Ia perguntar se já ouviram falar de Shantae, mas a menos que tenham estado debaixo de uma pedra e tenham passado ao lado das ancas dançarinas pixelizadas desta heroína semi-génio, diria que seria uma pergunta desnecessária.
Se me permitem uma metáfora zóofila, há muito que me considero uma espécie de perdigueiro de metroidvanias, a utilizar o faro apurado para o género para perseguir títulos dos menos conhecido aos mais famosos. Diria que Shantae, desde que teve a sua estreia no Game Boy Colour, se enquadra no segundo grupo. Até porque não conheço numa série que tenha sido tão profícua no campo dos metroidvanias quanto esta.
Este que é o quinto título da série Shantae, foi originalmente lançado em Setembro passado como um dos primeiros jogos exclusivos do Apple Arcade, dividido em duas partes que foram lançadas num período de 6 meses. A versão que nos chegou ao PC, Switch, Xbox One e PS4 é uma edição completa, do princípio ao fim.
Se Shantae sempre contou com uma excelente direcção artística, típica das excelentes produções da WayForward, neste Shantae and the Seven Sirens o departamento visual foi mais longe, com a contratação do estúdio de animação Trigger. A introdução, os interlúdios e o final do jogo com sequências de animação vêm dar um brilho adicional a uma série que sempre se pautou por uma extrema coesão artística.
Neste quarto título vemos Shantae e a sua entourage a irem de férias para a Ilha do Paraíso, e a coisa rapidamente descambar. Se este pedaço de enredo vos faz lembrar alguns jogos de Mario, não se admirem, que a mim também aconteceu.
É claro que se isto fosse um cenário de férias então não teríamos gatilho para um metroidvania, e esta seria a versão Shantae daquele spinoff do Dead or Alive na praia. Mas não é. É claro que a coisa dá para o torto, e naquela que é a primeira vez que todas as meio-génios se encontram no mesmo lugar, todas desaparecem à excepção da nossa heroína.
É claro que isto vai ser o mote para a exploração típica de um metroidvania, desta vez alicerçado na mecânica de fusion-magic, em que as half-genies nos vão dar os poderes delas para que possamos ter acesso a novas áreas da Ilha do Paraíso.
Quando estamos muito habituados a um género é natural que acabemos por “ver” a sua linha condutora de forma mais evidente. Com tantos anos a jogar aventuras-gráficas e metroidvanias, muitas vezes sinto que os vou jogando a eito por serem utilizadas muitas das influências históricas do género.
Isso aconteceu com este Shantae and the Seven Sirens, tendo-o terminado em cerca de 5 horas. A cadeia de exploração-aquisição de novos poderes-expansão do mapa é interessante, mas pelo meio encontrei momentos que quebraram a cadência de algo que parecia tão bem interligado e conectado que me fez perder momentaneamente o entusiasmo.
Falo de momentos em que para a progressão efectiva temos de entrar numa sequência de troca de itens entre personagens de aldeias distantes, e que me fez sentir a obrigação de ter de conversar com toda a gente para ter um mínimo de dica sobre o que fazer e onde ir. No último terço do jogo há mais dois momentos semelhantes, um deles que nos coloca à procura de dois itens não marcados no mapa (sendo que por esta altura já tínhamos aberto o mapa quase todo) e que soou mais a busy chore do que a jogabilidade fluída.
Se isto manchou de alguma forma a experiência deste Shantae and the Seven Sirens? Não, de todo. A originalidade do level design e dos bloqueios típicos de metroidvania jogaram a favor não só com a aquisição de novas habilidades como com as boss fights com as titulares Sete Sereias. A inclusão de um sistema de cartas equipáveis que conferem poderes passivos a Shantae é outro dos elementos que nos obrigam a tentar derrotar todos os inimigos múltiplas vezes para obter as suas cartas.
O combate tem, como habitualmente na série, momentos de originalidade em que temos pequenos truques para tornar os confrontos mais fáceis, até com os monstros comuns que ocupam as plataformas.
Já as boss fights, apesar de originais, achei-as excessivamente fáceis. Tirando 1 dos combates em que demorei a perceber o padrão de ataque da Sereia (e outro onde foi o meu filho a envergonhar-me, ao olhar de soslaio para o ecrã e a dizer: “pai tens de fazer isto para a derrotar”, e estava certo), a facilidade das boss fights é diametralmente oposta a outro genial metroidvania que joguei este ano.
Com alguns coleccionáveis para encontrar pelo caminho e com a boa-disposição e humor típicos da série, Shantae and the Seven Sirens continua a ser um jogo obrigatório para todos os fãs de metroidvanias, e até para os restantes. Um jogo delicioso, desafiante sem ser frustrante, com momentos de originalidade, brilhante visualmente e que ainda nos vai fazer dar umas boas gargalhadas.