Já alguma vez tiveram pesadelos recorrentes? Às vezes durante noites seguidas, outras vezes separados por dias ou até meses, mas sempre o mesmo pesadelo, sempre as mesmas personagens, com as mesmas acções, nos mesmos lugares? Daqueles em que não se conseguem mexer na cama e estão ali deitados com os olhos semi-abertos, a tentar acordar e gritar mas não conseguem, como se uma força sobrenatural vos estivesse a pressionar para entrarem de volta no sonho? Jogar Infliction: Extended Cut é mais ou menos isso.

The power of Christ compels you!

Durante vários anos tive um pesadelo recorrente: começava num hospital em que ia visitar alguém, a certa altura porque não encontrava quem eu procurava mandavam-me para uma ala específica e quando lá chegava deixava de ver pessoas. Tudo se tornava mais velho, como se aquela parte não fosse utilizada desde o início do século XX, mas tudo limpo. Só velho. E andava às voltas e voltas sem conseguir sair de lá, sempre com a sensação de me estarem a perseguir, até que caia, talvez de exaustão ou não. Sentia alguém arrastar-me, e levar-me para fora dali, para uma cave, onde me prendiam a uma mesa vertical e via na porta a figura que me perseguia e atormentava, uma rapariga com cerca de metro e meio, como uma daquelas bonecas de porcelana com totós e um vestido cheio de folhos mas sem rosto. Mesmo quando a luz incidia na cara dela, não tinha olhos, nem nariz, nem boca. E ela começava o trabalho dela. Partia-me as pernas com cano, espetava-me bisturis nas mãos, queimava outras zonas com ferros em brasa. E eu, tentava acordar, às vezes conseguia logo, outras tinha que resistir à tortura durante o que pareciam dias. Acordava aos gritos, suado, a tremer e raramente dormia outra vez nessa noite, mesmo adulto a viver sozinho, acendia a luz e ficava à espera da manhã.

Exorcizamus te, omnis immundus spiritus, omnis satanica potestas, omnis incursio infernalis adversarii, omnis legio, omnis congregatio et secta diabolica, ergo draco maledicte, ut ecclesiam tuam secura, tibi facias libertate servire, te rogamus, adiós bitch!

Agora que estão a pensar “Mas que grande cagão! Com medo de uma boneca” posso continuar com a minha visão sobre Infliction: Extended Cut. Esta aventura de horror em primeira pessoa é precisamente como um pesadelo recorrente. Uma espécie de “Groundhog Day” + “Nightmare in Elm Street” em que controlamos um homem, que vai a caminho de casa para ir buscar uns bilhetes de avião. Está escuro, noite, temos uma lanterna porque a maior parte das luzes da casa não ligam mas por alguma razão rádios, TV e computadores sim. E algo acontece. Tudo piora e morremos. É isso mesmo. Morremos. E acordamos em casa outra vez.

A situação é quase sempre a mesma. Mas sempre com algumas diferenças, sempre para pior. Andamos pela casa, vamos investigando tudo o que conseguimos para perceber a história, e o que se passou ali. Porque razão morremos e voltamos à mesma noite e porque há um espírito de vingança atrás de nós. 

Não posso entrar muito em pormenores dos caminhos que se abrem Infliction: Extended Cut porque mais de metade do interesse do jogo está aí, da mesma maneira que não teria piada nenhuma recomendar-vos um filme de horror e ao mesmo tempo contar-vos onde são as cenas mais assustadoras ao pormenor. Posso sim dizer que a combinação de enredo com o ambiente claustrofóbico são excelentes e muitas vezes, especialmente porque jogava muito tarde quando toda a gente em casa já estava a dormir, com os headphones nos ouvidos, vi-me obrigado a gravar e parar até ao dia seguinte quando a luz do sol me dava uma sensação de falsa segurança necessária para continuar.

Para acabar, aproveito para fazer um bocado de publicidade: 

Uns amigos estão a dar esta boneca. A filha deles não gosta de boneca. Diz que se ri muito e nunca fica onde a deixaram. Não usa pilhas. Quem quiser, é só deixar aí uma mensagem para vos dar a morada e depois é só ir buscar.