Antes de dar um pontapé na porta e entrar na sala para falar de Munchkin – Critical Role A Mighty Nein temos que falar de quem sustenta este jogo nos ombros.
Steve Jackson é um americano que criou a Steve Jackson Games. Não devemos confundir com Steve Jackson, o britânico que co-criou a Games Workshop de onde saíram os livros Fighting Fantasy, Warhammer e entre outras coisas tiveram um grande papel na introdução de Dungeons and Dragons e tudo relacionado no Reino Unido em particular mas também na Europa. Curiosamente Steve Jackson, o americano, escreveu 3 livros Fighting Fantasy (Scorpion Swamp, Demons of the Deep e Robot Commando) mas ficamos por aqui nesta parte já que tenho por aqui um extenso artigo acerca destes livros. Jackson é conhecido principalmente por ter criado o sistema GURPS (Generic Universal RolePlaying System) que permite fazer um jogo de narrativo em qualquer cenário imaginável e o jogo Munchkin que é uma versão humorística e simplificada de um jogo de D&D com variantes que vão de Ducktales a X-Men passando por Conan, Warhammer, Teenage Mutant Ninja Turtles ou Nightmare Before Christmas. A versão que analisamos hoje é dedicada aos Mighty Nein.
E quem são os Mighty Nein?
Um dia, um grupo de amigos e colegas se junta para fazer um one-shot de Dungeons and Dragons como prenda de anos para um deles que tinha saudades de quando jogava em jovem. Gostam tanto que começam a jogar regularmente. Ao fim de uns tempos, um canal online chamado Geek and Sundry que estava a começar na altura convida-os para jogarem ao vivo, depois de muita discussão aceitam e contra todas a expectativas têm algum sucesso. Eventualmente têm tanto sucesso que uns anos mais tarde já têm o próprio canal de Twitch com vários conteúdos diferentes para os cerca de 800 mil seguidores que pagam para ver as emissões em live e mais 1.3 milhões que os seguem no Youtube. Enchem salas de espectáculo para os verem jogar ao vivo (pré-pandemia), têm uma das campanhas mais bem sucedidas de Kickstarter em que ao invés de $750.000 para fazer o piloto de uma série animada baseada na sua primeira campanha conseguiram $11.3 milhões e um contrato com a Amazon Prime para transmitir a série inteira, criaram a própria editora de jogos de tabuleiro e role playing e uma fundação de caridade ainda têm mais planos para o futuro. Esses são os Critical Role um grupo de voice actors que conseguiram tornar um passatempo num negócio lucrativo e os Mighty Nein são os seus personagens na sua segunda campanha que já acabou e são também os personagens deste jogo de hoje.
Dependendo de como queremos jogar, D&D pode ter mais ou menos intriga, mais ou menos mistério, mais ou menos roleplaying, mas acima de tudo é sobre matar monstros. Quase todos os clímaxes das campanhas são para derrotar um BBEG (Big Bad Evil Guy), Munchkin retira tudo isso e coloca-nos nas masmorras mais simples do mundo. Abrimos uma porta ao pontapé, matamos o que encontramos ou apanhamos o loot e seguimos para a próxima até um de nós ser o mais forte dos mais fortes. Ah… podemos atraiçoar os outros jogadores e ser sacanas uns com os outros também. Esta é a base de Munchkin, e como é óbvio é a base deste primeiro jogo oficial dos Mighty Nein. Mas comecemos com o que está na caixa:
7 cartas de personagem com cada um dos The Mighty Nein (sim, é uma piada recorrente nos cerca de 135 episódios depois de terem escolhido esse nome.)
172 cartas de tesouro ou porta com arte exclusivamente criada para o jogo.
1 D20, 1 D6 e 6 tokens para o máximo de jogadores que podem participar ao mesmo tempo.
E como se joga?
Pensem em deckbuilder/dungeoncrawler lite. É dada uma carta de personagem aleatória a cada um dos 3 a 6 jogadores. Fjord Stone, Yasha Nydoorin, Caduceus Clay, Caleb Widogast, Beauregard Lionett, Jester Lavorre, e Nott the Brave/Vett Brenato. Cada personagem tem uma habilidade especial, nenhuma é overpowered ou complicada de utilizar mas o facto de não poder escolher a que mais gostamos dá um sabor diferente ao jogo. Quando recebemos a carta escolhemos o lado (puramente estético) e colocamos 1 token na casa 1. Baralhamos as cartas de Porta e as de Tesouro separadamente e cada jogador recebe 4 cartas de cada um deles num total de 8 para a sua mão inicial e, as restantes ficam no centro da mesa em dois baralhos respectivos. Cada jogador escolhe as cartas que quer colocar em frente ao seu personagem a partir da sua mão, estas podem ser equipamentos, drive ou role, personagens de apoio ou outras.
