Quando vemos um jogo ser lançado em 3 gerações seguidas isso pode querer dizer uma de duas coisas: que o jogo é tão bom que há uma vontade de jogar versões actualizadas desse título ao longo de anos, ou que os seus criadores acreditam que a sua obra pode chegar a novos públicos, e alargar o espectro de influência da sua criação. No caso de Xenoblade Chronicles as duas razões são verdadeiras. E até podemos meter uma terceira razão: a consciência que estes lançamentos sucessivos significam muito dinheiro de encaixe para a Nintendo. Ou acham que não?
Lançado como uma das melodias que compuseram o canto do cisne da Wii, Xenoblade Chronicles chegou no crepúsculo da geração e definiu-se como um dos títulos obrigatórios da consola da Nintendo, e um dos melhores action JRPGs da sua época.
A história desta que é uma das grandes jóias da coroa do estúdio japonês Monolith Soft é curiosa. Um jogo que começou circunscrito ao Japão, e que começou a receber tanto feedback dos jogadores ocidentais que a Nintendo acabaria por localizá-lo em inglês (abrindo a porta à tradução e lançamento ocidentais de outras duas maravilhas japonesas da altura).
Da minha parte lembro-me bem como foi este contacto, e que partiu de um amigo, o maior early adopter da Wii do meu círculo relacional. Maravilhado com aquele JRPG peculiar, onde todo o jogo se passava num cenário sui generis: o corpo petrificado de duas entidades divinas titânicas que ficaram presos para a eternidade enquanto se digladiavam.
A ideia de que aqueles belos cenários eram na realidade partes do corpo colossal de dois deuses era só por si argumento para vender Xenoblade Chronicles. O outro aspecto era o facto simples de que Xenoblade Chronicles empurrava tecnologicamente a Wii para fora dos seus limites, tornando-se um dos jogos mais deslumbrantes da consola.
No início do jogo vemos os acontecimentos que antecedem a entrada em cena de Shulk, o protagonista, que até ganhou um carinho especial como parte integrante de Super Smash bros, tal é a sua importância no mundo nintendista de videojogos. A invasão da raça Mechons contra os Homs (versão curta de Humanidade), e as baixas de guerra que aqueles têm provocado às formas de vida orgânicas, eternizando a luta das duas entidades que lhes dão origem e habitat: Bionis e Mechonis.
Se o visual e as ideias criativas eram suficientes para cativar qualquer um, acabou mesmo por ser o seu world-building, a qualidade do seu enredo e dos seus personagens que marcam Xenoblade Chronicles ainda hoje como um dos grandes jogos do género, e um dos seus maiores sucessos críticos e comerciais da última década. São entre 60 a 100 horas de conteúdo onde o mundo de Xenoblade Chronicles se vai abrindo e revelando a luta dos dois titãs que são literalmente o mundo jogável e explorável.
O sistema de combate não é difícil, ainda que para os combates mais desafiantes, como o dos bosses, é preciso uma masterização dos combos de forma a tentar tirar o máximo de proveito dos ataques de cada membro da party.
Xenoblade Chronicles é também um filho dos seus tempos, e o seu desenvolvimento aconteceu a meio do apogeu dos MMORPGs, e isso sente-se no seu ADN criativo. Apesar de ser um jogo totalmente single player, há muitos elementos que são de óbvia influência dos massive multiplayer games. A “semi” abertura do mundo, o desafio dos combates mais complicados e de um sistema de combate de party emulando a lógica multijogador, para além do quest system que pouco mais é que fetch quests clichés dos MMOs. Tudo isto são elementos que não mancham Xenoblade Chronicles, mas que temos de observar sob o prisma do contexto temporal do seu lançamento.
Anos mais tarde do seu lançamento original, seria a New 3DS a receber uma versão melhorada, que, olhando em retrospectiva, acabava por não fazer jus a Xenoblade Chronicles. O contexto da escolha era simples: Xenoblade Chronicles era o porta-estandarte e um dos poucos títulos exclusivos da New 3DS que não corriam na 3DS normal, e funcionava assim como justificação para a adopção do novo modelo da (então) portátil da Nintendo. Mas o seu ambiente natural seria a Wii U, não fosse esta o buraco comercial que sabemos.
O lançamento de Xenoblade Chronicles: Definitive Edition para Switch parece a solução acertada, e a mais lógica para um relançamento da magnum opus da Monolith Soft, ainda que seja um terceiro lançamento. É aqui que a tecnologia da híbrida da Nintendo permite unir os pontos entre uma visão criativa surpreendente para 2009, e trazê-la actualizada para a actualidade. Com a adição de texturas e efeitos que evoluem o deslumbre visual original de Xenoblade Chronicles, e que é apenas “desviado” pela rigidez das animações e do lip sync.
Mecanicamente há aqui conteúdo para veteranos da série, nomeadamente a inclusão de um Expert Mode, onde podemos guardar o XP e distribui-lo manualmente, para além de um redesenho do sistema de tracking das quests que torna o seu seguimento algo mais eficaz.
É para os veteranos da série, mas não só, que Xenoblade Chronicles: Definitive Edition inclui um epílogo, intitulado Xenoblade Chronicles: Future Connected. Quem já jogou o jogo pode mergulhar directamente neste novo modo e conhecer o que acontece após os eventos do final do jogo.
Esta criação de um modo de post-game é quase como uma prova de carinho da Monolith Soft aos milhares (milhões?) de fãs de Xenoblade pelo mundo todo. Esta versão não é apenas um remastered, é sobretudo uma versão obrigatória para quem nunca se aventurou por terras de Bionis e Mechonis, mas também para quem já empunhou a Monado ao longo de dezenas de horas.
Xenoblade Chronicles: Definitive Edition é uma adição obrigatória ao catálogo da Switch de qualquer fã de JRPGs. É a versão definitiva de um dos jogos mais emblemáticos do género e aquele que conseguiu, dentro das limitações originais, cumprir com a potencialidade de um título brilhante e intemporal.