Voltei à fronteira. Onde a civilização está a acabar de eliminar um ambiente hostil com pessoas ainda mais hostis. O “De volta a…” deste mês de Abril foi a Red Dead Redemption 2. As saudades que eu tinha de cavalgar pelas ruas de Saint Denis, as pradarias, bosques e montanhas que circundam a vibrante metrópole do Oeste fictício e as aventuras de Arthur Morgan e do Gang Van der Linde.

No que diz respeito a Red Dead Redemption 2 eu sou um privilegiado. Não só tive a oportunidade de ir fazer um pequeno teste um mês antes do jogo ser lançado como fui uma das duas pessoas a nível nacional e poucos no panorama internacional que recebeu o jogo antes do seu lançamento para poder dar uma opinião sobre ele. Por outro lado, também perdi muito do jogo porque para conseguir entregar o artigo a tempo e com outras obrigações pelo meio acabei por ter de o despachar, e não o joguei como deve ser jogado e aproveitado. Apesar de o ter jogado tanto quanto possível não explorei as histórias paralelas nem a beleza do mundo que a Rockstar criou ao máximo. Agora, tenho criado disponibilidade para desfrutar desta obra.

Vou eliminar grande parte dos elogios técnicos e sobre o que é Red Dead Redemption 2, o ambiente do oeste, a história fantástica e tudo mais porque já o fiz nos dois artigos anteriores, mas sim vou tentar focar-me no resto. No mundo que está ao nosso alcance naqueles 80 gigabytes e trocos. Eu não voltei ao início do jogo, são muitas horas que agora não tenho mas voltei a um dos meus saves ali para o meio que me permitiram fazer muita coisa que tinha deixado pendente, especialmente side quests. Ainda pensei virar a minha perspectiva e fazer as coisas mais pela negativa como o Jeff Dye, no bit de stand-up abaixo, mas depois desisti.

Eu não sou a pessoa mais simpática do mundo, mas neste mundo virtual, vivendo na pele de Arthur Morgan não quis ser o mau da fita, hei-de o fazer um dia, começar outra aventura e fazer no extremo oposto em que o todas as minhas acções seriam vistas como negativas para ver como desenrola a história. Matar e roubar a torto e direito como se não tivesse consequências, mas não agora. Agora decidi fazer o bom caminho, ser o pistoleiro que salva as pessoas, que as ajuda. Mesmo matando algumas pelo caminho, vou tentando fazer boas acções sempre que posso. E acima de tudo fazê-lo com estilo, porque o meu Arthur Morgan é um autêntico Doc Holliday, provavelmente o pistoleiro mais bem vestido do Oeste. Pode não tocar piano, nem saber latim, mas é um homem de classe.

Mas agora vamos lá falar do que é voltar a este jogo tanto tempo depois e dedicar-lhe a atenção devida. Primeiro; Red Dead Redemption 2 é mais que um jogo, é uma obra de ficção, é um filme, é uma história com muitas histórias todas elas entrelaçadas e importantes em vários aspectos. Mesmo quando os últimos 10% são fazer recados para a nossa mulher, mas são necessários para fazer a ligação com o seu excelente original. Mesmo com toda a polémica de crunch, e condições laborais que foram criticadas a Rockstar criou uma obra que supera tudo o que se podia imaginar possível fazer nesta geração de jogos. Quando eu e muitas mais pessoas dissemos que se podia fazer tudo no jogo era verdade. Não é verdade como se pode fazer tudo em Breath of the Wild. São jogos com estilos diferente. Enquanto um é mais fantasioso mas respeita leis físicas que podem ser usadas a nosso favor, o outro é mais realista mas desrespeita algumas coisas importantes. Não fazer algumas acções como negar comida ao nosso cavalo ou negligenciá-lo de alguma maneira, não dar dinheiro ou mantimentos ao gang, não dar banho a Arthur, ou não dormir nem comer ou limpar as armas tem pouco efeito no jogo em si. Não nos expulsam do gang, o cavalo ou Arthur não morrem à fome e as armas não falham. Há sim pequenas alterações de performance ou relacionamentos mas, e é um mas enorme aqui, quando nos enfiamos no jogo o ambiente é tão realista, as emoções são tão fortes que na nossa cabeça somos tão obrigados a fazer estes pequenos gestos fictícios como comer e respirar na vida real. Na nossa mente é preciso escovar o cavalo e comer e dormir. E isso é um feito enorme para uma obra de ficção. Dar-nos a ilusão de realidade é algo que poucos conseguem fazer.

Muitos “jogadores” criticam Red Dead Redemption 2 porque esperavam algo mais semelhante a um GTA no Oeste selvagem, que na verdade é. E ao mesmo tempo não é. Se formos ver as obras da Rockstar, mesmo incluíndo o modo online, Red Dead tem mais de L.A. Noire que de GTA curiosamente quando o ambiente inóspito seria mais propício à acção desenfreada. Não há investigação como em Noie mas é mais calmo, mais sossegado que GTA. O facto de Arthur andar, por defeito, em vez de correr implica automaticamente o ritmo que devemos levar na nossa jornada, a passo e não galope. Quanto muito, a trote. É um jogo para apreciar como uma bela refeição não é para enfardar em 5 minutos como um hamburguer. Também porque optei pelo lado mais benéfico do personagem confesso que foi mais fácil fazer isto com calma já que assaltei poucas pessoas, bancos, diligências ou comboios, a não ser quando o enredo me obrigava a fazê-lo por alguma missão, o meu tempo era passado a vaguear pelos campos, a ver as belas paisagens e a caçar ou pescar. Nada de especial, nem me dei ao trabalho de caçar os animais lendários ou de estar mais de duas horas a tentar domar o cavalo árabe branco no topo das montanhas como o meu irmão, mas passei muito tempo a perseguir pistas de veados e javalis para levar para o acampamento, tal como outros animais ou simplesmente à beira de um lago com uma cana de pesca.

Red Dead Redemption 2 podia ser feito sem história, só o mundo aberto ao estilo de Sea of Thieves mas com a possibilidade de jogar a solo, simplesmente não era a mesma coisa. Seria um videojogo excelente mas não seria uma obra ao nível que é. Alguns dos melhores diálogos que vi serem interpretados nos últimos anos foram entre Arthur Morgan e um dos outros personagens do jogo, o progresso e desenvolvimento dele como pessoa, de Dutch van der Linde, Sadie Adler ou John Marston, são lições de character building e storytelling tal como as próprias missões que contam esta epopeia. Os níveis de escrita aqui são tão elevados que deviam ser ensinados como exemplos de “como fazer” nas escolas de guionistas e escritores. Isto para não falar das interpretações de voice acting, do desenho cuidado de todos os cenários e mais ínfimos pormenores das florestas e rios, povoamentos e cidades. Haveria tanto mais para dizer sobre um assunto mas este artigo já vai longo e quero acabá-lo com este ponto: 

Red Dead Redemption 2 é uma obra prima de entretenimento, é mais que um jogo. É uma obra de ficção que não lemos como um livro nem vemos como um filme, mas vivemos em todos os aspectos possíveis de interacção. O melhor jogo da década 2010 a 2020 é Breath of the Wild na minha opinião, mas a melhor obra de entretenimento é Red Dead Redemption 2

E se não existissem já razões suficientes para aderir ao Xbox Game Pass, Red Red Redemption 2 estará disponível no pacote a partir de 7 de Maio.