Já alguma vez tiveram pesadelos recorrentes? Às vezes durante noites seguidas, outras vezes separados por dias ou até meses, mas sempre o mesmo pesadelo, sempre as mesmas personagens, com as mesmas acções, nos mesmos lugares? Daqueles em que não se conseguem mexer na cama e estão ali deitados com os olhos semi-abertos, a tentar acordar e gritar mas não conseguem, como se uma força sobrenatural vos estivesse a pressionar para entrarem de volta no sonho? Jogar Infliction: Extended Cut é mais ou menos isso.
Durante vários anos tive um pesadelo recorrente: começava num hospital em que ia visitar alguém, a certa altura porque não encontrava quem eu procurava mandavam-me para uma ala específica e quando lá chegava deixava de ver pessoas. Tudo se tornava mais velho, como se aquela parte não fosse utilizada desde o início do século XX, mas tudo limpo. Só velho. E andava às voltas e voltas sem conseguir sair de lá, sempre com a sensação de me estarem a perseguir, até que caia, talvez de exaustão ou não. Sentia alguém arrastar-me, e levar-me para fora dali, para uma cave, onde me prendiam a uma mesa vertical e via na porta a figura que me perseguia e atormentava, uma rapariga com cerca de metro e meio, como uma daquelas bonecas de porcelana com totós e um vestido cheio de folhos mas sem rosto. Mesmo quando a luz incidia na cara dela, não tinha olhos, nem nariz, nem boca. E ela começava o trabalho dela. Partia-me as pernas com cano, espetava-me bisturis nas mãos, queimava outras zonas com ferros em brasa. E eu, tentava acordar, às vezes conseguia logo, outras tinha que resistir à tortura durante o que pareciam dias. Acordava aos gritos, suado, a tremer e raramente dormia outra vez nessa noite, mesmo adulto a viver sozinho, acendia a luz e ficava à espera da manhã.
Agora que estão a pensar “Mas que grande cagão! Com medo de uma boneca” posso continuar com a minha visão sobre Infliction: Extended Cut. Esta aventura de horror em primeira pessoa é precisamente como um pesadelo recorrente. Uma espécie de “Groundhog Day” + “Nightmare in Elm Street” em que controlamos um homem, que vai a caminho de casa para ir buscar uns bilhetes de avião. Está escuro, noite, temos uma lanterna porque a maior parte das luzes da casa não ligam mas por alguma razão rádios, TV e computadores sim. E algo acontece. Tudo piora e morremos. É isso mesmo. Morremos. E acordamos em casa outra vez.
A situação é quase sempre a mesma. Mas sempre com algumas diferenças, sempre para pior. Andamos pela casa, vamos investigando tudo o que conseguimos para perceber a história, e o que se passou ali. Porque razão morremos e voltamos à mesma noite e porque há um espírito de vingança atrás de nós.
Não posso entrar muito em pormenores dos caminhos que se abrem Infliction: Extended Cut porque mais de metade do interesse do jogo está aí, da mesma maneira que não teria piada nenhuma recomendar-vos um filme de horror e ao mesmo tempo contar-vos onde são as cenas mais assustadoras ao pormenor. Posso sim dizer que a combinação de enredo com o ambiente claustrofóbico são excelentes e muitas vezes, especialmente porque jogava muito tarde quando toda a gente em casa já estava a dormir, com os headphones nos ouvidos, vi-me obrigado a gravar e parar até ao dia seguinte quando a luz do sol me dava uma sensação de falsa segurança necessária para continuar.
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