Caçada Semanal #269

Se Donald X. Vaccarino soubesse que o seu êxito de 2009, Dominion, viria não só a criar uma tendência nos jogos de tabuleiro, mas também no dos videojogos, ficaria certamente orgulhoso.

Slay the Spire e Steamworld Quest continuam a ser para mim os melhores cruzamentos de videogo e deckbuilders, mas a cada mês chegam novas e interessantes propostas em torno deste género. Os 2 indies desta caçada são dois dos melhores exemplos.

Fights in Tight Spaces [Xbox One, PC, Xbox Series]

Com a abordagem visualmente depurada que Superhot nos trouxe para os FPS cruzados com puzzle game, Fights in Tight Spaces, lançado em Early Access pelo estúdio Ground Shatter vem trazer uma tónica similar mas adaptada aos deck-builders.

Este roguelite deck-builder coloca-nos no fato de um agente secreto expert em artes marciais, obrigando-nos a gerir o nosso baralho, a nossa mão, mas sobretudo o posicionamento espacial dos inimigos.

Algo interessante nos espaços apertados que representam cada combate, espaços esses que se tornam ainda mais claustrofóbicos tendo em conta o número de inimigos que nos rodeiam. O que Fights in Tight Spaces tem de diferente é que as nossas cartas/ataques influenciam o posicionamento dos inimigos, e podemos empurrá-los, puxá-los, ou colocá-los em quadrículas que os obriguem a atacar os seus próprios aliados.

Os ataques mudam quase sempre o local onde terminamos a acção, o que nos obriga a gerir toda a sequência do nosso turno de forma meticulosa. Há uma excelente representação das coreografias dos filmes de acção com este jogo, que vê na sequência das cartas jogadas este bailado de pancadaria a aparecer.

A complexidade das cartas vai sendo crescente e vamos encontrar alguns ataques que necessitam de condições para ser executadas como paredes atrás de inimigos ou contra-ataques. 

Cada missão termina com uma desafiante boss fight que põe à prova a nossa estratégia e utilização do nosso baralho. Tornando também estes combates em momentos de quase puzzle que temos de resolver. Onde vamos tendo a possibilidade de ir trocando e desbloqueando cartas para futuras runs.

Fights in Tights Spaces está em Early Access mas é um jogo brilhante, desafiante e profundamente original. Obrigatório para todos os fãs de deck-builders, mas também de tactical strategy.

Tainted Grail: Conquest [PC]

Como fã de jogos de tabuleiro, é interessante ver algumas adaptações a videojogo não serem apenas uma tradução directa, mas um repensar os elementos interessantes físicos e como podem ser adaptados para um objecto único em digital.

Tainted Grail: Conquest é assim uma sequela em videojogo de Tainted Grail: Fall of Avalon, e é um jogo terrivelmente difícil que nos vai obrigar a muitas mortes, mas onde vamos começando a dominar o quão profundas são as suas mecânicas.

Vejamos o caso das nossas cartas. O habitual de muitos destes jogos é que as acções sejam relativamente directas, com efeitos passivos ou recorrentes que conseguimos explicar de forma fácil. Em Tainted Grail: Conquest desde as primeiras cartas que temos no baralho adicional que vemos interacções entre as nossas cartas e as características passivas (e activas) dos nossos inimigos que tornam o combate muito mais denso do que os deck-builders habituais.

Mecanicamente há outro ponto interessante: a capacidade de termos classes associadas ao nosso personagem que têm mecânicas e habilidades passivas (e ultimate abilities) distintas que nos obriguem a mudar o nosso mindset perante cada run.

Com uma ligação narrativa curiosa, o jogo desde cedo nos explica que a ilha de Avalon onde habitamos está assolada por uma maldição chamada Wyrdness. Esta maldição não é apenas narrativa, é também ela quem nos vai adicionando cartas negativas ao deck que nos prejudicam nas acções, e nos obrigam a sacrificar os poucos pontos de acção em cada turno, que são apenas três, a tentarmos ver-nos livres delas.

Em cima de cada inimigo aparecem ícones que nos avisam quais são as suas intenções no próximo turno, e é fácil perceber que dada a dificuldade de sobrevivermos a estes embates, que curar e defender devem ser usados quase sempre que possível. 

A direcção artística de Tainted Grail: Conquest é ajustada dado o tom sombrio do jogo, conferindo-lhe uma aura negra que ressoa com a narrativa e com o nosso ciclo de limbo em torno da Morte.

Também ainda em Early Access, Tainted Grail: Conquest pode não ser um jogo acessível a todos mas é definitivamente um dos mais complexos – se não o mais complexo e profundo – deck-builder que já joguei.