Antes de mergulharmos, ou flutuarmos, em Airborne Kingdom, agradeçamos à Epic pelas constantes ofertas de cupões de 10 euros de oferta, que me têm garantido as únicas compras feitas na plataforma. Foi graças a mais esta generosa oferta que encontrei aquela que considero ser a surpresa de encerramento do pano – jogo que me surpreende mesmo quando o ano está a fechar portas. Falo, neste caso, de Airborne Kingdom, um original city builder.

A direcção de arte de Airborne Kingdom foi a minha conquista imediata com este jogo, que comprei se quer ter a mínima ideia da profundidade mecânica. Para além da cidade flutuante com uma belíssima arquitectura islâmica, é a forma como o estúdio The Wandering Band LLC decidiu representar o terreno, lá bem abaixo dos céus. Uma mistura de ladrilhos, azulejos e mosaicos islâmicos cujas sobreposições vão construindo os acidentes geográficos que compõem este mundo maravilhoso.

Do enredo pouco sabemos, para além de que existem 12 reinos espalhados por este continente. Doze reinos isolados entre si, que sonham que a profecia milenar de um reino alado que os una e lhes traga prosperidade. As semelhanças com a obra de Hayao Miyazaki são meramente conjunturais.

Airborne Kingdom não é o primeiro city-builder itinerante que já joguei. Jogos em que a nossa cidade está em movimento e onde a sobrevivência dos seus habitantes é um elemento reconhecível. O ano passado joguei (e adorei) Flotsam, um jogo onde tentava levar um grupo de pessoas a sobreviver num mundo submerso, numa estrutura que começa por ser uma jangada feita por um conjunto de lixo até se tornar uma sociedade semi-funcional.

Em Airborne Kingdom não estamos com esse peso apocalíptico em cima, e o pior que pode acontecer às pessoas se não conseguirmos suprir as suas necessidades é levá-las a enfurecerem-se connosco e abandonarem o nosso Reino Voador. Ou se ficarmos sem carvão para alimentar os rotores, de despenhar a cidade lá em baixo, nos azulejos islâmicos cuja estética e história nos parecem tão familiares, por razões óbvias. Com a gestão cuidada que fui fazendo dos recursos, apenas duas vezes senti que iria perder: uma em que estava numa zona com pouca água e onde as minhas estruturas não eram suficientes para “criar” água para toda a população, e ontem, antes de o terminar, que estive prestes a despenhar a cidade por não conseguir encontrar depósitos de carvão.

À excepção dessas situações é fácil ir gerindo os recursos. Para os apanhar, temos de construir hangares que possibilitem aos nossos cidadãos entrarem em pequenas avionetas e vão até ao solo recolher esses recursos. Um momento de brilhantismo estético e de design é o facto do número de recursos disponíveis junto a um dado nódulo estar impresso em tipografia nos ladrilhos. Um pormenor deslumbrante – de tantos que o jogo tem – e que me remete para tantas casas do nosso País, com aqueles algarismos a lembrarem a toponímia das nossas ruas sobre azulejo. 

O encontro com os 12 reinos vai-nos permitir diversos avanços. O primeiro, o da história, por nos colocar mais perto de completar a tapeçaria da união dos 12 reinos (e o nosso). O segundo porque é neste contacto que conseguimos comprar com relíquias as plantas de acesso a novas construções e edifícios. Plantas estas que ainda precisam de ser investigadas por nós, mas que ainda assim representam a diversidade mecânica deste jogo. 

As quests que temos de cumprir para que estes Reinos se aliem a nós vão dando alguns apontamentos do seu enredo, e obrigar-nos a explorar o mundo por completo. 

Com o palácio base como peça central, com um grande rotor no centro. Cada construção necessita de ser feita através da definição de caminhos. As construções diferem entre habitacionais, funcionais, serviços (e necessidades), para além de estruturas mecânicas para propulsão e sustentação aérea da cidade. O conforto da população é um elemento bem presente, e não se refere apenas à alimentação e água. A fé, a saúde, a beleza, são elementos fundamentais para manter a nossa população feliz. Perdemos habitantes é uma perda tremenda na nossa estrutura, já que sofremos baixas na nossa força de trabalho. Cada habitante é um trabalhador e é fulcral para a nossa prosperidade.

Há construções que desagradam aos habitantes se construídos perto das zonas habitacionais, especialmente aquelas que provocam poluição sonora ou aérea. Construir centrais de produção de carvão ou rotores perto de casas é suficiente para vermos habitantes a ficarem desagradáveis e a abandonarem o nosso Reino. A população é finita, não se multiplica, e conseguimos receber mais gente quando nos aliamos a Reinos ou quando encontramos pequenas povoações. Mas os habitantes das povoações isoladas só se juntam a nós se o contentamento com a nossa habitabilidade estiver em determinados patamares, e à medida que o jogo avança só níveis de excelência tornam a nossa cidade atractiva a novos habitantes.

Outro elemento interessante é o cuidado que temos de ter com a construção física do nosso Reino. A inclinação do Reino vai sendo afectada pela construção de novos elementos, e é necessário equilibrar todas as partes para que o reino não fique com um ângulo de inclinação. Este ângulo não só tem impacto na felicidade dos habitantes, mas também na velocidade de propulsão.

Apesar das ocasionais tensões, Airborne Kingdom é um jogo bastante relaxante. Passamos muito tempo a sobrevoar as paisagens cerâmicas deste mundo, a descobrir ruínas e segredos, e a pesquisar e melhorar os equipamentos e tecnologias da nossa cidade. 

Demorei dois dias a terminar Airborne Kingdom. Penso que tem a longevidade certa para um jogo com o loop mecânico relativamente limitado. Há elementos opcionais para encontrar e que nos permitem construir Maravilhas únicas a bordo da nossa cidade voadora, e um deserto vasto para explorar. Airborne Kingdom é sobretudo um jogo original para o género, com menos tensão que os seus congéneres, com um mundo único e deslumbrante. Com uma identidade artística tão única que é impossível não nos rendermos à sua beleza.