Há uma nova tendência na indústria dos videojogos na oferta de experiências calmas, sem qualquer violência, em que o jogador explora e constrói coisas, mas sem grandes objetivos a longo prazo. Sim, Animal Crossing é uma referência e o mais recente New Horizons é o jogo que vai ficar para sempre associado ao isolamento do coronavírus. Mas há outros títulos, oriundos de estúdios indie que merecem também alguma atenção.
Summer in Mara é o mais recente projeto da Chibig, um estúdio indie que se tem especializado nestas experiências chill, como foi o caso de Deiland. O novo título passou no teste do Kickstarter, recebendo o financiamento necessário da comunidade, e chega agora às lojas.
O estúdio refere-se a Summer in Mara como um título inspirado em jogos como The Legend of Zelda: The Wind Waker, sobretudo na componente de exploração do oceano a bordo de um pequeno barco, assim como a descoberta de novas ilhas. Mas pisca o olho a Stardew Valley no que toca às ferramentas de farming, e também a Animal Crossing no que diz respeito ao ambiente calmo geral.
E todo o pacote foi enfeitado com papel colorido inspirado nas obras do Studio Ghibli, no seu traço cel shading, mas também nos temas que acabam por dar nome ao jogo, aquelas aventuras passadas nos verões de criança que nunca iremos esquecer.
Summer in Mara tem uma história que dita o progresso da aventura, com diferentes personagens a oferecer quests, acesso a novos utensílios, construções, receitas e matérias-primas. Ou seja, é a história que vai ditando o acesso a novos locais, a descoberta das ferramentas, num progresso linear, ainda que com total liberdade de explorar Mara.
A história tem lugar no planeta Qü e Mara é o oceano que dá vida às ilhas espalhadas. O jogador encarna a jovem Koa, resgatada do mar em bebé, depois do naufrágio da sua embarcação por uma senhora chamada Yaya. Sem conhecer o mundo para além da sua ilha, a jovem cresce com muita curiosidade para conhecer o mundo e descobrir alguns segredos, algo que acaba por acontecer depois da sua tutora falecer e esta ficar pela sua conta.
Nesse sentido, ao mesmo tempo que tem de aprender novas formas de fazer crescer a sua ilha, plantando hortaliças, árvores, ou mesmo aprendendo a construir capoeiras para os pintinhos ou currais de porcos, a jovem tem de visitar outras ilhas para obter recursos.
Há uma ilha grande principal onde se concentram todas as personagens com quem interagimos, que nos pedem favores em cadeia em forma de quests, que passam por encontrar determinada fruta ou item, ou produzir um determinado prato. Ao mesmo tempo que são dadas as missões vão sendo desbloqueadas as respetivas receitas.
Infelizmente isso torna-se estupidamente repetitivo, sem qualquer desafio tirando encontrar a forma como desbloquear as receitas e encontrar os respetivos materiais ou ingredientes. Certas quests requerem um objeto ou ingrediente que até então nem sequer tínhamos ouvido falar e nem sabemos como encontrar. Terão de passar algumas horas adicionais até que eventualmente este apareça, muitas vezes até tropeçamos neles sem estarmos à espera.
Os utensílios, tais como o machado, martelo ou ancinho têm de ser melhorados para poder trabalhar em certos minérios, pedras ou terrenos. São várias dezenas de objetos que vão desbloquear e que podem ser vendidos ou consumidos, visto que a personagem necessita restabelecer a energia do sono ou saciar a sua fome. Além disso, o jogo utiliza um sistema de ciclos noite e dia. As lojas estão fechadas de noite e algumas personagens só podem ser encontradas a determinadas horas.
Por outro lado, nem todas as áreas do oceano estão acessíveis de início, sendo necessário melhorar o barco, mas mais uma vez, isso está encadeado na lista de missões que eventualmente irão receber.
Embora a sua estrutura seja agradável, as suas mecânicas não são muito profundas. Pescar é muito básico e a agricultura limita-se à pressão da tecla de ação para cavar. Mesmo pescar, que obriga a ter o isco certo para determinado peixe, resume-se a uma sequência de reflexos.
Passado algumas horas a andar de um lado para o outro, nota-se a repetição, sobretudo pela ausência de fast travels, com o jogo a obrigar a sair da ilha para ir à nossa só para ter acesso às ferramentas de cozinhar ou construção, para trazer de novo o objeto em questão.
O jogo tem alguns bugs e problemas de interface. Nem todos os botões do comando funcionam e mesmo as teclas no jogo estão mal atribuídas, como por exemplo mergulhar no fundo do mar. Apesar de colorido e com um tom infantil, ideal para os mais novos, as ilhas são bastante vazias e sem grande incentivo para regressar, a não ser que uma quest vos guie até lá.
De um modo geral, Summer in Mara tem boas ideais, mas quando se passam mais de 15 horas de um lado para o outro, como se fossemos uma rapariga de entregas, repetindo vezes sem conta os mesmos caminhos entramos em piloto automático. Todo o mundo em geral está bem construído, e isso incentiva à exploração, mas as ilhas parecem vazias. E é uma pena, porque visualmente o jogo é vibrante e as melodias colocam-nos a assobiar constantemente.
Estamos perante um título para quem quer passar horas de forma relaxada, sem pressa de fazer as coisas ou finalizar a aventura. Talvez o mesmo público de Animal Crossing, mas certamente não o de The Legend of Zelda.