Há em nós uma tendência natural de evidenciarmos os bons momentos no nosso percurso para compaginar as nossas qualidades. Mas tantas vezes nos esquecemos que o todo que somos é mais complexo do que isso: é também constituído pelas nossas fraquezas, pelas nossas escuridões emocionais, pelas nossas falhas e pecados. Separar estas partes negras da nossa existência é recusarmos reconhecer quem somos.

FRACTER, desenvolvido por San Suryavanshi, lembra-nos, de forma silenciosa, disso mesmo. Uma protagonista que se olha ao espelho nos primeiros instantes do jogo e que se vê fracturada em dezenas de cópias suas constituídas por luz e escuridão e que a deixam, sozinho, dividida e incompleta.

O que se segue é uma experiência que nos mergulha na jornada pela escuridão da protagonista que tenta voltar a reunir-se com partes de si mesma, através de um labirinto constituído por incontáveis puzzles.

Sem qualquer habilidades inata, em FRACTER temos de resolver puzzles de ambiente, manipulando fontes de luz, interruptores, feixes de luz, rodar plataformas, de forma a permitir que a protagonista se reencontre com aspectos seus espalhados pelo labirinto. 

A forma como San Suryavanshi conseguiu aliar o peso do tema ao ambiente melancólico é brilhante, e o ambiente sonoro é aqui um dos maiores contributos. A melancolia de FRACTER não é apenas tangível na escuridão quase omnipresente de todo o jogo, mas na forma como os subtis e taciturnos efeitos sonoros e pequenas composições ocupam todo o espaço auditivo do jogo.

A inexistência de poderes da nossa personagem é parte do desafio, já que vamos ter algumas salas repletas de inimigos que vão exigir a nossa furtividade, e alguma intelig~. É claro que estes elementos entram aqui numa perspectiva de puzzle, e não de acção, e são mais um obstáculo a ter em conta para nos reunificarmos com as nossas partes perdidas.

Lançado para Android a 3,99€ e para Steam por 5,69€, FRACTER é uma agradável surpresa nos jogos indie de puzzle, com um subtexto complexo que vai sendo sussurrado a cada nova sala, e a cada novo quebra-cabeças. Com uma excelente direcção artística apesar da sua simplicidade e monotonalidade (ora não fosse Survyavanshi um experiente animador da DreamWorks), FRACTER é uma excelente aposta ao preço de um menu de fast food, mas com muito mais substância nutricional. E sem dizer uma única palavra é uma história muito melhor do que muitos jogos tentam ser.