A grande maioria das campanhas de Dungeons & Dragons devem começar com um grupo de heróis a serem instruídos por uma figura sábia, mas mais velha, sobre um perigo milenar que assola a sua região ou mundo. Este é um ponto clássico de entrada em histórias de fantasia, e se somarmos a quantidade de livros, filmes e séries com a mesma premissa, então percebemos que “clássico” rapidamente resvala para “cliché”. Ou, se for o Gustavo Santos a explicar, “com classe”, porque lá está, na palavra “clássico” já se percebe logo que “tem classe”*.

Sin Slayers comete esse mesmo pecado. Caímos (literalmente) numa igreja rodeada por 7 regiões distintas, e somos informados por um decano que precisamos de derrotar as personificações dos 7 pecados mortais, cada um a comandar uma das regiões contíguas à igreja. Depois de uma tremenda dose de originalidade como esta, somos enviados com a nossa igualmente original party composta por uma arqueira, um guerreiro e uma curandeira (desculpem-me não usar a palavra healer).

O enredo, como devem imaginar, é a pior das qualidades de Sin Slayer. Sob pena de ser injusto para com este jogo criado pelo estúdio goonswarm, a falta de originalidade em quase todos os seus aspectos acaba por ser compensado pelo risco de cruzamento de géneros que instituíram no jogo.

O combate é o mais clássico dos RPGs por turnos, herdado, e muito, pelas definições que os JRPGs implementaram ao género e que passaram a ser os standards em todo o mundo. Com um sistema de fraquezas e resistências que vão sendo “aprendidas” à medida que derrotamos novos tipos de inimigos, há também uma série de outras informações como o HP e a armadura destes que só se tornam visíveis após derrotarmos o primeiro inimigo deste tipo. A armadura é um buff que faz refresh em cada novo combate, e que serve de barra de “protecção” dos pontos de vida. Finda a armadura, os ataques começam a desgastar o HP.

Sem a ideia de mana ou energia clássica, os ataques especiais de Sin Slayers são feitos com recurso a uma barra de Rage, em que cada personagem ou inimigo recebe 1 a cada turno. 

A morte da nossa party, a temida TPK, não é assustadora, já que Sin Slayers assume uma postura roguelike. O grind que iremos fazer em cada mapa, proceduralmente gerado, é intenso, e morrer é apenas parte do processo.

A nossa party, constituída por 3 personagens de uma pool de até 10 que iremos desbloquear, tem árvores de habilidades e itens específicos por personagem. Cada um deles tem também uma habilidade única aplicável no mapa de exploração, cujo cooldown depende do número de ladrilhos que vamos revelando do mapa.

Esta faceta de exploração é feito no meio de um tabuleiro com quadrículas envoltas em neblina. Sempre que revelamos uma nova quadrícula podemos despoletar um combate, um evento ou uma nova quest, tudo isto contribuindo para uma mecânica que bebe do conceito base do jogo: a existência de pecados. 

Sempre que começamos uma nova dungeon a nossa barra de pecado está a zero. Os eventos que despoletamos e as consequências destes vão contribuindo para essa barra, apara além das condições inatas de cada dungeon. A primeira, por exemplo, referente à gula, aumenta-nos a barra de pecado se consumirmos comida para nos curarmos. Esta barra indica o nível de dificuldade dos monstros com o qual nos cruzamos: quanto maior o nível de pecado, mais fortes são os inimigos.

Com tantos clichés, seria de esperar que o nível de repetição e grind de um jogo que mistura uma aura de JRPG com roguelike fosse tornar-se um aborrecimento generalizado, mas para surpresa minha não só os 2 géneros funcionam em conjunto (ora não existissem tantas outras experiências similares), como há algo de “relaxante” num jogo despretensioso com boas animações em 16 bits, que nos quer focar a atenção no combate, na progressão dos personagens e na exploração dos mapas proceduralmente gerados.

Sin Slayers não tem a profundidade ou a inventividade de ser um marco no mercado indie, mas mecanicamente todo o investimento que nos obriga a fazer acaba por ter retorno. Embarquem nesta aventura pecaminosa com essa consciência e poderão encontrar aqui uma diferente abordagem aos RPGs por turnos. 

*Nota: o Guga não estaria errado, como deverão saber se analisarem o étimo da palavra.