Caçada Semanal #276

Goste-se ou ignore-se, a realidade é que os jogos indie – com a liberdade criativa que lhes é natural – conseguem seguir caminhos que no mercado AAA não existem. Seja encarnar uma mãe elefante com num jogo de sobrevivência com laivos de abstraccionismo, seja viver a vida de um super-herói meia sem par, há boas ideias que veem a luz do dia porque o mercado recompensa os criadores indie pelo seu arrojo. 

Os 3 jogos desta semana só poderiam mesmo ser jogos independentes. E ainda bem.

Shelter 3 [PC, Mac, Linux]

Depois de duas iterações brilhantes de Shelter, o estúdio Might and Delight apresenta-nos mais uma viagem no seu estilo tão reconhecível. Uma aventura de sobrevivência com um sentido estético único, onde todas as superfícies são construídas com malhas e padrões que formam uma tapeçaria visual que nos remete automaticamente para um jogo do estúdio sueco.

Desta vez controlamos uma mãe elefante a levar o seu clã para um reencontro com os seus antepassados. Vamos utilizando o nosso sentido de elefante para encontrar os próximos checkpoints. Mas ao contrário da linearidade do primeiro título da série ou a abertura do segundo, este Shelter 3 parece ficar numa linha média entre ambos, sem conseguir definir-se.

Das limitações mecânicas ainda mais evidentes nesta terceira iteração, às dificuldades associadas às bifurcações de caminho sempre que encontramos um checkpoint, há algo de emocionalmente tangencial neste jogo que não aconteceu nos antecessores.

Temos de encontrar comida e bebida nas nossas travessias para manter a manada viva, mas o jogo falha em conseguir criar-nos uma ligação emocional com os restantes animais que nos seguem. Nem mesmo as crias têm essa capacidade.

Nesta terceira iteração, Shelter perdeu a profundidade e subtileza emocionais dos anteriores, num título onde a direcção artística continua a ser o seu ponto mais alto.

Sockventure [PC]

Imaginem um Super Meat Boy em que ao invés de um personagem esfolado que deixa sangue em todas as superfícies por onde passa e toca, que somos uma meia que tem de defrontar uma máquina de lavar tirânica em busca de tantas outras meias perdidas.

Para quem jogou Super Meat Boy e Celeste e que tem saudades do desafio que estes apresentam – e que no caso do primeiro começou uma tendência, Sockventure é um jogo que se estranha a premissa inicial, mas que rapidamente nos captura no seu sistema de plataformas hardcore, onde a precisão é a diferença entre sermos o verdadeiro super-herói meia sem par, ou apenas um pedaço de trapos rasgados ao fundo do nível.

Publicado pela Versus Evil, Sockventure é, como dissemos, um platformer hardcore de precisão, brutalmente impiedoso, com um level design interessante e cruel. São 200 níveis de sadismo divididos entre 7 capítulos e 3 mundo, onde podemos ir mudando o nosso aspecto com skins que desbloqueamos à medida que progredimos.

Sob um conceito estranho e algo ridículo está um excelente jogo de plataformas hardcore, obrigatório para quem anda à procura de um grande desafio.

Crash Drive 3 [PC, Android, Switch, PS4]

Crash Drive 3 parece o filho ilegítimo de Tony Hawk’s Pro Skater e de Carmageddon, um jogo multiplayer com crossplay surpreendentemente divertido. Dizer que este indie arena vehicle battler é uma mistura desses dois títulos tão distintos não é por acaso. 

Constituído por 5 mundos que são verdadeiros parques de diversões repletos de rampas e montanhas para percorrer, à medida que projetamos o nosso carro para o ar ao estilo do Tony Hawk e fazemos combos de movimentos especiais.

Crash Drive 3 não se leva a sério e esse é o seu ponto mais alto. Com eventos a acontecerem com muita frequência e com um aviso prévio de segundos, há muitos mini-jogos a acontecerem nestas arenas que, surpreendentemente, estão pejadas de jogadores.

Tantas vezes jogamos indies exclusivamente online que são verdadeiros nados-mortos face à falta de jogadores, mas felizmente que este não é o caso de Crash Drive 3. Assim que caí num nível que é um desfiladeiro fui automaticamente emparelhado com outros jogadores que percorriam a arena de forma muito exagerada e muito pouco realista, à espera que houvesse um trigger para um novo evento.

O primeiro deles foi uma bola de praia gigante que caiu do céu apenas com um aviso: sê aquele que dá mais dano à bola. Um leader board surge de imediato e lá estamos nós a investir contra uma bola de praia gigante que anda aos saltos pelo desfiladeiro, obrigando uma série de veículos – todos diferentes e alguns absurdos – a correrem atrás de uma bola gigante como uma matilha de cães automobilizados. 

Apesar de existirem desafios offline, é mesmo no online que a diversão deste Crash Drive 3 acontece. Com muitos desbloqueáveis para coleccionarmos, a diversão e a loucura deste jogo tornam-no numa agradável surpresa repleta de risos descontraídos.