É com uma alteração à letra do primeiro single do álbum de estreia do avô do Metal, o Ozzy Osbourne, que começo a falar de um indie que me tem ocupado as tardes de jogo. É fácil admitir que sou fã de deck builders, paixão que começou nos jogos de tabuleiro com o pai de todos, o Dominion, e que se materializou na compra (auch, de dezenas) de outros jogos na década passada (e ainda anteontem recebi tudo o que existia do grande Hero Realms), mas desde que os videojogos “descobriram” o género e o trouxeram para águas videolúdicas que acabo por devorar tudo o que me chega às mãos.

SteamWorld Quest não é apenas o derradeiro deck builder em videojogo até hoje, como foi um dos melhores jogos do ano passado. Monster Train, que sai hoje no Steam, é um potencial melhor jogo do género neste ano de 2020. E não me critiquem por estar a dizê-lo já no final de Maio. Com um ano como 2020 nunca sabemos o que é que “final do ano” realmente representa.

Monster Train, desenvolvido pelo estúdio Shiny Shoe é um roguelike estratégico imbuído de deckbuilding. Por muito que a descrição soe a coisa estranha, a aplicação prática é bem simples. O jogo desenrola-se numa vista aérea onde vemos o nosso comboio a percorrer uns carris. A cada nova zona os carris bifurcam e temos de escolher se vamos para um lado ou outro. Para termos elementos com os quais possamos fazer uma decisão informada, conseguimos ver em cada carril que “eventos” é que vão acontecer. Estes eventos podem ir de mercadores, a ferreiros que fazem upgrade às nossas cartas, até baús com recompensas de dinheiro, runas ou novas cartas. Outras até permitem-nos limpar o baralho de algumas cartas menos interessantes.

Os elementos roguelike estão integrados na utilização de artefactos que vamos recebendo como loot no final das batalhas ou como recompensa de alguns eventos. São estes artefactos que vão se vão empilhando no nosso comboio, conferindo-lhe habilidades e capacidades passivas que nos ajudam na difícil tarefa de percorrer uma linha inteira, do início ao fim. 

Pelo meio, há eventos que vão fazendo disparar sequências narrativas ao estilo choose your own adventure que complementam uma superficial abordagem narrativa a um jogo que vive, e muito bem, convém dizê-lo, da qualidade do seu combate. 

O nosso comboio monstruoso – se me permitem a tradução não-literal – é o campo das batalhas. Ele tem no seu interior 4 andares, 3 deles de combate, onde podemos colocar unidades nossas, e a do topo, onde se encontra a “chama” que dá vida ao comboio, e se cujo HP chegar a 0 nos faz perder o jogo. 

Como em qualquer deck builder, em cada turno termos um número limitado de energia, neste caso chamas, que são usadas para baixar cartas, subtraindo desse número o valor de cada carta. As cartas podem ser unidades (que têm um número de pontos amarelos que representam o espaço que ocupam em cada piso), assim como itens e magias. Podemos invocar unidades em qualquer um dos 3 pisos de combate, mas temos que ter em mente que as unidades inimigas aparecem em combate no piso de baixo. 

Assim que gastamos todas as nossas chamas e carregamos no botão de final de turno o combate inicia-se de forma automática em todos os pisos, cumprindo todos os buffs, debuffs e habilidades passivas que os combatentes tenham. As unidades inimigas sobem um piso se sobreviverem ao combate e ainda tivermos lutadores do nosso lado. Se por acaso elas sobreviverem e derrotarem todas as unidades, sobem o piso, mas congelam o piso inferior, impedindo-nos de fazermos lá invocações, e garantindo que os inimigos começam o combate mais próximos da nossa chama principal, num piso superior.

É nesta gestão não só do posicionamento de unidades, entre as que ficam *a frente – leia-se, mais perto dos inimigos – assim como ir distribuindo invocações pelos diversos pisos, para irmos parando a ascensão até ao nosso core.

Com upgrades a cartas e ao nosso campeão (uma unidade especial mais fortes que outras), com um sistema de progressão de level up desse mesmo campeão e da nossa  “conta” persistente ao longo do jogo, há aqui conteúdo virtualmente infinito no desafio espantoso que é Monster Train.

A quantidade de cartas, essa, parece ser um dos frutos da sua longevidade, com cada campeão a ter dezenas de cartas para desbloquear e para construirmos, de forma optimizada, no duro desafio de atravessar a linha de comboio de uma ponta à outra, com muitas boss fights pelo meio.

Monster Train é uma brilhante utilização das mecânicas de deck building num excelente roguelike estratégico. Para quem gosta do género esta é uma compra obrigatória, com um modo multiplayer até 8 jogadores a justificar ainda mais a aposta num jogo tão brilhante quanto este.