O amor é possivelmente uma das forças mais difíceis de medir que conhecemos. É arrebatador, e tanto nos consegue elevar a um estado de espírito sobre-humano como derrear-nos às profundidades da tristeza, um lugar negro onde a tristeza reina sem qualquer esperança no horizonte.

Todas as histórias de amor que correram mal foram um dia história de felicidade. Todos os divórcios e separações foram durante algum tempo relações de alegria. Muitas das relações amorosas que existem nos dias de hoje serão, num futuro próximo ou longínquo, terminadas. Por força de afastamentos, traições ou morte.

LOVE – A Puzzle Box Filled with Stories tenta encapsular a rede intrincada de relações amorosas num dos puzzles mais inteligentes e profundos que já joguei.

Este jogo passa-se num bloco de apartamentos transformado numa espécie de cubo de Rubik onde rodamos os pisos para ter vislumbres entre o presente e o passado. Interagimos com alguns elementos para conseguir estabelecer, num álbum de fotografias, o passado e o presente de cada relação, desbloqueada em forma de fotografias que congelam no tempo momentos específicos daquelas histórias de amor.

Os mistérios aqui são o porquê de vermos uma vizinha de meia idade triste, à janela, e outra que olha para um berço vazio. Sem qualquer texto, é nesta resolução dos puzzles com rotações dos pisos deste bloco de apartamentos que vamos desvendando estas histórias.

Uma das histórias mais marcantes é a de um casal de punks que vemos felizes no passado, mas no presente vê-los separados, e tristes. No passado, se rodarmos o rés-do-chão num sentido, podemos ver o jardim pelo ponto de vista da câmara, e vemos que ele a trai com outra vizinha. Essa traição foi suficiente para ditar o futuro de ambos, e para que fiquem, para lá da meia idade, completamente sozinhos. 

Estas histórias fazem-me lembrar a que vivi, em segunda mão. Sou oriundo de um bairro lisboeta, que apesar de ser relativamente recente (comparado com os bairros históricos) ainda é um daqueles em que toda a gente se conhece. Se eu for a uma mercearia ou a uma farmácia, as pessoas que lá trabalham sabem o meu nome apesar de não viver lá há 11 anos. 

Na geração dos meus tios e do meu pai – aqueles que ou foram para lá morar em pequenos ou que já lá nasceram – muitas destas histórias de namoros e casamentos de gente que se conhece desde sempre é frequente. O meu pai, por exemplo, é padrinho de baptismo de uma criança que é filha do seu antigo vizinho do 1º andar com a vizinha do 3º. Há décadas que se divorciaram, mas seria possível traçar estas histórias de amores encontrados e não correspondidos como em LOVE – A Puzzle Box Filled with Stories no mundo real. E eu sei-o porque a minha própria existência é uma consequência de uma história semelhante.

As histórias que desbloqueamos em LOVE – A Puzzle Box Filled with Stories com puzzles de interacções simples mas que requerem algum raciocínio. O desafio de entendermos e de descortinarmos os pontos de origem e de final de cada uma daquelas histórias e a partir daí extrapolar e quebrar o mistério mundano do que correu mal, ou bem, no meio, é a tónica deste jogo.

LOVE – A Puzzle Box Filled with Stories apanhou-me de surpresa pela sua depuração visual com alta complexidade narrativa sem ter de expressar uma única palavra. São assim as histórias mais marcantes: aquelas que são universais, intemporais, e tangíveis na sua simplicidade.

É dessas histórias que este cubo mágico entre o passado e o presente está presente. Sempre que uma persiana se abre para vermos o que está lá dentro, conseguimos tocar noutra dimensão, noutra história de amor que podemos cristalizar no tempo.