Caçada Semanal #273

Nos primórdios da produção de conteúdos eu fui um grande seguidor de Doug Walker e da sua produtora de conteúdos. A tagline do seu personagem Nostalgic Critic volta e meia vem-me à memória “I remember it so you don’t have to” porque por vezes me parece que deveria aplicar isto ao que fazemos com muitos jogos que recebemos. Foi um pouco nesse sentido que o Isaque Sanches criou a rubrica A Hora do Meh que mantemos até hoje. Jogamos e falamos de jogos para que quem nos lê não tenha de gastar dinheiro neles nem jogá-los.

Os três jogos desta semana não cabiam numa A Hora do Meh porque não são jogos inócuos. São mesmo desilusões, daqueles títulos que poderiam ser bem melhores do que são.

The Magnificent Truffle Pigs [PC]

Ter a AMC games a anunciar um novo jogo do novo estúdio de Andrew Crawshaw, criador de Everybody’s Gone to the Rapture é uma boa chamada de atenção para um jogo, ainda que o título ressoe como algo… bizarro?

The Magnificent Truffle Pigs é um narrativo game com um twist mecânico da utilização de um detector de metais. O cenário é o dos prados verdejantes da província inglesa, onde controlamos o solitário Adam que recebe um telefonema da sua ex-namorada, Beth, para que ele encontre um brinco perdido na quinta do seu pai.

De detector de metais em punho lá vamos nós desenterrar o passado na forma de pequenos pedaços e objectos de metal que vamos encontrando. Cada um deles é uma forma de desbloquearmos conversa com Beth. Porque ao contrário do que possamos imaginar, Adam é apenas um pano de fundo no verdadeiro foco deste The Magnificent Truffle Pigs: o passado, a vida e os sentimentos de Beth. Assim como o seu passado.

A utilização do detector de metais é sobretudo um fait divers que nos mantém entretidos enquanto a narrativa avança.

O problema mais grave de um narrative game é quando o seu enredo não é cativante ou interessante o suficiente para nos manter mergulhados na sua exploração e diálogos. Um pecado criativo que este The Magnificent Truffle Pig, que está a milhas de outros tesouros narrativos. Pelo menos só se perde cerca de duas horas a descortinar toda a sua história. E nem um detector de metais aqui conseguiria encontrar ouro.

Gray Zone [PC]

Estão a ver o estúdio Mimimi Games, que se tornou desde Shadow Tactics o standard para tactical RTS? Ao ponto da tão esperada sequela de Desperados lhes ter sido entregue

Então saibam já que o estúdio eslavo EastWorks está a milhas dos criadores de Munique, que recentemente nos brindaram com Desperados III. 

Gray Zone foi lançado em 2020 em Early Access e o espaçamento dos updates não deixam antever uma breve luz ao fundo do túnel em termos de lançamento final. De qualquer forma, o facto de haver interesse em ir corrigindo os muitos bugs que têm ensombrado este jogo já é algo positivo.

Em Gray Zone vivemos um cenário futurista no qual somos escravos que se revoltam contra o governo totalitário num movimento revolucionário. Mecanicamente genérico, por agora, estando dentro do que se espera da fórmula de um tactical RPG. Já os inimigos, e o setting em si, soam excessivamente genéricos.  

Soldados, mutantes, cães, poderiam ser parte da letra de uma anúncio da Leopoldina do pós-apocalipse, mas são na realidade alguns dos elementos que vamos encontrar, sem surpresa, num ambiente que nos relembra Fallout com laivos de Norte de África e Indiana Jones.

Já a direcção de arte parece compensar todos os restantes falhanços. Da narrativa espelhada em excelentes vinhetas de Banda-Desenhada, à própria modelação dos cenários, altamente detalhados, são os aspectos artísticos que acabam por salvar a honra de um convento que pode estar fadado à derrocada ainda na sua construção.

É difícil e talvez injusto vaticinar o futuro para um jogo Early Access como Gray Zone, mas à excepção da sua direcção de arte, o caminho que está a seguir é mesmo a estrada dos genéricos. E o entusiasmo sobre ele já morreu há muito.

Snake Man’s Adventure [PC]

Comecemos pela direcção de arte dos personagens e inimigos, que é das mais naïf que já vi. Quando vi as primeiras artes promocionais de Snake Man’s Adventure até assumi que eram apenas umas fan arts de uma série obscura qualquer feita por um pré-adolescente no Photoshop. Mas depois lembrei-me que já conheci muitos jovens artistas que dão mil a zero a muitos profissionais. A mim inclusivamente.

Este não é de todo o caso dos criadores de Snake Man’s Adventure. Onde a utilização de fotografias para criar um ambiente realista nas plataformas com efeito de paralaxe é uma forma de mascararem as deficiências artísticas.

Com quatro níveis apenas e tão, tão genéricos que até fui olhar para a caixa para ver se o excipiente era semelhante. 

Em Snake Man’s Adventure é tudo tão básico e insípido que eu esperava que os autores abraçassem a loucura e o seu aspecto naïf e bizarro e simplesmente levassem isto para outros patamares de ingenuidade. Mas não.

Podemos trocar as moedas e gemas por vidas extra e mais vida, e este é o único objectivo real de nos esforçarmos para apanhar tudo. Mas agora pensando bem, não vejo grandes motivos sequer para o jogar. Já assisti a provas de final de curso que têm um aspecto mais vendável do que este jogo que está – surpreendam-se – por 4,99€ no Steam. O que é cerca de 4,98€ a mais do que ele merece.