Caçada semanal #280

Nunca tive muita pachorra para jogos cujo único propósito é serem desafiantes. Por exemplo, Super Meat Boy e coisas desse género não ressoam comigo. Plataformas e mais plataformas de tentativas e mais tentativas e frustração e mais frustração.

Mas pelos vistos sou um tipo bastante superficial – basta fazerem umas coisas com bom aspecto que a minha opinião logo muda. Os dois jogos desta semana são bons exemplos de como essa superficialidade confere profundidade e tira algum peso da frustração deste tipo de jogos, em que morremos demasiadas vezes e precisamos de fôlego para tentar outra vez.

Ambos da Viridino Studios, Pinkman e Rabisco pegam nos géneros de acção e plataformas implacáveis e fazem-nos sentir bem recebidos na face de tanta morte.

PINKMAN (PlayStation 4, Nintendo Switch, PC, Linux, Mac OS, Xbox Series X, PlayStation 5, Xbox One)

Somos um tipo que subitamente tornou-se cor de rosa, ficou preso num mundo chamado “A Mente” e que para descobrir o que lhe aconteceu deve correr saltar e “planar” por plataformas cada vez mais desafiantes.


“Planar” está entre aspas já que até largar o jogo foi o que me pareceu que o meu personagem de 8-bits fazia quando accionava o respectivo comando. Ao rever a descrição do jogo eis que descubro que os developers imaginaram esta mecânica como um flato que mantém o nosso herói no ar por mais uns píxeis. Escrevo flato mas talvez seja mais correcto defini-lo como bufa, uma vez que é mudo. Fiquei extremamente contente do meu DualSense da PS5 ainda não ter desenvolvido sensações olfactivas, pese toda a tecnologia que possui.

Pese Pinkman se tornar progressivamente mais implacável – o nosso herói morre ao tocar em qualquer coisa menos sólida – a frescura visual do seu pixel art torna-o numa delícia de se ver, com 16 paletes de cor que vão sendo processualmente geradas sempre que avançamos de nível ou morremos dentro de um. Acrescentem as faixas synthwave que nos transportam perfeitamente para esta estética dos anos 80 e Pinkman torna-se no bebé 8-bit de Blade Runner e Tron.


Em Pinkman, não dei pelo tempo passar. Só vos custa 0,99€ – o que dá menos de 1 cêntimo por cada um dos 100 níveis. Quase como se pudesse ter saído em meados dos anos 80 e a inflacção – e os anos – não se notassem até 2021.

RABISCO (PlayStation 4, Nintendo Switch, PC, Xbox Series X, PlayStation 5, Xbox One)

Rabisco expande-se bem mais para lá do rosa e das poucas combinações RGB do seu irmão. Também com 100 níveis, cada dez andam à volta de uma cor, por meio de caminhos de um caderno pautado de uma qualquer criança da escola primária que prefere imaginar mundos rabiscados do que aprender a lição.


Em Rabisco, somos uma borrachinha cuja missão é encontrar todas as estrelinhas que a lua perdeu, coitadinha. Avançamos com controlos muito precisos pelo nosso caderninho enquanto fugimos dos monstrinhos que nos tentam comer – umas vezes muito rapidinho, outras com cuidadinho.

Não perdi subitamente a noção de que a demografia do Rubber está para lá dos 3 anos de idade, mas tudo em Rabisco lembra as bochechas de um bebé que só dá vontade de apertar. Esqueçam lá que as suas mecânicas e progressiva dificuldade implacável são inspiradas em The World’s Hardest Game – a mim deu-me uns laivos de Super Meat Boy – porque a sua candura tirou-me qualquer sentimento de frustração ao longo das centenas de vezes que morri antes de completar cada nível.


Com bastantes coleccionáveis e um aspecto que nos leva de volta para a nossa infância mais gazeteira, Rabisco é uma ótima forma de passar umas horas a morrer. Com muita doçura.