Control é provavelmente o jogo da Remedy Entertaiment que recebeu menos exposição mediática, desde que ganhou reputação mundial com Max Payne. Provavelmente por não ter a Microsoft por trás, como em Alan Wake e Quantum Break, mas sim uma editora de menor projeção, como a 505 Games. E desta forma, muitos jogadores que não conheçam o histórico do estúdio finlandês poderão passar ao lado daquele que não só é um dos melhores títulos da equipa de Sam Lake, como um dos candidatos a jogo do ano.
Quem jogou os anteriores títulos da produtora irá rapidamente notar os ingredientes típicos da fórmula utilizada pela Remedy: tecnologia de topo, habilidades sobrenaturais que transformam a ação, e obviamente, um enredo estupidamente mind fucker, típico dos filmes de David Lynch. Tudo isto combinado torna Control um candidato silencioso a GOTY. Vejamos porquê…
Em Control os jogadores assumem o papel de Jesse Faden, protagonizada pela lindíssima atriz Courtney Hope, que também participou no anterior Quantum Break, tanto no jogo como na série televisiva homóloga. Jesse acaba de ser apontada como a nova diretora da Federal Bureau of Control, uma agência governamental secreta dos Estados Unidos, encarregue de conter e estudar qualquer fenómeno que viole as leis da realidade. Não tentem pesquisar na internet, porque é secreta, certo?
Toda a ação tem lugar no edifício da agência, a chamada Oldest House, em Nova Iorque, que mais parece um antro fantasmagórico, devido à presença de uma entidade paranormal conhecida como The Hiss, que invadiu e corrompeu a nossa realidade. Acreditem que Control apresenta um dos mais complexos ambientes, e não esperem que o jogo em si apresente todas as respostas que necessitem. É preciso recolher as dezenas e dezenas de documentos classificados espalhados pelo edifício, cassetes de vídeos e bobines de áudio para tentarem compreender melhor a história, que ainda assim ficará à interpretação de cada um. Sim, tal como os filmes de Lynch.
Resumidamente, existem planos astrais e outras realidades do mundo, ligados a objetos banais, mas carregados de grande poder, os chamados Objects of Power. Quando ligados a determinadas pessoas, estes conferem habilidades especiais. Uma das missões do Bureau of Control é exatamente recolher e guardar esses mesmos artefactos.
A protagonista Jesse assume o cargo de diretora após o misterioso assassinato do anterior diretor. Ela própria é alguém que quando jovem tomou contacto com um dos objetos de poder. E o primeiro contacto com este mundo não poderia ser mais chocante: há pessoas suspensas no ar, há objetos com comportamentos estranhos, e tudo gerido pelos sobreviventes com aparente normalidade, ou não são fossem eles agentes que lidam com o paranormal no seu dia-a-dia. Mas isto é só a ponta do iceberg de todo o mistério.
Uma das novidades deste novo título da Remedy é a apresentação, pela primeira vez no currículo da produtora, uma aventura assente na exploração aberta do cenário. Ainda que tenha um formato metroidvania, ou seja, diversas áreas do cenário só podem ser acedidas após encontrarem determinada habilidade ou desbloquear o acesso restrito às diversas alas e pisos do edifício. Cada andar tem um mapa enorme para explorar, levando o jogador a deambular para a frente e para trás, suportado por um inteligente sistema de fast travel para poupar tempo.
Ainda que a história seja linear, caso decidam fazer apenas os capítulos narrativos, existem diversas missões paralelas que podem explorar, levando a personagem a encontrar bosses únicos, e a descobrir novos locais. E embora estas atividades, que passam por descobrir objetos do poder ou ajudar as pessoas prolongue um pouco mais a longevidade, o jogo não ultrapassa as 10-12 horas, mantendo a política do estúdio em oferecer experiências curtas, mas emocionantes.
Uma nota especial para a componente audiovisual. O jogo tem tons negros e sépia, salientando o ambiente pesado e sobrenatural da narrativa. A captura facial das personagens mantém a qualidade que já é apanágio nos jogos da Remedy. Ainda assim, de notar os sons das vozes misturadas das forças paranormais da Hiss, que se enfiam nos ouvidos e são divertidamente incomodativas. Imaginem como entrar numa igreja onde se ouve diversas pessoas a orar, sem parar.
