Mario faz 35 anos este ano e não podemos negar o quão especial eleé no mundo do videojogos e da cultura pop no geral. Mario é uma figura tão entranhada nas fibras do mundo que mesmo quem não jogue sabe quem ele é, sabe reconhecer o som da moeda, ou mesmo as suas músicas mais características em qualquer estilo.
Mais ou menos de 5 em 5 anos é festejada mais meia ou uma década de Mario, lembro-me de estar no público da Fnac há 5 anos para o lançamento de Super Mario Maker e os 30 anos dele. E antes disso lembro-me de quase todos os lançamentos principais das várias séries de jogos que o canalizador da bigodaça teve. Dos platformers 2D aos 3D, os jogos de corridas e desporto, os RPG e até as experiências mais fora da caixa como o Paint. E podia ir à Wikipédia como qualquer escriba decente e fazer um quase copy paste exacto do que lá está, podia falar de vendas, de Shigeru Miyamoto, Yoichi Kotabe ou Koji Kondo e das suas influências em Mario e como Mario por sua vez estendeu a sua influência ao mundo dos jogos no seu todo mas não. Isso está mais que batido desde que se escrevia sobre videojogos em revistas e o online era um sonho distante. Prefiro, se não se importarem de vos contar a história de como uma criança chamada João cresceu acompanhado por e acompanhando um amigo virtual. Chamado Mario.
A minha história com Mario começou no verão de 1986. Os meus irmãos mais velhos tinham ido passar um verão a Boston para um casamento de um familiar. Como os nossos pais não podiam ir e eu era pequeno demais para ir sozinho com eles, fiquei em Lisboa, mas quando voltaram um deles falava de um jogo, um tal de Super Mario, e apesar de na altura já sabia o que eram computadores, tínhamos um Sharp MZ-700 e o nosso vizinho de cima tinha um Spectrum, aquilo de que ele falava era tão mágico mas ao mesmo tempo ficava um bocado…
Como é que um jogo podia “entrar” assim tão rápido? Sem “load”? Como é que podia ter tantas cores e tanta jogabilidade?
Foi algo que me atormentou uns tempos mas passou depois. Até 1988 que se não me falha a memória, foi o Natal em que apareceu a NES Super Set com 4 comandos e 3 jogos em Portugal e aí eu percebi o que era. Fez-se luz, era aquilo que ele tinha dito, era aquilo que ele tentava explicar.
A Nintendo não era barata, custava 40 contos, mas mesmo assim nesse Natal os nossos pais ofereceram-nos a consola e foi tão mágico como eu julgava que ia ser, algumas das minha recordações favoritas de infância são com o meu irmão a jogar Super Mario Bros. Ou melhor, a ver o meu irmão jogar Super Mario Bros. porque como irmão mais novo sofria da “Maldição de Luigi” e só pegava no jogo quando ele perdia. Infelizmente o meu irmão era daqueles gajos que conseguia dar pelo menos 3 voltas ao jogo completo sem perder, mesmo assim eram tempos bem divertidos.
Poucos anos mais tarde, já a entrar na preparatória quem é que também se deslocava mais? Quem estava portátil, apesar de a preto e verde? Mario em busca de 6 moedas douradas. Mario estava diferente, mais crescido tal como eu. Pouco depois mudámos de casa, não foi uma mudança drástica, a casa era maior e apesar de mais longe eu continuava no mesmo liceu. Mas Mario foi comigo, na NES e no Game Boy e olhando para trás foi daquelas coisas que ajudou a fechar o vazio e as alterações emocionais e físicas da adolescência. Foi companhia em muitas viagens de carro com o meu pai a conduzir e eu à noite a tentar encontrar luz de candeeiros para ver o que estava a fazer.
Quando em meados dos anos 1990 ia visitar a minha avó e a minha aos Estados Unidos, no andar de cima vivia um tio que tinha a mesma NES onde o meu irmão tinha jogado Mario anos antes (e uma coleção enorme de jogos que guardava para os netos quando o visitavam). Era ali que eu também encontrava uma familiaridade de uma cara conhecida, aos saltos em cima de cogumelos e na casa dos meus primos, tardes passadas no Mario Kart da SNES. Depois cresci e quando me estava a tornar um adulto legal, Mario também cresceu. Outra vez. Para 3D.
