ou a arte de ser o Lord Varys ou Peter Baelish, ou um qualquer outro intriguista (ok… ou qual fosse a casa que vocês acompanhassem quando a Guerra dos Tronos estava na berra e que depois deixou de estar por causa da porcaria filmada antes da escrita dos livros estar concluída)

Queres ser um Mindinho (e imaginar todo aquele poder e aquele harém ao teu dispor)? Queres ser um Aranha com a tua rede de passarinhos que tudo segredam ao seu mestre? Queres ser o filho anão do Rei e fazer o melhor pela tua família? Queres ser um alquimista perverso? Queres não queres? Pois não podes! Desculpem o ‘beite‘ mas a culpa é deste jogo que é tão porreiro, ao ponto de me fazer escrever acerca dele. ̶G̶a̶m̶e̶ ̶o̶f̶ ̶T̶h̶r̶o̶n̶e̶s̶:̶ ̶A War of Whispers é um jogo que podia ser um franchise da famosa série Guerra dos Tronos propriedade da HBO, mas não o é. E tinha tudo para o ser… Como o ‘aipe‘ já passou agora posso falar deste excelente jogo que tive oportunidade de jogar graças ao Paulo Vicente, membro já bastante conhecido e estimado na comunidade. Dedico um grande agradecimento público pelas pérolas que trazes todas as sextas.

Não sejam hipócritas, seus degenerados. Atire a primeira pedra quem nunca imaginou uma sanduíche… o Mindinho já…

Para mim e ainda um pouco na senda dos melhores jogos de tabuleiro de 2019, ̶G̶a̶m̶e̶ ̶o̶f̶ ̶T̶h̶r̶o̶n̶e̶s̶:̶ ̶A War of Whispers foi um daqueles jogos que passou muito discretamente pelo meio. Se tivesse que fazer uma metáfora acerca de ̶G̶a̶m̶e̶ ̶o̶f̶ ̶T̶h̶r̶o̶n̶e̶s̶:̶ ̶A War of Whispersentão este jogo de tabuleiro seria aquele puto ranhoso e feio que no secundário era muito bom com os números e acabou por vingar na vida por mérito próprio. É uma criação do norte-americano Jeremy Stoltzfus para a Starling Games. A Starling Games foi responsável pelo excelente cooperativo Black Orchestra, que já tive oportunidade de experimentar. Com uma arte de Tomasz JedruszekDann May aliada a uma mecânica de jogo original e bem conseguida, G̶a̶m̶e̶ ̶o̶f̶ ̶T̶h̶r̶o̶n̶e̶s̶:̶ ̶A War of Whispers soube vingar por mérito próprio (e com humildade) ao apresentar um ‘ ̶w̶o̶r̶k̶e̶r̶ intriguista placement‘ onde o fator de estratégia, wargamming, area control e betting game estão bem equilibrados e proporcionam um bom entretenimento.

 

Ele não é o teu patrão…. é o teu fantoche!

Pois é enquanto jogadores somos congratulados com um tabuleiro em forma de piza. Antes que me acusem de heresia, aviso que a sua forma se bem que alegadamente propagandeia o ‘flate-ertismo‘, não tem muito a ver com este (ok só um poucochinho). Descansai ó irrequietas almas pois esta forma é totalmente justificada por dois motivos. O primeiro é que representa de facto um mundo medieval inventado que em termos arquétipos representa uma visão do mesmo e em segundo lugar a sua forma determina a ordem de jogo. Um excelente exemplo onde o design, a mecânica e a arte estão bem equacionados entre si. Em ̶G̶a̶m̶e̶ ̶o̶f̶ ̶T̶h̶r̶o̶n̶e̶s̶:̶ ̶A War of Whispers cada jogador representa uma sociedade secreta responsável por manipular os governantes deste mundo a fim de se tornar a mais influente. ̶Q̶u̶a̶l̶q̶u̶e̶r̶ ̶s̶e̶m̶e̶l̶h̶a̶n̶ç̶a̶ ̶c̶o̶m̶ ̶a̶ ̶r̶e̶a̶l̶i̶d̶a̶d̶e̶ ̶é̶ ̶p̶u̶r̶a̶ ̶c̶o̶i̶n̶c̶i̶d̶ê̶n̶c̶i̶a̶.̶ Tal, num regime democrático e muito transparente como a nosso, é impossível e mesmo inadmissível que aconteceça! Agarrem-se pois ao vosse gene sociopata porque passarei a explicar-vos em traços gerais como se processa este jogo.

A ordem de jogo processa-se no sentido dos ponteiros do relógio. ̶O̶s̶ ̶D̶o̶t̶h̶r̶a̶k̶i̶ digo o reino castanho é o último a entrar em cena.

A mecânica

A mecânica é deveras simples. Cada jogador à vez vai colocar um intriguista numa corte dos cinco reinos existentes neste mundo imaginário. Depois, e à vez, vamos manipular movimentos de tropas, ocupação de territórios e guarnição, ou não, dos mesmos a fim de perseguir os nossos intentos. Apesar de ser fundamentalmente um ‘area control’ onde incrementamos ou diminuímos a força de um reino no mapa, o verdadeiro intento da partida baseia-se num jogo de leilão. Antes de começarmos por nós mesmo as nossas práticas sociopáticas de manipulação feita atrás da cortina, cada jogador tem um ‘player mat’ onde vai apostar numa casa vencedora. Vence a casa real que mais cidades controlar. O número de cidades determina o número de pontos obtidos no final da partida. As apostas são secretas mas a qualquer altura do jogo podemos alternar a posição de duas casas. Ao fazê-lo temos de tornar público a todos os outros jogadores quais foram trocadas e quais a importância (pontos) que esperamos ganhar com essas casas.

