O Sporting vai conseguir segurar a vantagem e ser campeão? O juiz Ivo Rosa agiu bem ou mal na sexta-feira? Estaremos no caminho certo para manter os planos de vacinação? O populismo de direita é um risco real em Portugal ou uma moda fugaz? Estas poderiam ser as perguntas mais importante para a maioria das pessoas, sem saberem que na realidade, numa época em que tanto Harvest Moon como Story of Seasons foram lançados quase em simultâneo, a grande pergunta que fica é: mas afinal qual dos dois devo comprar?

Antes de vos dizer as razões do porquê, posso já responder de forma tácita à pergunta. Entre Harvest Moon: One World e Story of Season: Pioneers of Olive Town a escolha óbvia recai, mais uma vez, para o segundo. O velho despique entre os dois jogos demonstram mais uma vez que não chega para a Natsume de ter os direitos do nome: a equipa criativa, o talento e o verdadeiro espírito de Harvest Moon reside nos developers que criaram a série Story of Seasons, e isto sente-se ainda mais na actual comparação das duas iterações das duas séries.

Story of Season: Pioneers of Olive Town não é a melhor edição da série, e apenas chega perto da qualidade geral de Stardew Valley, o indie que acabou por pegar na inspiração em Harvest Moon e assumir-se ele mesmo como o padrão para todo o género. Mas comparando com o novo Harvest Moon é a escolha mais do que óbvia.

Mas comecemos pelos pontos negativos de ambos. One World tem um loop estranho e decisões de game design ainda mais bizarras em termos dos elementos mais simples em termos de farming RPGs. Sendo a energia e a exaustão um elemento base de todos os jogos do género, ainda hoje estou a pensar no que passou pela cabeça dos criadores da Natsume ao introduzirem perda de energia ao simples facto de andarmos. Uma ideia que faz pouco sentido, especialmente num jogo como One World onde o loop diário de acção nos obriga a correr como loucos pelo mundo para cumprir com outras más ideias trazidas para esta nova iteração. E sim, é possível cairmos para o lado de exaustão apenas a tentar chegar a casa para dormir.

Outras más decisões de One World passam pela gestão do nosso campo cultivável. Ao contrário de tantas outras iterações, não podemos simplesmente pegar na enxada e arar o terreno para ser cultivado. O solo arável está pré-disponibilizado com um conjunto de quadrados no solo, cujo número vai depender da zona onde montamos a nossa quinta.

“Montar a nossa quinta” não é um eufemismo: em One World temos a possibilidade de empacotar e desempacotar a nossa quinta e colocá-la noutro sítio pré-determinado, e é desta forma que o “avanço” do jogo ocorre. 

Num jogo onde o loop diário nos faz passar a grande maioria do tempo a correr de um lado para o outro à procura de recursos, uma da piores ideias de One World é o acesso a sementes. Relembramos que os lotes aráveis são reduzidos, mas ainda assim o acesso às sementes ou é muito caro na loja, ou fica atrás de outra ideia estapafúrdia que parece fazer sentido apenas na esfera teórica. 

As comparações são desnecessárias.

Pelo mapa vamos encontrar sprites diariamente, que ao contacto nos dão uma semente diferente. Como elas não estão identificadas, podemos pedir ao mapa para nos marcar o posicionamento de sprites que nos entreguem sementes específicas, mas vamos ter de esperar que em cada dia elas façam spawn aleatoriamente. E para as encontrar… temos de calcorrear o mapa todo, gastando energia e tempo.

Fazer dinheiro em One World é outro impedimento grave. Não basta o limite de solo arável, o preço de aquisição das sementes ou a forma estranha de as obter, como as quests normalmente requerem as poucas plantações que fazemos, deixando-nos poucos recursos disponíveis para vender.

Pioneers of Olive Town, apesar de ser um jogo onde eu já dediquei pelo menos 35 horas na última semana e meia, e onde já maximizei muitas das 12 skills do nosso personagem, tem alguns erros de game design que o impedem de ser melhor do que poderia ser.

O primeiro é a necessidade de colocar os sistemas de construção atrás de Makers, uns dispositivos que fazem o processamento de todos os recursos disponíveis noutros produtos. Mas estes Makers requerem muito espaço, são mais do que podemos contar (há um Maker para cada recurso do jogo, perto de vinte, entre fazedores de queijo, de perfumes, de sementes, madeira, pedra, etc). Por outro lado requerem muitos recursos para construir. Cada Maker só recebe um item de cada vez, o que nos obriga a ter múltiplos (até um máximo de 20) de cada para poder obter todos os produtos processados que necessitamos.

Cozinhar é outro processo que só permite um prato de cada vez e que faz o relógio avançar 30 minutos. E num mundo como o de Story of Seasons o tempo é de ouro, e é demasiado punitiva a acção de cozinhar. Os problemas técnicos (que os developers estão a tentar resolver) fazem o framerate cair abusivamente quando entramos numa zona de cultivo nossa.

Mas tirando estas falhas, Pioneers of Olive Town é em tudo superior a One World. A cidade e os seus habitantes são mais interessantes e mais memoráveis, assim como os nossos possíveis interesses românticos.

Há muitos lugares paralelos que vamos desbloqueando à medida que avançamos no jogo, com mini-jogos e com sistemas de recursos que nos permitem encontrar zonas para fazer grind de minérios, ou zonas de cultivos com as estações do ano “bloqueadas”. 

Os eventos cíclicos e as pseudo-quests que fazem o jogo avançar num sistema simples de painel de pedidos não se tornam excessivamente intrusivos para conseguirmos gerir a nossa quinta (ou quintas) enquanto o dia dura.

O mundo de Story of Seasons é bem mais pequeno que o de One World, e se inicialmente pensei que isso era uma falha para o jogo da Marvelous, depois de lá passar quase quarenta horas percebi que joga a seu favor. Há tanto, mas tanto para fazer, que um mundo maior iria apenas dispersar-nos a atenção e fazer-nos perder tempo.

As semelhanças de Pioneers of Olive Town com Animal Crossing são também notórias. O museu vai sendo alimentado com peixes, animais (que fotografamos) e tesouros que encontramos nas nossas deambulações. 

Em todos os mecanismos habituais de farming RPGs, Story of Seasons é melhor. Entre as habilidades de agricultura, mineração, pesca, pecuária e mesmo o acto de lenhar, estão todos mecanicamente mais interessantes que One World. Este tem, porém, uma excelente ideia, perdida num jogo medíocre: a possibilidade de começarmos a fazer fusões de vegetais (e flores) para criar novas espécies. 

Para finalizar, a direcção artística. Onde Story of Seasons continua com o seu mundo característico, com os animais visualmente identificativos, e uma estética sólida, One World continua no seu mundo estéril, que apesar de termos muito por onde vaguear, tudo soa vazio e desinteressante.

Os fãs de farming RPGs podem ter muitas dúvidas pela frente ao ver estes dois títulos chegarem quase em simultâneo à Switch, mas as dúvidas facilmente se dissipam. Story of Season: Pioneers of Olive Town pode não ser a melhor iteração da série – e não é – mas continua a ser um excelente título, onde os criadores do género continuam a explorar novas formas de manter o loop mecânico interessante, complexificando-o de uma forma que parece assustadora à primeira vista. 

Mas ainda assim, Story of Season: Pioneers of Olive Town tem-me preenchido de forma casual dezenas de horas de jogo, muitas vezes a ver televisão, relaxadamente no sofá. É a opção inquestionável de compra para os fãs do género, e o claro vencedor na disputa com o seu rival. E que prova que certamente o nome Harvest moon neste momento tem apenas o apelo da memória histórica.