Outra novidade que não deve passar despercebido aos jogadores de PC é que Control é um dos primeiros jogos a utilizar nativamente as novas placas gráficas com suporte a Ray Tracing. A Remedy é conhecida por introduzir tecnologia de ponta nos seus jogos, e Control apresenta efeitos de reflexos e iluminação como até aqui não foi feito. Infelizmente, a versão PC que testei correu num PC sem este hardware, por isso fica o testemunho de quem experienciou. Posso no entanto afirmar que a física dos objetos é do melhor que tem sido feito nos videojogos, seja a quantidade absurda de objetos que podemos manipular no cenário, como tudo serve no fundo como arma para a personagem.
E de facto não seria um jogo da Remedy se a protagonista não fosse dotada de habilidades únicas e estupidamente divertidas. Se Max Payne podia saltar em câmara lenta, batizado como bullet time, e Jack Joyce de Quantum Break podia manipular o tempo, Jesse tem poderes telecinéticos. Isso significa que a personagem pode pegar em qualquer objeto do cenário, sejam móveis, tijolos ou o que seja, e arremessar aos inimigos sem piedade. E se não houver nada por perto, arranca betão das paredes ou do próprio chão para enviar. E se os inimigos insistirem em atacar a personagem com granadas, estas podem ser igualmente devolvidas aos mesmos.
Só esta habilidade praticamente dispensa a chamada arma de serviço, que falarei mais adiante. Desde Max Payne que não me divertia tanto durante a ação, que é desafiante, mas repleta de oportunidades de improviso. É que ao longo da aventura, Jesse desbloqueia outras habilidades, tais como um dash rápido para se desviar de ataques ou dar aquele impulso extra nos saltos. Consegue ainda criar um escudo protetor improvisado, rodeando-se de escombros do cenário. Poderá também converter um inimigo para lutar ao nosso lado. E a minha preferida, a habilidade de flutuar, que torna a protagonista numa verdadeira super-heroína. Tudo misturado, quando dominam as habilidades, irão ter alguns dos set pieces de ação mais memoráveis dos últimos tempos.
Os inimigos são na sua essência os militares que foram dominados pela força da Hiss, e como tal estão armados até aos dentes. E claro, existem aberrações flutuantes, rápidas e até algumas invisíveis, ou com aspeto zombie, dependente do estado de influência da força sobrenatural. Os bosses podem ser agentes especiais, mais fortes de enfrentar, mas claro, aberrações monstruosas, sobretudo quando estão no plano astral.
Com referido, a personagem conta com a arma de serviço, e aquela que parece ser uma simples pistola, esta é modular e tem a capacidade de se transformar em diversos formatos, seja uma caçadeira, metralhadora, lança-granadas ou uma sniper rifle, por exemplo. Esta tem munições infinitas, bastando esperar um pouco que recarregue, quando não está a ser utilizada. Assim, quando faltam as munições, há sempre uma televisão à mão para arremessar aos inimigos.
Outro aspeto a ter em conta são os upgrades que é possível fazer nas habilidades como nas armas. Ao longo da aventura Jesse recolhe pontos que podem ser distribuídos para melhorar a eficiência das suas habilidades. Mas também irá encontrar em arcas espalhadas pelos mapas ou largados pelos inimigos alguns mods que podem ser inseridos nas armas, alguns são mesmo exclusivos de determinada arma. Por exemplo, aumentar o dano quando estão a mirar, ou aumentar a eficácia quando utilizada a flutuar, entre dezenas de opções distintas para formarem a vossa build, mediante o vosso estilo de jogo.
Estes mods, inspirados nos RPG, têm níveis de eficácia, por isso, preparem-se para utilizar mods pouco eficazes até encontrarem aqueles poderosos e muito raros, por vezes como recompensas das missões paralelas. Há também mods pessoais, que afetam a saúde da personagem e a rapidez de regeneração da barra de energia paranormal, entre outros.
Para além da ação, existem diversos puzzles para resolver, alguns de investigação e dedução, outros que utilizam elementos de física. Os próprios mapas conseguem ser um puzzle, já que nem sempre o caminho a seguir é claro de assumir.
De um modo geral, os controlos da personagem afinados, a sensação de disparo com as armas é excelente e a utilização das habilidades está tão simples e intuitiva, que é praticamente exemplar para tantos outros títulos que se tornam complicados a juntar estes elementos. Dessa forma, Control acaba por ser a concretização do experimentalismo que a Remedy andou a fazer ao longo dos anos nos seus diferentes universos. E isso torna-o, sem dúvida, um dos melhores jogos do ano e obrigatório se gostarem de títulos do género.