As cartas que colocamos na mesa são as cartas que estão em jogo ou equipadas no nosso personagem e lhe vão dar os bónus e buffs necessários para completar o jogo. Podemos equipar uma carta de cada categoria, “headgear” pode ser um capacete, colar, máscara, seja o que for que se use no pescoço ou daí para cima. Uma carta de “armor” ou seja roupa ou armaduras, e uma de “footwear”, qualquer coisa para os pés regra geral são sapatos ou botas. Também podemos carregar armas ou outros objectos, um objecto de duas mãos ou dois de uma mão. Sistema clássico de RPG, estas cartas vêm do baralho dos tesouros, nesse baralho também podemos receber as cartas de drive ou role. Estas dão-nos bónus através de uma motivação como “Vingança” ou “Redenção” ou um papel “Priest” ou “Fighter” por exemplo. Há outros tesouros que nos fazem subir de nível, ou outras preciosidades como as “guest star” que são NPCs e outros da campanha 2 de Critical Role. As cartas que recebemos do baralho das portas são monstros ou maldições. Essas ficam na nossa mão até ao nosso turno. Depois de fazermos o set up, pegamos no D20 e rolamos para iniciativa.
O jogo é fácil e feito por turnos em que cada jogador tem 3 fases para completar.
1- “Biqueiro na porta”
Vira-se a primeira carta do baralho porta e luta-se com o monstro ou se for uma maldição ou outra carta cumpre-se o que está na carta. Se o monstro for mais forte que nós, podemos usar cartas de buff da nossa mão ou pedir ajuda a um dos outros jogadores por parte do loot. Os outros jogadores não são obrigados a ajudar. Mas cá se fazem, cá se pagam.
Derrotando o monstro calculamos os pontos, subimos de nível e passamos para a fase 3, se perdemos o combate tentamos fugir e não conseguindo o nosso corpo pode ser pilhado pelos outros jogadores. Especialmente aqueles pulhas que não nos ajudaram porque não há honra entre ladrões.
Se não tirámos uma carta de monstro passamos para a fase 2.
2 – “Procuramos sarilhos ou tesouros?”
Se procuramos sarilhos usamos um dos monstros da nossa mão e colocamos em jogo para derrotar usando o mesmo sistema da fase 1. Se procuramos tesouros retiramos uma carta do baralho de porta e sem mostrar aos outros jogadores e guardamos na nossa mão. Esta pode ser jogada na próxima vez que tivermos à procura de sarilhos ou podemos meter no combate de um dos outros jogadores quando encontram um monstro no turno deles.
Eu disse que este jogo tem uma parte grande de sacanice? Disse? Ok, nunca é demais lembrar… mas também tem partes em que somos “simpáticos” como na fase 3.
3 – “Caridade”
É caridade mas é quase só em nome. Temos que acabar o nosso turno com o máximo de 5 cartas na mão, portanto antes de passar a vez ao jogador seguinte temos que usar o nosso excesso de cartas equipando o nosso personagem ou amaldiçoando os outros jogadores. Se não quisermos uma dessas opções temos que dar o número de cartas em excesso ao jogador com o nível mais baixo. Passamos a vez ao jogador seguinte e vamos rodando turno a turno até um chegar ao nível 10 derrotando um inimigo ganhando assim o jogo. Há variáveis que podem ser incluídas como um Boss final, combate com recurso a dados e outras, mas o core do jogo é este. A qualquer altura no nosso turno podemos vender cartas e usar o dinheiro para subir de nível ou negociar troca de cartas com as mãos dos outros jogadores.
Munchkin – Critical Role A Mighty Nein é um jogo bastante divertido para jogar com um mínimo de 4 jogadores idealmente, não tem modo a solo ou a dois já que as suas mecânicas focam-se muito na dinâmica de apoio e traição dos membros da “party”. Esta versão é quase exclusivamente apontada para os fãs de Critical Role e dos Mighty Nein mas não coloca de parte quem não os conhece, só tem mais piada para quem percebe grande parte das referências. É exclusivo das lojas online Critical Role (procurando são capazes de encontrar noutras lojas mas não vale a pena porque está já ali) e infelizmente pós Brexit há a hipótese de terem que pagar taxas alfandegárias extra se o comprarem. Há uma loja UK mas ainda não há planos de um distribuidor EU infelizmente já que eu também estava de olho em comprar o outro jogo deles Uk’otoa. Se não são fãs dos Mighty Nein mas estão interessados em Munchkin, de certeza que há um para vocês.