A fação Aranha Suplicante… qualquer semelhança com Lord Varys é uma coincidência.. Em baixo os pontos ganhos por reino.

Apesar dos cinco reinos serem assimétricos entre si têm todos quatro posições chave na sua governança. Estão organizados gradativamente do menos poderoso para o mais poderoso. Primeiro: o xerife (normalmente responsável pelo arrigementar de tropas); segundo: o mordomo, que faz na prática o mesmo que o xerife mas tem a possibilidade de o fazer com nuances mais acentuadas usando para tal cartas especiais disponíveis num baralho para todos os jogadores; terceiro o marechal que pode arregimentar tropas e fazer a guerra no seu turno (para isso deslocando tropas) e por fim o chanceler, figura máxima da governação ‘de facto‘ da casa a que está fidelizado. O chanceler ocupando o último lugar pode trocar com qualquer um dos outros. Cada jogador vai à vez e num sentido circular (no sentido dos ponteiros do relógio) começar por jogar desde a personagem menos influente até à mais influente influenciando o destino dos reinos. O lugar jogado mais à direita controla todas as outras casas não ocupadas por agentes inimigos (os intriguistas competidores), ganhando assim acções gratuitas. Existem quatro turnos e o vencedor ganha com o maior número possível pontos.

̶H̶o̶u̶s̶e̶ ̶S̶t̶a̶r̶k̶ digo Reino azul gelo. Podem-se ver no lado as quatro posições régias e o que podem fazer. Cada reino tem ações ligeiramente assimétricas…

As cartas permitem alterar substancialmente a dinâmica dos exércitos oferecendo acções de ataque suplementares até reforços adicionais. O importante aqui não é tanto apoiar uma facção vencedora mas sim equilibrar os nossos interesses com os dos nossos adversários/aliados e claro com as nossas apostas dispostas no início da partida.

No final de cada turno temos a possibilidade de trocar as nossas apostas revelando-as aos outros e retiramos um intriguista da nossa mão do mapa para fora de jogo. Simples! Depois todo o desenrolar da partida  passa por acompanhar as dinâmicas de controlo do mapa e ajustar o mesmo à nossa vontade. Tem as vantagens de ser um jogo que facilmente nos transporta para o universo de Game of Thrones sem nos fazer perder cinco ou seis horas por partida com Risk: Game of Thrones, como já tive oportunidade de ver num encontro em Oeiras. É um jogo simples e fácil de aprender. Numa realidade em que os jogos tende a tornar-se mais orientados para componentes de story telling com partidas que podem chegar facilmente a duas ou mais horas em ̶G̶a̶m̶e̶ ̶o̶f̶ ̶T̶h̶r̶o̶n̶e̶s̶:̶ ̶A War of Whispers uma partida pode demorar pouco mais de uma hora com a vantagem de nos sentirmos o homem atrás da cortina. Só porque os livros são ricos e complexos em substância um jogo em como a adaptação de Risk não tem de seguir a mesma regra.

Ser o homem atrás da cortina ou não ser o homem atrás da cortina…. eis a questão.

O aspecto geral de uma versão deluxe personalizada no entanto a original é bastante mais espartana. Cubos representam exércitos e tudo o resto está desenhado no mapa.

Xasus!!!! Até na versão banal aquele cromo que todos conhecemos que tem uma impressora 3d vai fazer umas torres só para se verem melhor no mapa.

Em resumo acho que estamos na presença de um jogo excelente que foi lançado no ano passado e não teve a atenção merecida. É um jogo simples, rápido de aprender e tem uma duração curta e agradável. ̶G̶a̶m̶e̶ ̶o̶f̶ ̶T̶h̶r̶o̶n̶e̶s̶:̶ ̶A War of Whispers joga-se de um modo mais agradável entre três a quatro jogadores. A dois não funciona tão bem dado ao fim de alguns turnos já sabermos bem o que o outro está interessado em manipular.  A arte está aceitável e se bem que os componentes sejam espartanos consegue transmitir o que se espera: sermos um manipulador no meio de uma guerra.

Pela sua humildade e mecânica de jogo bem apurada e consistente com a sua ideia inicial,  ̶G̶a̶m̶e̶ ̶o̶f̶ ̶T̶h̶r̶o̶n̶e̶s̶:̶ ̶A War of Whispers é um jogo que merecia ser facilmente adoptado pelos detentores do franchise, mas dado o ‘aipe‘ já ter acabado será no entanto uma agradável nota de rodapé face: tanto à série que nos deixou um sabor agridoce, como às demais versões oficiais em modo boardgame. Essas não pecam tanto pela falta de qualidade, sejamos justos, mas sim falham um pouco pela captura, em forma de jogo de tabuleiro numa forma simplista (e que esteja este facto bem vincado), da trama de intriga política tão inteligentemente escrita por R.R. Martin. Sim às vezes um produto simples pode funcionar tão bem quanto um mais complexo.

P.S. Aliás aproveito para relembrar ao mesmo, caso esteja a ler isto, que ainda tem dois livros por acabar, sr. Martin. Sim porque o elefante na sala, do qual ninguém fala, é que: R.R. Martin está, tipo a um donute de distância de morrer, com um ataque cardíaco e de deixar toda a gente com a série pendurada sem saber como vai acabar. Acabe os livros homem!!

Bónus

Quando deixámos de ser tão sábios… Os senhores da MB é que sabiam…

 

Resposta: “REEEEEEEEEEE”