O que acham que gosta de jogar o adepto de futebol? FIFA? PES? Football Manager? Candy Crush?
Nenhuma das opções é necessariamente mentira: se gosta de futebol é plausível agradar-lhe a ideia de pegar no Cristiano Ronaldo e ganhar um jogo; ou pegar na equipa do CR7 e vencer dez Ligas dos Campeões; ou agarrar Cristiano pelas pernas e rebentar com os açúcares refinados que ele não deve comer (game designers deste Portugal, é só deixarem o meu nome nos créditos).
Acontece que nem todos os doentes da bola que conheço têm consola em casa ou passam muito tempo a jogar computador. Até gostam de FM, que dá para cumprir alguns sonhos de treinador de bancada. Mas isso chega-lhes? Claro que não.
O que é fixe é ser treinador de bancada, mas saber que em vez de o universo se separar em dois depois do primeiro dia de jogo vamos antes ver o nosso sucesso ou fracasso perfeitamente alinhados com a realidade: bem vindos ao mundo das fantasy leagues.
A que se resume toda a febre? Somos um treinador com orçamento para criar um plantel cujos jogadores, ao longo da época, pontuam consoante certos dados estatísticos verificados em contexto real: golos marcados, sofridos ou assistências para golo, por exemplo. Numa liga em que a nossa equipa compete com as de outros jogadores, quem acumular mais pontos nos seus atletas, ganha… o quê? Há quem aposte jantares, há quem aposte dinheiro, há quem aposte chocolates. Mas acima de tudo ganha-se bazófia. “Eu é que sabia que o Seferovic ia ser o melhor marcador” ou “Vi o craque no Bruno Fernandes antes de toda a gente“. No final do dia o que importa é podermos soltar o Jorge Jesus ou José Mourinho que há dentro de cada um frente aos nossos amigos/rivais até à morte.
Estatísticos Unidos da América
Toda esta brincadeira começou do outro lado do Atlântico. Doentinhos dos números no desporto, viciados em estatística, quem mais senão os sobrinhos do Tio Sam? Devemos agradecer a um senhor chamado Wilfred Wikenbach, que no final dos anos 1950 começou a recolher estatísticas de jogos de golfe e basebol. A coisa evoluiu para em 1962 este criar a primeira liga fantasy de futebol americano, onde passava as tardes a telefonar para redações de desporto a recolher os preciosos dados de cada jogo.
Após um surto de popularidade nos anos 1980 – nos quais uma greve de alguns meses da Major League Baseball levou a comunidade jornalística a não ter nada para escrever que não estas ligas fictícias – estas ligas entraram na maturidade com o advento da internet uma década depois. Hoje em dia, esposas abanam a cabeça em reprovação enquanto os maridos passam as tardes de domingo a acompanhar tantos jogos quanto possível (o fenómeno é predominantemente masculino) de forma a aferir se no dia seguinte irão de peito feito para o trabalho porque as suas escolhas de factores que nunca irão controlar lhes sorriram de volta.
Se o basebol é onde as fantasy leagues têm mais expressão, o futebol americano segue muito perto, com o basquetebol e hóquei no gelo a completarem a proporção de 10% da população dos Estados Unidos (no final de 2018 existiriam cerca de 327 milhões de habitantes naquele país). Ou seja, as quatro principais modalidades norte-americanas têm grande expressão nesta indústria que emprega mais de 4 mil pessoas e vale cerca de 7 mil milhões de euros.
“Mas Óscar, que tem isto a ver com o doente da bola?“. Demos um salto até à Europa, amigos…
Desporto-rei
Uma das coisas que torna o futebol tão popular por todo o planeta é a paixão que gera. Muito menos dependente de números, costuma-se dizer que “todos os jogos começam 0-0” e a verdade é que poucas modalidades darão mais hipóteses aos estatísticamente inferiores de saírem triunfantes. Ainda assim, pelo menos cinco milhões de pessoas jogam em ligas fantasy no Reino Unido, terra do campeonato de futebol mais popular da Terra.
Por terras de Camões, além dos muitos milhares que também acompanham o fenómeno lá fora, o campeonato português tem cada vez mais expressão nas ligas fantasy. Na Liga Record (activa desde 1995, quando os boletins dos plantéis ainda eram enviados pelo correio), Liga MaisFutebol ou RealFevr (a oficial da Liga Portuguesa), quem gosta de experienciar o poder de um manager mas tem demasiado apego à realidade para se emergir numa base de dados tem aqui a oportunidade de cumprir os seus sonhos.
Para quem se quer envolver à séria há prémios em dinheiro ou até automóveis em jogo para os melhores. Mas na verdade o que importa é a bazófia de poder chegar ao escritório numa segunda-feira, ser do Sporting (não chores por mim, Argentina…) e mesmo assim tirar satisfação dos acontecimentos futebolísticos do fim de semana. Se ainda estão desconfiados, pensem como se fosse um RPG táctico em que a realidade é o vosso pedaço de história semana a semana.