Super Mario 64 era algo fora do normal. Não existia nada assim, e apesar de na altura estar já um “homenzinho” ainda gostava, como ainda gosto, de “coisas infantis” e mais uma vez, com o meu irmão exploramos o jogo até à exaustão. Já na faculdade, muitos anos mais tarde, comprei a minha GameCube, e lembro-me como se fosse ontem. Estava no Carrefour de Telheiras (onde é o Continente agora) e estavam Bundles de GameCube com um jogo por €50. Isto era praí 2003 ou 2004 e a consola com um jogo por esse preço era um achado. Eu levei-a para a caixa e até perguntei ao rapaz se havia um erro, ele disse que não e eu comprei a do Bundle Mario Sunshine. Pouco depois de ter começado a trabalhar em 2005 das primeiras compras que fiz com o meu salário foi uma Nintendo DS Lite, com que jogo não perguntam vocês mas eu vou dizer à mesma? Super Mario 64 e depois New Super Mario Bros.
Em 2008 casei, comprei uma Wii e o Super Mario Galaxy. Mais uma vez uma fase nova da vida adulta, e mais uma vez Mario também a evoluir. O casamento não foi tão bom quanto Galaxy mas dificilmente algo é tão bom como Galaxy, e ao fim de uns anos aconteceu o inevitável divorcio. Mas não, sem antes ser lançada a Nintendo 3DS e com ela Super Mario 3D Land e uma estatueta de Mario que segurava a 3DS original. Não comprei o jogo ou a estátua mas sim ganhei-as num concurso de fotos 3D feito pela Nintendo, tendo ficado com uma das 5 melhores fotos do concurso. Tanto a Wii como a DS foram um refúgio nessa altura mais escura, um buraco onde me escondia do que não queria enfrentar. A Wii, a estátua, a 3DS e o jogo vieram comigo na fase complicada da separação e do divórcio, e mais uma vez, Mario estava lá, como um porto seguro que nos faz esquecer maus momentos.
Mas, maus momentos levam-nos aos bons, foi graças ao amor partilhado por Mario, coisas Nintendo e não só que conheci o Ricardo Correia e consequente através dele, a minha mulher que me acompanha e apoia hoje, a mãe da nossa filha. Filha esta que nasceu pouco antes do lançamento de Super Mario Odyssey e foi com ela nos braços que joguei muito dele enquanto a fazia adormecer pela madrugada fora. Mario estava mais uma vez numa fase nova da sua vida, do seu crescimento e eu também, mas desta vez sem negatividade e acompanhado por quem me ama e quem eu amo incondicionalmente.
Tem piada ver que tal como Mario me tem acompanhado na minha evolução como pessoa tendo estado em tantos momentos marcantes da minha vida de forma constante, vá acompanhar a da minha filha também, vejo isso quando ela agarra na mesma estátua que me chegou numa das piores alturas da minha vida e a vejo enfiar uma colher de iogurte pela boca e quando pergunto “O que estás a fazer ao Mario do pai?” ela responder “O Mario está com fome. O Mario não é do pai. É da Zelda, o Pai deu.”. Como contra factos não há argumentos, só me resta sorrir e saber sentir aquele calor virtual no peito que só Mario consegue dar ao ver que ela também tem um bocadinho de Rapariga-Ventoinha pelo Mario nela. Talvez seja genético, ou a miúda só tem bom gosto. Quem sabe… Sei que ainda não joga, conhece o Mario mas só daqui a um ano ou dois é que vamos introduzir os jogos gradualmente na vida dela. E vai começar com Mario, passando o testemunho para ela ser acompanhada no seu caminho.
É verdade que Mario é um ícone dos jogos, é uma figura da cultura popular, é um motor da progressão da indústria, mas também é mais que isso. Para mim, que partilhei grande parte das minhas 4 décadas de consciência com ele, e para tantos outros pelo mundo fora, ele é mais que isso. É um amigo virtual que até pode desaparecer durante anos mas de vez em quando, se for preciso ou só porque sim, pegamos no comando, ligamos a consola e somos uma criança ao lado dele outra vez…