas. Por outro lado ao final do dia os jogadores são obrigados a descansar, o que lhes restabelece energia.

A componente de gestão passa pelos upgrades que podemos fazer às várias salas onde as tarefas tomam lugar, tornando o tempo de “subir de nível” em cada uma delas mais curto. À medida que a equipa vai crescendo e o nosso nível de CEO com ele, vamos poder mudar-nos para casas maiores, mas igualmente mais caras. Há um vislumbre do que o jogo poderia ter de mais complexo com a capacidade dos capitães de equipa partilharem bónus para toda a equipa, seja maior XP para os jogadores e os heróis que jogam, seja uma maior agilidade nas fases de treino. À parte disso, a densidade de Esports Life Tycoon é apenas uma pequena miragem no horizonte.

A gestão dos jogadores acaba por caricaturar os atletas de esports, já que grande parte dos seus pedidos soam mais a meninos mimados que querem um rato com milhares de DPIs ou uma pizza. A gestão das suas ligações pessoais é curta e acontece quase exclusivamente com estes pequenos pop-ups que são resolvidos ao atirar dinheiro ao ecrã e comprar-lhes os itens que eles precisam, ou mandá-los passar algumas horas a fazer uma actividade específica para arrefecerem a cabeça. A gestão de lesões é a mais complicada, já que o calendário competitivo obrigar a jogos de dois em dois dias e algumas das lesões necessitam de repouso de quase 1 semana, o que, em termos de campeonato, nos obriga a ter suplentes sempre disponíveis para o que der e vier.

Um dos momentos mais freaks do jogo passa pelos personagens que fazem pop-up para dentro da nossa casa e nos propõem coisas sem interesse narrativo mas que se traduzem em bónus às nossas fases de treino de 24 ou 48 horas. Este é o único elemento sobrenatural de um jogo que em quase tudo se quer assemelhar à realidade, ainda que uma versão muito glamourosa desta.

Os jogos em si mesmos podem ser auto-resolvidos, e normalmente dependem da previsão e do nosso treino prévio, ou então podemos embarcar num dos componentes mais aborrecidos de todo o jogo: simular as tácticas do LoL, com acesso a botões para pressionar cada lane. Acreditem que para alguém que jogou mais de 7 anos ao jogo da Riot, a forma simplista como a simulação táctica do jogo foi desenvolvida faz-nos abençoar a existência de auto-resolução de cada partida.

Esports Life Tycoon é um daqueles casos de jogos em alpha no Steam que têm boas fundações, que na primeira meia-hora aparentam ter um futuro promissor mas que a insipiência do seu game design rapidamente nos faz chorar por um jogo ligeiramente mais profundo, onde até um clicker assumido poderia ser bem-vindo. Perde-se assim a oportunidade de criar uma experiência mais profunda e criar um bom jogo de gestão de um clube de Esports, e que demonstrasse um pouco mais do mercado com outras modalidades que não apenas uma analogia ao LoL.