Tinha Phoenix Point instalado no PC há algum tempo, não vou dizer meses mas não devia estar muito longe disso. Estava incluído no Xbox Game Pass e não só era um turn based strategy no estilo de Xcom como era feito por Julian Gollop, o game designer de UFO: Enemy Unknown, o jogo que deu luz a UFO: Terror from the Deep e consequentemente a série XCOM que é o padrão máximo deste estilo no mundo dos jogos.
Já andava de olho em Phoenix Point quando vi um anúncio online há alguns anos, na verdade o meu coração palpitou um bocadinho quando li o nome e pensei que era um jogo sobre Captain Power and the Soldiers of the Future, mas foi só uns segundos até me lembrar que o remake/reboot vai-se chamar Phoenix Rising e não era um jogo. É pena não ter um jogo em que oiça “Power On” mas pronto, temos Phoenix Point que é uma maravilha.
Não começa uma maravilha, mas a certa altura faz um click tão limpo como um clip a entrar numa arma num filme de acção, e a partir daí é só disparar quase sem falhar.
Quase sem falhar porque obviamente não é um jogo perfeito. Mas é melhor fazer aqui um ponto de situação que explica o jogo, as suas diferenças, pontos altos e baixos. À primeira vista podemos considerar que Phoenix Point é uma cópia de XCOM, mas isso não seria justo porque este é criado pelo designer do jogo original dos anos 1990, no máximo podemos chamar-lhes evoluções distintas da mesma raça, tipo um tigre e um leão, ou um cão e um lobo, lá no passado distante têm a mesma origem e evoluíram de forma semelhante mas também diferente, sendo que um é mais próximo do original.
Quando a Firaxis pegou na chancela UFO/XCOM fez-lhe uma revisão, retirou algumas coisas e modernizou-o, tornou-o mais “aerodinâmico” contando com pontos chave e missões cruciais mas também contando com uma dose qb de acção e até eventos aleatórios. Acima de tudo pegaram num estilo parado e tornaram-no emocionante recorrendo a algumas cenas de acção nas jogadas.
O que foi feito em Phoenix Point por Julian Gollop e a Snapshot Games foi uma desconstrução da fórmula da Firaxis que se aproxima mais do original mas contando com bons factores do jogo moderno.
Em Phoenix Point aconteceu uma pandemia que transformou parte da humanidade híbridos marítimos como caranguejos mutantes. A sociedade colapsou tal como Phoenix Point, a agência nas sombras que protegia a humanidade. A nossa função é fazer a Fénix renascer, e conseguir gerir as três facções que emergiram dos escombros: Synedrion, que são ecologistas extremistas tecnologicamente avançados; Disciples of Anu, um culto religioso que acredita que o futuro está em aceitar híbridos humanos e New Jericho, uma sociedade militarista controlada por um milionário com complexos de grandeza.
Aqui está a primeira diferença de Phoenix Point, a gestão diplomática com estas três facções que podem ser aliados, parceiros comerciais ou até inimigos em algumas missões. Esta gestão mais minuciosa de o que fazer, quando e como é das primeiras desconstruções que Phoenix Point tem. Havendo só 3 possíveis financiadores/aliados é muito mais fácil pisar os calos de toda a gente com consequências graves, enquanto em XCOM, perder uma ou outra nação faz alguma diferença nos apoios, aqui não gerir bem a parte diplomática e de gestão de recursos no mundo pode ser muito grave. Outra diferença no “overworld” é que não há a pressão de fazer missão A em detrimento da missão B e C, ao ver as possibilidades no mapa estão todas em aberto e ficam até decidirmos fazê-la. A pressão não é de tempo, mas de como namorar com três colegas ao mesmo tempo, sem que elas saibam umas das outras enquanto elas se tentam ter a mesma promoção e estragar as possibilidades umas às outras com a nossa ajuda… Simples? Não mas é muito desafiante. É como fazer malabarismo com frascos de nitroglicerina, e se correr mal temos que lutar não só com os invasores parasitas/aliens mas também com um, dois ou até três grupos de humanos.
Há mais alterações pequenas que fazem grandes diferenças na jogabilidade. Duas são gimmicks interessantes e a terceira é quase imperceptível mas com bastante peso na estratégia se pensarmos nas suas ramificações e o que isso implica. O primeiro gimmick é fácil de explicar, especialmente para quem está habituado a este estilo de jogos, seja o original, os XCOM modernos ou até o mais recente Gears Tactics. Se perguntarem a qualquer jogador qual é a coisa mais frustrante numa missão e 99% vai dar a resposta que é quando o soldado tem uma percentagem de 99% para acertar no alvo e mesmo assim falha. Todos nós passámos por isso e todos nós pensámos mais que uma vez, que se fosse um tiro manual não iríamos falhar.
Pois é, em Phoenix Point podemos tentar ser nós próprios a disparar controlando exactamente onde acertar no inimigo. No final das contas continua a funcionar com as leis de percentagem e probabilidade mas deixa-nos escolher onde exactamente queremos atingir o inimigo. Na cabeça para um tiro mais letal, nos pernas para reduzir o seu movimento ou na arma para incapacitar os seus ataques? Este segundo gimmick é das adições mais refrescantes ao jogo porque afecta todas as peças no “tabuleiro” os nossos soldados também são atingidos nos braços reduzindo a sua mobilidade, nos braços influenciando negativamente a estabilidade dos seus tiros. E ao contrário de Gears Tactics, nem o overwatch é OP nem há heróis. Todos os soldados são imprescindíveis e ao mesmo tempo dispensáveis.
O que me fez passar de gostar de Phoenix Point para estar a adorar jogá-lo foram os pequenos detalhes, mas nenhum me agradou tanto como a desconstrução que Julian Gollop fez das classes de soldados e a sua evolução neste jogo. Estamos habituados às evoluções e tech trees dos outros jogos, a de Phoenix Point aparenta ser mais simples. Há 3 classes de soldado Assault, Sniper, Heavy. E é isso. Conforme vão fazendo level up vamos podendo dar novos atributos aos soldados e quando chegamos ao nível 4 podemos adicionar uma das outras classes, algo que me pareceu inútil de início. Porque não ramificar para especializações tal como nos outros? E de repente fez-se luz na minha cabeça. Eu teria liberdade de modelar os meus soldados sem “rótulos”. Quero manter um Sniper puro até ao nível máximo, posso fazê-lo. Mas também posso brincar aos deuses militares. Porque não ter um Sniper com as capacidades de movimentação de um Assault? Ou um Assault com capacidades defensivas e de carga de um Heavy? Ou um Heavy com extras de precisão de Sniper? Isto é só o princípio porque as ramificações são tão ilimitadas como a nossa imaginação.
Phoenix Point vive de detalhes, pormenores, enquanto XCOM se move em blocos enormes, Phoenix Point é feito de pequenas peças. Xcom, é um smartwatch, Phoenix Point é um relógio suíço. Se XCOM pode ser considerado a evolução directa de UFO: Enemy Unknown, Phoenix Point é filho de Terror from the Deep e é muito recomendado.